Na ultima semana, o Viva anunciou que exibirá os primeiros anos do Domingão do Faustão, que estreou em março de 1989, na Globo. Para quem gosta de televisão será um prato cheio, por ver ou rever como Fausto Silva acabou com a liderança do Programa Silvio Santos, que, até então, derrotava a programação dominical da emissora carioca na audiência. Entretanto, é importante relembrar uma atração que revolucionou os programas de auditório na década de 1980: Perdidos na Noite foi a janela para os telespectadores conhecerem a irreverência do Faustão.

No inicio dos anos 80, o grande locutor Osmar Santos tinha uma atração na antiga Rádio Excelsior chamada Balancê. O programa falava de todos os assuntos, contava com o carisma e bom humor do “pai da matéria” e trazia bons índices de audiência. Porém, Osmar se envolveu em outros trabalhos e deixou a apresentação para o jovem repórter Fausto Silva.

O humor rápido e inteligente de Faustão trouxe uma nova cara ao programa, que também ganhou auditório e contava com a dupla de humoristas Nelson Tata Alexandre e Carlos Roberto Escova. A produção era de Lucimara Parisi e a sonoplastia do lendário Johnny Black.

Em 1984, Goulart de Andrade foi com o seu câmera, o Capeta, mostrar os bastidores do Balancê e se impressionou com a dinâmica e criatividade do programa radiofônico. Após a reportagem, Goulart disse ao Fausto uma frase marcante: “Você esta fazendo televisão no rádio”. Desse modo, Faustão e sua equipe foram convidados a apresentar um programa na TV Gazeta, dentro da atração de Goulart: assim nascia o Perdidos na Noite.

O programa ficou menos de um ano no canal 11 de São Paulo e migrou para o canal 7, a TV Record. O roteiro era igual ao do Balancê, trazendo para a televisão um programa muito diferente do que a audiência estava acostumada. O cenário, por exemplo, pouco importava: poderia ter um bar, uma escada, uma mesa, enfim, a anarquia estava instalada e isso agradou o público, trazendo uma boa audiência aos sábados à noite.

O programa abriu as portas para as grandes bandas do rock nacional: Titãs, Legião Urbana, Ira, Ultraje a Rigor, Kid Abelha, entre outros artistas já consagrados, apresentaram-se no antigo Teatro Zaccaro, onde o programa era gravado. Não importava o estilo musical, o programa era democrático – tanto que o auditório participava, seja aplaudindo, vaiando ou xingando. Todos tinham espaço.

Até o apresentador sofria: um espectador levou uma faixa com esta frase: “Faustão, sai da frente que eu quero ver o programa!”. Sem papas na língua, o apresentador fazia comentários ácidos e sarcásticos sobre a roupa do convidado, o cabelo ou até os óculos. Quando a banda usava o playback, ele questionava: “porque trazer essa guitarra se não vai ser ao vivo?!”.

Um dos momentos memoráveis da atração foi quando o apresentador do Viva a Noite, Gugu Liberato, foi ao programa apresentar sua famosa música Baile dos Passarinhos. Faustão, incomodado, teve que dançar com Gugu sob os risos de toda a plateia do Teatro Zaccaro.

Inconformado, ele botou a equipe toda para dançar, fugindo de Gugu. Viva a Noite também era exibido sábado à noite, mas não enfrentava diretamente o Perdidos na Noite. Os dois jovens apresentadores se encontrariam novamente, anos depois, mas no domingo à tarde, criando uma das maiores batalhas por pontos de audiência da historia da televisão.

O sucesso cada vez mais crescia e Faustão foi ganhando reconhecimento e prêmios, como o Troféu Imprensa de melhor apresentador de 1985. Em 1986, ele recebeu o convite da Rede Bandeirantes e levou toda a trupe para o canal 13 de São Paulo. Mais que isso, a Bandeirantes era uma rede e o programa seria exibido em cadeia nacional, no mesmo dia e horário que era na Record.

A audiência da Bandeirantes no horário cresceu e o prestígio do apresentador também. Até um especial foi gravado no Circo Voador, lotando o lendário espaço cultural do Rio de Janeiro. O que mais agradava o público era o deboche do Faustão com o programa: reclamava do calor, dos câmeras, da falha dos microfones, entre outras coisas. Em uma das chamadas, ele olhava para o espelho e se perguntava: “Espelho, espelho meu, existe um programa pior que o meu?”.

Nessa época, o Brasil vivia a frustração do Plano Cruzado e a incompetência do governo José Sarney. Em meio a esse cenário, Fausto abria espaço para os artistas exporem sua opinião, além de trazer críticas realistas sobre a situação do país.

Diferente de outros programas, o Perdidos tocava na ferida, fosse de um modo sério ou engraçado. Os humoristas Tata e Escova, em uma de suas esquetes, trouxeram um “comunicado” do governo federal: “não compre no mercado, não almoce, não jante, não matricule seu filho, morra este ano! Apoio do governo Zé Sarney”.

Em 1988, a Globo contratou Gugu Liberato para enfrentar o seu mentor Silvio Santos nas tardes de domingo. Silvio resgatou Gugu e, mais uma vez, a grade dominical da emissora carioca parecia perdida, sem solução. A vênus platinada viu no apresentador do Perdidos na Noite que ele poderia salvar os domingos enfadonhos do canal. Ao assinar o contrato, Faustão afirmou que iria se adequar ao estilo da Globo sem perder o bom humor.

Muitos comparam o Faustão de hoje com o de ontem, mas é injusta tal comparação: Perdidos na Noite era voltado para um público diferente daquele que assiste televisão aos domingos. Sem sombra de dúvidas, o Perdidos foi um marco na historia da televisão e mudou a forma de se fazer e ver programa de auditório.

Gugu e Faustão juntos no Perdidos na Noite


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Fábio Marckezini é jornalista e apaixonado por televisão desde criança. Mantém o canal Arquivo Marckezini, no YouTube, em prol da preservação da memória do veículo. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor