Que a atual novela das seis é um primor todo mundo já sabe. A trama escrita pelos talentosos Alessandro Marson e Thereza Falcão (a primeira deles como autores principais) tem esbanjado capricho e apresentado um delicioso contexto histórico servindo de pano de fundo para o clássico folhetim.
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A audiência, por sinal, vem correspondendo ao bom conjunto exibido. Entretanto, o triângulo amoroso principal de Novo Mundo vem causando um incômodo pela quantidade de semelhanças com Liberdade, Liberdade, novela das onze exibida no ano passado.
A destemida Anna Milman é professora de português da princesa Leopoldina (Letícia Colin) e se apaixonou perdidamente pelo aventureiro Joaquim (Chay Suede), sendo correspondida. Os dois têm o mesmo ideal de justiça e estão à frente do tempo.
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Mas a mocinha acabou despertando o interesse do ganancioso Thomas (Gabriel Braga Nunes), oficial da marinha inglesa que se transforma em homem de confiança da família Real portuguesa, escondendo seu verdadeiro intuito de impedir que o Brasil se torne independente, dando um golpe em todos.
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Na semana passada, o poderoso homem conseguiu separar o casal graças a Elvira (Ingrid Guimarães), ‘esposa’ trambiqueira de Joaquim que foi atrás do ‘marido’, provocando um choque em Anna, que terminou tudo com o amado após saber do passado do rapaz, acreditando que ele tem um filho com a mulher.
A armação do vilão acabou deixando a mocinha vulnerável e seu maior objetivo foi finalmente alcançado: ele se casou com a menina, aproveitando a desilusão da professora e aumentando o seu prestígio na família Real. A cerimônia, por sinal, teve um clima fúnebre em virtude da evidente tristeza da noiva.
Tudo isso soou familiar? Bastante. Basta lembrar da caprichada novela exibida em 2016, escrita por Mário Teixeira e com argumento de Márcia Prattes, cujo contexto histórico, aliás, foi bem próximo ao da atual. A família real portuguesa também era explorada, com direito a aparições de Dom João VI e Carlota Joaquina – que apareceram na reta final do enredo (em Novo Mundo os dois marcaram presença nos primeiros capítulos).
Vale ressaltar, inclusive, que a cidade cenográfica do folhetim das seis é a mesma do enredo das onze e nem poderia ser diferente, pois a produção realizada pela equipe ficou primorosa e nada mais natural do que aproveitá-la em outra produção com conteúdo similar. Mas é justamente por causa desse todo que os autores deveriam ter se preocupado com o desenvolvimento do triângulo.
A relação protagonizada por Joaquina (Andreia Horta), Xavier (Bruno Ferrari) e Rubião (Mateus Solano) em Liberdade, Liberdade já havia apresentado tudo o que o telespectador está vendo com Anna, Joaquim e Thomas. A protagonista da novela anterior também era uma libertária que lutava contra injustiças e seu amor com Xavier, também um revolucionário, foi atrapalhado pelo interesseiro intendente de Vila Rica, cujo poder era diretamente ligado aos portugueses.
Outra explícita ‘coincidência’ foi o fato da mocinha também ter se casado com Rubião em virtude de uma forte decepção com Xavier que envolvia uma criança – no caso a gravidez de Branca (Nathalia Dill). O clima da cerimônia também foi triste, marcado pela expressão de desânimo da noiva. Tudo igual.
Além dos triângulos serem quase idênticos, as próprias características dos personagens se parecem. Vale lembrar, por exemplo, uma ótima cena em que Anna se indignou com um capataz chicoteando um escravo e tomou a chibata de suas mãos. Joaquina também fez isso e as duas mulheres representam o repúdio a injustiças e desigualdades. Xavier, por sua vez, em vários momentos se portou como um herói, enfrentando soldados e lutando pelos escravos. Joaquim tem a mesma conduta e a única diferença é o povo que defende: ao invés de escravos são índios.
Já Thomas se mostra tão frio e canalha quanto Rubião, tendo ainda os mesmos interesses de rumo ao poder. Até mesmo a motivação do casamento foi igual: o aumento do prestígio perante a corte portuguesa. O ponto de diferenciação deles é apenas a moderação das maldades em função do horário, afinal, o vilão das seis não poderá cometer as mesmas atrocidades que o malvado das onze.
É importante citar outra semelhança dos casais, mas no quesito interpretação e química. E nesse caso é um elogio merecido. Isabelle Drummond e Chay Suede fazem jus ao protagonismo e estão em plena sintonia, assim como Andreia Horta e Bruno Ferrari estavam ano passado. Pena que nesse caso não há similaridade no desempenho do vilão.
Mateus Solano deu um show na pele do inescrupuloso Rubião, mas Gabriel Braga Nunes se mostra mais do mesmo, sussurrando em cena e apático – muitas vezes, por sinal, insere e retira o sotaque inglês de Thomas sem maiores explicações. Aliás, mais uma questão que une os folhetins é a direção do mesmo Vinícius Coimbra.
E uma observação à parte: na última segunda (24), Diara (Sheron Menezzes) viveu exatamente a mesma situação de Bertoleza em Liberdade, Liberdade: a escrava alforriada que acaba de volta à escravidão, passando por várias humilhações. Nesse caso, inclusive, ainda há um agravante: a atriz é a mesma. Sheron também foi a intérprete de Bertoleza e agora viveu o mesmo drama com a sua outra personagem. Como pode? O telespectador tem memória.
Novo Mundo vem se mostrando uma novela deliciosa de ser acompanhada e merece cada reconhecimento que vem colhendo, tanto do público quanto da crítica. Porém, o triângulo central da trama peca ao trazer tudo o que já foi visto em outra novela e tão recente.
Fica parecendo até plágio para algum desavisado, havendo ainda outros contextos similares no conjunto da obra. Claro que não é o caso. Ainda dá tempo dos autores mexerem nisso, inserindo peculiaridades mais do que necessárias. Afinal, o público não merece que no último capítulo Anna e Joaquim fujam de navio e Thomas seja assassinado pela governanta.
SÉRGIO SANTOS é apaixonado por televisão e está sempre de olho nos detalhes, como pode ser visto em seu blog. Contatos podem ser feitos pelo Twitter ou pelo Facebook. Ocupa este espaço às terças e quintas