Estreou na quinta passada (20), na faixa antes ocupada pela fraca Chapa Quente, na Globo, a nova série de Alexandre Machado e Fernanda Young. Vade Retro é a nova aposta da dupla de roteiristas, conhecidos pelas ótimas Os Normais (2001/2003), Os Aspones (2004), Minha Nada Mole Vida (2006), Separação?! (2010), Macho Man (2011) e Como Aproveitar o Fim do Mundo (2012). Vale lembrar, entretanto, que a última experiência do casal na emissora foi traumática, pois O Dentista Mascarado (2013) foi um imenso fracasso e massacrada pela crítica. A missão agora é justamente esquecer esse fiasco e voltar aos bons tempos.

E vale lembrar ainda que os autores tiveram duas experiências muito bem-sucedidas no canal a cabo GNT. Eles emplacaram duas temporadas da divertida Surtadas na Yoga (2013/2014) e uma da irônica Odeio Segundas (2015) – cuja segunda temporada já foi encomendada para ano que vem.

De volta à televisão aberta, após quatro anos afastados, a nova produção deles na Globo é dirigida pelo competente Mauro Mendonça Filho e conta com um elenco repleto de talentos. Foi por causa dessa série, aliás, que Monica Iozzi saiu da bancada do Vídeo Show (onde fazia um imenso sucesso como apresentadora) para se firmar de vez na sua carreira de atriz. Ela protagoniza a trama ao lado do grande Tony Ramos.

A história retrata a clássica luta do bem contra o mal, explorando essa dualidade através da insegura advogada Celeste (Monica Iozzi) e do poderoso empresário Abel Zebu (Tony Ramos). Ela é uma profissional fracassada, que mora com a mãe (Leda – Cecília Homem de Mello) e sofre com a ausência de clientes. Seu grande ‘feito’ na vida foi ter sido beijada pelo Papa João Paulo II quando o pontífice veio ao Brasil.

Já ele é um milionário inescrupuloso que não se preocupa em esconder sua metodologia nada política de conseguir o que quer. Palestrante de sucesso e corrupto por natureza, o influente homem quer se divorciar da esposa Lucy (Maria Luísa Mendonça) e começa a manipular a advogada para conseguir se dar bem na separação, ganhando ainda sua confiança para seus negócios escusos.

Além do cacófato explícito dos nomes “Abel Zebu” (referente a Belzebu) e “Lucy Fergson” (Lúcifer), o casal tem um filho chamado Damien, que é uma citação ao filme de suspense A Profecia, e uma filha chamada Carrie (do longa de terror Carrie – A Estranha).

Os autores fizeram questão de desenhar isso para o público logo no começo, no momento em que Celeste achou graça da quantidade de ‘coincidências’ referentes ao diabo. O diálogo foi hilário. E a intenção do enredo é justamente essa: deixar o público sempre em dúvida a respeito da identidade desse homem tão sombrio. Pode mesmo ser o demônio lançando várias tentações em cima da uma mulher ingênua ou simplesmente um canalha qualquer querendo uma nova vítima.

A única certeza é o total clima de deboche que permeia a produção. A cidade que serve de ambientação para o enredo, inclusive, parece muito com São Paulo, mas não tem nome. Simplesmente não existe. Mauro Mendonça Filho chegou a declarar que a referência é Gotham, onde vive o clássico herói Batman (pois na trama de Bruce Wayne há uma clara referência a Nova York, mas é um lugar inexistente).

A estreia foi gostosa e explorou o texto cáustico e sarcástico tão característico dos autores, abusando de piadas de duplo sentido e citações inspiradas. Mas é possível observar também a intenção de levantar questões éticas, aproveitando bem o atual momento do país, que vem expondo muita gente se corrompendo por dinheiro e benefícios.

Afinal, a figura de Celeste representa a bondade do ser humano, ao mesmo tempo que reflete a fraqueza da pessoa ao se deslumbrar com as facilidades que um homem poderoso pode oferecer – Abel lhe oferece um cheque de 400 mil de ‘entrada’ e ainda consegue milhares de clientes poderosos para a advogada logo depois que a conhece (tudo com segundas intenções, obviamente).

Tony Ramos está fantástico no papel, o que não é surpresa. O versátil ator trabalha pela primeira vez com os autores e se adaptou perfeitamente ao texto da dupla, imprimindo veracidade a um tipo que tem forte tendência para a caricatura. Monica Iozzi também faz jus ao protagonismo e a comédia é uma área que ela domina com facilidade. A atriz consegue passar a docilidade da Celeste, ao mesmo tempo que expõe um lado atrapalhado que ajuda na composição da personagem.

Maria Luísa Mendonça é outro grande nome e a intérprete adotou o tom caricatural para viver uma diaba, que nada mais é do que uma ex infernal. O elenco ainda conta com a luxuosa participação de Cecília Homem de Mello, que promete roubar a cena vivendo a mãe descompensada da advogada. Luciana Paes é outra que tem tudo para se destacar dando vida a Kika, secretária periguete de Celeste. Juliano Cazarré (Davi), Maria Casadevall (Lilith) e as crianças Enrico Baruzzi (Damian) e Nathalia Falcão (Carrie) também compõem o time.

Vade Retro tem coprodução da O2 Filmes e a série de Alexandre Machado e Fernanda Young tem uma boa proposta, ótimo elenco e o conhecido texto ferino dos autores. O primeiro episódio – disponível uma semana antes pelo aplicativo Globo Play – foi agradável de ser acompanhado e o formato tem boas chances de funcionar.

SÉRGIO SANTOS é apaixonado por televisão e está sempre de olho nos detalhes, como pode ser visto em seu blog. Contatos podem ser feitos pelo Twitter ou pelo Facebook. Ocupa este espaço às terças e quintas


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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor