Foi o colunista do TV História, Fabio Marckezini, quem descobriu a relíquia, digitalizando fitas VHS para seu canal no YouTube: uma chamada da estreia de Riacho Doce em Vale a Pena Ver de Novo. Sim, caro leitor: houve um tempo em que a Globo resgatou minisséries, produções mais “pesadas”, na sua tradicional faixa de reprises à tarde. Foram quatro títulos, uma reapresentação descartada e uma surpreendente tentativa de retomar as reexibições em 2000, nas comemorações do cinquentenário da TV brasileira e dos 35 anos de Globo.

Naquele 1º de abril de 1991, a Globo empurrou o repeteco de Top Model (1989) para 14h30, colando a reestreia de Riacho Doce no Jornal Hoje, às 13h30. Assim, a “inauguração” desta sessão dupla teve início com a trama de Aguinaldo Silva e Ana Maria Moretzsohn, inspirada no romance de José Lins do Rego, exibida no ano anterior como “resposta” a Pantanal, da Manchete, que, no ar sempre após a novela das oito, ameaçava a liderança da linha de shows do canal.

‘Riacho’ abusava das cenas sensuais para ilustrar o romance de Eduarda (Vera Fischer) – casada com Carlos (Herson Capri) – e Nô (Carlos Alberto Riccelli), pescador que tivera seu corpo fechado para o amor por sua avó, Manuela (Fernanda Montenegro). Embora na chamada a Globo fale em “versão compacta”, a minissérie foi reprisada com todos os seus 40 capítulos, entre 1° de abril e 24 de maio – com a supressão de poucas sequências mais fortes. A produção foi reprisada outra vez em 1992, apenas para o Distrito Federal, no horário em que o resto do país acompanhava a propaganda eleitoral. Em 1998, a trama foi condensada em 30 capítulos para uma improvável reapresentação às 17h, cobrindo as férias de Malhação.

Substituindo Riacho Doce em 27 de maio, O Pagador de Promessas (1988) sofreu um reajuste em seus oito capítulos para que pudesse ocupar o Vale a Pena Ver de Novo por dez dias. A minissérie de Dias Gomes, baseada em seu filme homônimo, trazia José Mayer como Zé do Burro, rapaz simplório que faz uma promessa a Iansã para salvar a vida de seu burrinho Nicolau: vai sair de Monte Santo, interior nordestino, carregando uma cruz até a igreja de Santa Bárbara (correspondente a Iansã no catolicismo), em Salvador. A intolerância religiosa não permite que Zé cumpra sua promessa, já que ele é assassinado em meio a confusão que se instala na porta da igreja, por conta de seus intentos considerados “afrontosos” pelas autoridades católicas.

‘O Pagador’ voltaria às telas em 1999, num compacto de 4 capítulos, em razão do falecimento de Dias Gomes. E foi transformada em telefilme no Festival Luz, Câmera, 50 anos, em janeiro de 2015. Abaixo, você confere a transição de um capítulo da minissérie para o de Top Model:

A partir de 10 de junho, o público vespertino pode rever as estórias de Ana Terra (Glória Pires) e Capitão Rodrigo (Tarcísio Meira) resumidas em 10 capítulos. Era o resgate de O Tempo e o Vento, clássico de Érico Veríssimo que fez parte da comemoração dos 20 anos da Globo, em 1985. Não era este, no entanto o cartaz previsto para o ‘Vale a Pena’ inicialmente. O canal já havia anunciado Grande Sertão: Veredas, também de 1985, como mostra o registro abaixo, do jornal O Globo de 26 de maio de 1991. ‘O Tempo’ já havia sido reapresentada em março de 1986; também em 1995, em 16 capítulos, no trigésimo aniversário da emissora. ‘Grande Sertão’, por sua vez, só foi revista no Canal Futura.

A última minissérie a dividir o horário do Vale a Pena Ver de Novo com Top Model foi Lampião e Maria Bonita (1982), primeira produção do gênero na Globo. De todas as reprises, foi a mais curta: 5 capítulos exibidos entre 24 a 28 de junho. A trama, como pode se supor pelo título, desvenda os meandros da relação amorosa de Lampião (Nelson Xavier) e Maria Bonita (Tânia Alves), em seus últimos dias de vida. A obra também foi reapresentada em março de 1984, em 1988 (na sequência do Jornal Nacional e apenas para o Distrito Federal) e em 2015, no ‘Luz, Câmera, 50 Anos’.

Na segunda seguinte, dia 01° de julho, as tardes perdiam as minisséries para ganhar a reapresentação de mais uma novela. Às 16h30, entrava no ar a saga de Roque Santeiro (José Wilker) e de sua viúva que foi sem nunca ter sido, Porcina (Regina Duarte). O folhetim de Dias Gomes e Aguinaldo Silva turbinou a faixa vespertina. Tanto que serviu como arma da Globo para impulsionar sua novela das 18h: logo no dia seguinte ao retorno da trama, a emissora inverteu seu horário com a Escolinha do Professor Raimundo, que passou das 17h30 para 16h50. Assim, Roque Santeiro ficou coladinha em Salomé, impulsionando a novela, que padecia com a concorrência do Aqui Agora, do SBT.

Eis que em maio de 2000, a Globo, surpreendentemente, solicitou ao Ministério da Justiça a reclassificação de seis minisséries, três delas com exibição prevista em Vale a Pena Ver de Novo. A emissora almejava obter o selo “livre” para todas (e apenas Memorial de Maria Moura teve o pedido indeferido). Seria uma tentativa de encaixar outros produtos no ‘Vale a Pena’, o que acabou acontecendo com o Você Decide no ano seguinte? Seria uma nova faixa de reprises nas tardes, algo testado anteriormente com Riacho Doce às 17h? Ou uma reapresentação especial, em virtude dos 50 anos da TV no Brasil e 35 de TV Globo?

Entre os títulos liberados: O Tempo e o Vento, Rabo de Saia (1984), reexibida em janeiro de 1988 e no Festival 25 anos, e Anos Dourados, reapresentada em outubro de 1988, também nos ’25 Anos’ e nos canais pagos Multishow e Viva (em duas ocasiões).


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Apaixonado por novelas desde que Ruth (Gloria Pires) assumiu o lugar de Raquel (também Gloria) na segunda versão de Mulheres de Areia. E escrevendo sobre desde quando Thales (Armando Babaioff) assumiu o amor por Julinho (André Arteche) no remake de Tititi. Passei pelo blog Agora é Que São Eles, pelo site do Canal VIVA e pelo portal RD1. Agora, volto a colaborar com o TV História.