André Santana

Em Travessia, nova novela das nove da Globo, Gloria Perez parece bastante disposta a esquecer tudo o que foi aprendido nos últimos anos. A nova novela está bem mais parecida com Salve Jorge do que com A Força do Querer. E isso pode ser um problema.

Em Salve Jorge, trama de 2012, a autora repetiu sua tradicional receita: amores impossíveis, temas inusitados, muitos personagens, núcleo fora do país, tentativas de lançar moda… Uma receita que funcionou muito bem em Explode Coração (1995), O Clone (2001) e Caminho das Índias (2009), mas que se revelou desgastada na saga de Morena (Nanda Costa).

Sucessora da festejada Avenida Brasil (2012), Salve Jorge retomou um formato que parecia antiquado após as várias experimentações de João Emanuel Carneiro, Ricardo Waddington, José Luiz Villamarim e Amora Mautner na história de Nina (Débora Falabella). Com isso, a trama sofreu com forte rejeição. A novela não foi um fracasso, longe disso, mas era constantemente achincalhada por público e crítica por conta de suas “liberdades”.

Salve Jorge

Aí veio A Força do Querer (2017), que parecia uma redenção de Gloria Perez. Aqui, a autora manteve seu pé bem fincado no folhetim, mas o fez de uma maneira um tanto mais fresca. A autora trocou o amor impossível habitual pela história de três mulheres distintas, que se entrelaçavam e formavam um tecido de tramas saborosas. Foi uma clara renovação do estilo da autora.

Tintas carregadas

Salve Jorge - Alexandre Nero e Giovanna Antonelli

A comparação entre Travessia e Salve Jorge não se dá por conta da volta de Helô (Giovanna Antonelli), Stenio (Alexandre Nero) e Creuza (Luci Pereira), mas sim por causa da atmosfera meio brega e absurda que parece enevoar as duas produções.

O novo folhetim das nove começou com o já infalível amor arrebatador que veio da infância, no chato prólogo envolvendo Brisa (Lucy Alves) e Ari (Chay Suede). Apesar disso, já sabemos que o coração da mocinha deve ficar mesmo com Oto (Romulo Estrela), com quem se encontrará em breve.

Travessia - Cássia Kis

No entanto, o grande ponto em comum entre Travessia e Salve Jorge, ao menos no primeiro capítulo, é o fato de ambas carregarem demais nas tintas do melodrama. Toda a trama envolvendo Guerra (Humberto Martins), Moretti (Rodrigo Lombardi) e Débora (Grazi Massafera) foi demasiadamente over, tanto no texto quanto na interpretação dos atores.

Menção honrosa à Cidália de Cássia Kis, extremamente exagerada, e aos inserts cafonas vistos nas cenas em que Guerra pensa em Débora. Se a intenção era fazer o povo embarcar na emoção, a coisa toda ficou um tanto risível. Não funcionou!

Tempo

Lucy Alves em Travessia

No entanto, trata-se apenas de uma primeira impressão. Travessia está apenas começando e ainda pode mostrar que é mais do que uma nova Salve Jorge. Gloria, aliás, sabe como poucos oferecer ao público o que ele quer e arrebatar a audiência pela emoção.

Até porque a trama tem vários pontos positivos, como a protagonista Brisa, que é ótima e muito bem defendida por Lucy Alves, um rosto ainda fresco no horário nobre da emissora. Agora é dar tempo ao tempo e acompanhar para onde esta Brisa vai nos levar.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor