Em algumas novelas é comum um personagem protagonista perder o seu espaço para um perfil coadjuvante, que seja mais atraente. Isto pode acontecer por falha no desenvolvimento do personagem, ou quando o desempenho do ator não é convincente, ou ainda quando o próprio perfil paralelo tem mais chance de conquistar o público. Ou tudo isso junto. E é isso o que acontece em Tempo de Amar, atual novela das seis.

Como se sabe, Maria Vitória (Vitória Strada) e Inácio (Bruno Cabrerizo) se apaixonaram em Portugal, mas viveram uma série de desencontros e sofrimentos que os impediram de se reaproximar. Ela conheceu Vicente (Bruno Ferrari), que logo se encantou pela mocinha, enquanto o dito mocinho se deixou levar pelas intrigas da arrogante Lucinda (Andreia Horta), que o manipulou para conseguir se casar com ele após encontrá-lo ferido em uma rua.

O brasileiro logo caiu nas graças do público, devido à sua personalidade agradável e pela forma como se encantou pela mocinha, disposto a viver esse amor – ao contrário do português, que praticamente se “esqueceu” da existência de Vitória e se deixa levar de forma passiva por todas as armações da atual mulher. Não à toa, Vicente vem “roubando” o protagonismo de Inácio a cada capítulo da trama de Alcides Nogueira.

Some-se a isso a gritante diferença entre os desempenhos de Bruno Ferrari e Bruno Cabrerizo. O primeiro, que começou sua carreira em Celebridade e na clássica temporada da Vagabanda, em Malhação (2004), voltou à Globo no ano passado após um período pela RecordTV e reafirma seu talento cênico ao lado de Vitória Strada, promissora revelação da novela. A segurança do par e a química mostrada em cena vêm encantando os telespectadores, que logo passaram a torcer para que Maria Vitória e Vicente fiquem juntos ao final da novela.

Cabrerizo, por sua vez, não desfruta do mesmo prestígio. Lançado como revelação ao lado de Vitória, embora já tenha feito outros trabalhos na TV portuguesa, o intérprete de Inácio não consegue convencer. Sua inexpressividade salta aos olhos e torna ainda mais irritante um conjunto cansativo por si só, pois Inácio é passivo e sonso – o que vem rendendo apelidos jocosos, como “Inércio”.

A perda de protagonismo de um personagem não é uma novidade. Um caso conhecido é o de Viver a Vida (2009-10), de Manoel Carlos, que trouxe Taís Araújo como a primeira Helena negra de sua história. Apesar disso, o público não se identificou com o drama da personagem e o próprio desempenho apático de Taís não ajudou – ao contrário da modelo Luciana (Alinne Moraes), cuja saga após ficar tetraplégica conquistou o país e consolidou a carreira de Alinne.

A própria novela das sete atual, Pega Pega, também traz perfis mais interessantes que os ditos protagonistas: Malagueta (Marcelo Serrado) e Maria Pia (Mariana Santos). O mentor do roubo do hotel Carioca Palace e a ex-assessora de Eric (Mateus Solano) se apaixonaram após ela descobrir sobre o crime e, recentemente, com a caçada ao ex-concierge, os dois ganharam um destaque merecido, brilhando nas sequências da prisão do rapaz. O perfil mais humanizado da dupla é infinitamente mais interessante que a constante hipocrisia de Eric e Luiza (Camila Queiroz), prejudicados ainda pelos fracos desempenhos de Solano e Queiroz e pela total falta de química.

Tempo de Amar está na metade de sua trajetória e Vicente cada dia mais ganha espaço e popularidade junto ao público. A torcida pelo par “Mavicente” (junção dos nomes do mocinho e de Maria Vitória) só cresce a cada capítulo, configurando mais um caso de “desvio de protagonismo” em detrimento de Inácio. Porém, o mote principal da novela é o esperado reencontro entre a mocinha e o português, como previsto na obra de Rubem Fonseca que originou a novela de Alcides Nogueira – e que ainda não ocorreu. Todavia, uma coisa é certa: do jeito que Inácio está, dificilmente o público engolirá que Maria Vitória deixe Vicente e volte para ele.


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