André Santana

Em Travessia, a mocinha Brisa (Lucy Alves) viu sua vida virar do avesso depois que foi vítima de uma fake news. Uma montagem com seu rosto indicando que ela era uma sequestradora de crianças caiu na internet e, por isso, a jovem foi linchada em praça pública, teve que fugir da cidade às pressas e acabou na prisão. Mas o “vilão” por trás do calvário de Brisa é um adolescente assexual: Rudá (Guilherme Cabral).

Normalmente, os percalços que uma heroína de novela enfrenta são causados por um grande vilão. Porém, no caso de Brisa, seu algoz é um jovem que não faz ideia do mal que está fazendo na vida dela. Rudá é apenas um garoto em conflito consigo mesmo.

Rudá é um adolescente que tem muitos complexos. Por conta disso, ele não é muito sociável e dedica boa parte de seu tempo à tecnologia. Foi testando a ferramenta de deep fake que o rapaz construiu a montagem que acusa Brisa de ser uma criminosa. Ele apenas pegou sua foto na internet, sem imaginar as terríveis consequências de seus atos.

Aliado

Nos próximos capítulos de Travessia, Rudá ainda ganhará um aliado e tanto: Stênio (Alexandre Nero). Por meio de Oto (Romulo Estrela), que se dedicará a ajudar Brisa, o advogado vai descobrir que foi Rudá o responsável por toda a celeuma que envolve a moça. Stênio, aliás, chegou a ver a tal montagem, pois o garoto a mostrou assim que a fez.

Por isso, Stênio se sentirá culpado e responsável por tudo o que aconteceu e decidirá proteger o filho de Guida (Alessandra Negrini). Assim, ele pedirá que Oto apague qualquer vestígio de que Rudá é o responsável pela montagem.

Porém, o adolescente continuará aprontando. Incomodado com a maneira como Moretti (Rodrigo Lombardi) o trata, Rudá fará uma montagem para prejudicá-lo. Ele jogará na internet um vídeo falso que mostra o empresário maltratando um cachorro. Com isso, Moretti será “cancelado” na internet.

Tecnologia do mal

Até aqui, Travessia não tem um grande vilão. E isso é uma característica de Gloria Perez. A autora até cria personagens do mal, mas raramente eles atrapalham a vida de suas protagonistas.

Alicinha (Cristiana Oliveira), de O Clone (2001), por exemplo, era uma vilã, mas nunca prejudicou Jade (Giovanna Antonelli). O que atrapalha a vida da mocinha era a própria diferença cultural que envolvia ela e Lucas (Murilo Benício). Já Lívia (Claudia Raia) deu trabalho à mocinha Morena (Nanda Costa), em Salve Jorge (2012), mas foi uma exceção.

Deste modo, a grande vilã de Travessia é, até aqui, a tecnologia. É a maneira errada como os recursos tecnológicos são utilizados que desencadeia os principais conflitos do enredo. Rudá, então, é um vilão sem ser. Sem querer, ele é o grande responsável pelas “maldades” da trama das nove da Globo.

Assexual

Através de Rudá, Gloria Perez, que já falou sobre homossexualidade em América (2005) e transsexualidade em A Força do Querer (2017), agora abordará o universo dos assexuais. A assexualidade ou espectro assexual é a falta total, parcial ou condicional de atração sexual a qualquer pessoa, independente do sexo biológico ou gênero. Ou seja, assexuais tendem em sua maioria a apresentar pouco ou nenhum interesse nas atividades sexuais humanas.

A novela mostrará esta questão por meio do personagem Rudá (Guilherme Cabral). Filho de Guida (Alessandra Negrini), o rapaz se sentirá diferente dos amigos e, com isso, ficará deslocado. Enquanto seus conhecidos vivem o início da sexualidade, Rudá não se interessa pelo assunto e não sente nenhuma necessidade romântica e sexual.

Confuso, Rudá só compreenderá o que realmente acontece com ele quando conhecer Laerte. Ele também é assexuado e ajudará Rudá a compreender sua condição. A partir do encontro entre Laerte e Rudá, Gloria Perez pretende mostrar que existem diferentes tipos de assexuais. Isso porque Laerte é um demissexual, ou seja, só se envolve sexualmente com alguém quando há uma profunda conexão. Já Rudá será um assexual estrito, ou seja, não suportará a ideia do sexo e do contato físico.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor