André Santana

Em texto publicado ontem, nosso colunista Nilson Xavier apontou que Travessia deve ter esse nome em razão das inúmeras viagens realizadas pelos personagens da novela das nove da Globo. Os tipos da novela de Gloria Perez estão sempre indo e vindo de São Luís, Rio de Janeiro e Lisboa, como se essas viagens fossem rápidas e baratas. São as “pontes aéreas” impossíveis, que a autora adora incluir em suas novelas.

“É preciso voar”, repete Gloria Perez, quando tenta convencer o público a embarcar em seus devaneios. Pois quem voam mesmo são seus personagens, sempre metidos num avião rumo a outros países. Nas novelas da autora, a Índia, o Marrocos ou a Turquia são logo ali.

Em Travessia, não é diferente. Moretti (Rodrigo Lombardi) vai e volta de Portugal entre uma cena e outra. Brisa (Lucy Alves), Ari (Chay Suede) e Núbia (Drica Moraes) se dividem entre Rio de Janeiro e São Luís. Como bem ressaltou Nilson Xavier, a história não anda, mas seus personagens sim.

Brasil – Marrocos

O Clone

A facilidade com que os personagens de Gloria Perez se deslocam pelo mundo começou a virar motivo de piada em O Clone (2001). Lucas (Murilo Benício), Jade (Giovanna Antonelli) e tio Ali (Stenio Garcia) iam e vinham do Marrocos com a rapidez de um intervalo comercial.

Pouco tempo após a estreia da novela, o jornal O Globo brincou com o fato. Em 18 de novembro de 2001, a publicação apontava o quão impossível era o deslocamento de Lucas na trama.

“O público já perdeu as contas de quantas vezes ele atravessou o oceano e foi parar no continente africano atrás de Jade (Giovanna Antonelli). Da última vez, ele enfrentou longas horas de voo só para ouvir da amada que ela (de mentirinha) o esqueceu. Haja paixão”, dizia o texto.

Dificuldade

Murilo Benicio

Segundo o jornal, seria extremamente cansativo para Lucas fazer uma estripulia dessas na vida real, já que não havia voo direto entre o Rio de Janeiro e Marrocos naquela época.

“O turista brasileiro costuma fazer uma conexão em Madri. Do Rio até lá, são dez horas de viagem. Depois, de Madri a Casablanca, mais uma hora e 45 minutos de voo. Da capital marroquina até Fez, onde foram feitas gravações da trama de Gloria Perez, ainda é preciso pegar um voo doméstico”, explicou a publicação.

Intérprete de tio Ali no folhetim, Stenio Garcia defendeu a trama.

“Entendo que não é tão simples assim viajar para Marrocos, ficar toda hora de lá para cá, não é uma ponte aérea. Mas há a licença poética da teledramaturgia”, apontou o ator.

América - Deborah Secco

Mesmo assim, Gloria Perez seguiu incluindo pontes aéreas improváveis em suas tramas posteriores. Em América (2005), apenas Sol (Deborah Secco) teve problemas ao tentar entrar nos EUA escondida no porta-luvas de um carro, ou dentro de uma caixa de TV, já que os demais personagens se deslocavam com toda a facilidade.

Em Caminho das Índias (2009), todos iam e vinham da Índia, enquanto em Salve Jorge (2012), a Turquia parecia estar num quarteirão do Rio de Janeiro.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor