O descontentamento de Gloria Pires com sua personagem em O Rei do Gado (1996) não é segredo para ninguém. Na novela em cartaz no Vale a Pena Ver de Novo, ela deu vida à impostora Rafaela, suposta sobrinha de Geremias Berdinazzi (Raul Cortez).

O Rei do Gado - Patrícia Pillar
Divulgação / Globo

O que poucos sabiam era que esse papel não era o destinado para ela. Gloria foi cotada, a princípio, para a protagonista Luana Berdinazzi.

De acordo com o jornalista e pesquisador Fábio Costa, do Observatório da TV, em seu artigo publicado em 4 de fevereiro deste ano, Gloria havia sido escalada para viver a boia-fria, verdadeira herdeira do Berdinazzi. A filha do irmão do fazendeiro, Giácomo Guilherme (Manoel Boucinhas), que se apaixonaria por Bruno Mezenga (Antônio Fagundes), era para ela.

Decisão da própria atriz

O Rei do Gado - Gloria Pires
Divulgação / Globo

O mais curioso de toda essa história é que a decisão de fazer outro papel na trama partiu da própria Gloria. O que pesou na escolha da atriz foram os últimos trabalhos feitos por ela, a destemida Maria Moura, da minissérie homônima, em 1994, e a Pierina do filme O Quatrilho, em 1995.

“Fui chamada para fazer a Luana, mas ela tinha um quê regional muito forte e meu último trabalho tinha sido na minissérie Memorial de Maria Moura (1994). Aí, surgiu a Marieta, que tem um lado bom e outro mal, como todo ser humano”, contou ela em entrevista ao jornal O Globo, em 28 de julho de 1996.

A direção da novela realizou a troca e Patrícia Pillar ficou com Luana, que se tornou um grande sucesso, marcando em definitivo a sua carreira.

Frustração

Gloria Pires
Reprodução / Instagram

Só que a promessa de Rafaela ser um grande destaque dentro da trama ficou apenas no papel e a personagem, que começou interessante, simplesmente foi perdendo espaço a cada bloco de capítulos.

Se sentindo bastante decepcionada com o resultado, Gloria Pires chegou a manifestar publicamente sua frustração com o trabalho, chegando a afirmar que O Rei do Gado era, até então, uma das novelas mais difíceis que havia feito.

“As pessoas pensam que é charme, que não quero falar, mas não sei mesmo. Acho que nem o Benedito sabe. Parece que a personagem sobre a qual o autor escreve é uma, a que estou fazendo é outra e a que o público está vendo é uma terceira. Muita gente diz que estou má na novela. Não vejo nada de malvada na Marieta”, afirmou ela em outra entrevista, ao Estado de S. Paulo, em 18 de agosto de 1996.

Anos depois, a atriz voltou a falar sobre a trama, desta vez em sua biografia, 40 anos de Glória, escrita por Eduardo Nassife e Fábio Fabrício Fabretti.

“Eu aceitei confiando plenamente em Benedito, porque tínhamos trabalhando em Cabocla (1979). Houve algum problema, porque ele não desenvolveu a personagem como havia falado. É horrível quando você espera algo que não vem”, lamentou.

“Arregacei as mangas e levei a missão até o fim, dignamente. Foi o que me restou fazer”, completou.

O final de Rafaela

Fabio Assunção e Gloria Pires - O Rei do Gado
Divulgação / Globo

O desfecho de Rafaela não poderia deixar de ser tão melancólico quanto sua trajetória na trama. A personagem se infiltrou na fazenda de Geremias num plano arquitetado por Fausto (Jairo Mattos), advogado interessado em botar a mão na herança da verdadeira sobrinha do fazendeiro. Mas os planos da dupla foram por água abaixo quando Olegário (Rogério Márcico), administrador dos negócios de Berdinazzi, descobriu toda a verdade.

Para ganhar tempo, Fausto eliminou o administrador. Posteriormente, ele foi assassinado por Geremias. Tempos depois, surgiu Otávio (Guilherme Fontes), filho de Olegário interessado em descobrir o assassino de seu pai. Ele acabou se apaixonando pela golpista. Mais tarde, descobrimos que Rafaela tinha ligações com Bruno (Marcello Antony), irmão de Geremias que morreu durante a 2ª Guerra Mundial. Ou seja: ela também é uma Berdinazzi.

No último capítulo, Rafaela termina seus dias numa propriedade doada por Geremias, em consideração à avó da moça, uma italiana que se uniu a Bruno durante a Guerra. E também para manter a identidade do assassino de Fausto em sigilo, uma vez que foi o próprio fazendeiro o responsável pela morte de seu cúmplice, vingando a morte de Olegário.

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Sebastião Uellington Pereira é apaixonado por novelas, trilhas sonoras e livros. Criador do Mofista, pesquisa sobre assuntos ligados à TV, musicas e comportamento do passado, numa busca incessante de deixar viva a memória cultural do nosso país. Escreve para o TV História desde 2020 Leia todos os textos do autor