Ocupando a primeira linha de shows da Globo às terças (imediatamente após A Força do Querer), desde o dia 25 de julho, Sob Pressão foi uma grata surpresa. Derivada do filme original de 2016 (exibido pela Tela Quente no começo de Julho) – baseado no livro do médico Márcio Maranhão -, e produzida em parceria com a Conspiração Filmes, a série dirigida por Andrucha Waddington e Mini Kerti consegue ir mais fundo e abordar com maior profundidade questões relacionadas à precária realidade da saúde pública brasileira.

Os protagonistas do filme, os médicos Evandro (Júlio Andrade) e Carolina (Marjorie Estiano) e o diretor Samuel (Stepan Nercessian), continuam na nova história, que se passa um ano após o ocorrido no original. Evandro carrega consigo o trauma de não ter conseguido salvar sua esposa na cirurgia, o que fez perder a fé cristã – ao contrário de Carolina, que busca na religião a força para enfrentar a difícil rotina.

O roteiro da equipe liderada por Jorge Furtado (com Lucas Paraizo, Antônio Prata e Márcio Alemão) abre espaço para o envolvimento amoroso dos dois personagens e para o trauma que a médica carrega de ter sido abusada por seu pai na infância e, por isso, mutila seu próprio corpo.

Além dos problemas cotidianos da falta de estrutura, equipamentos insuficientes ou sucateados e vagas insuficientes, a ética também é colocada em questão, através do comportamento dos personagens, os dilemas morais, a discussão entre a ciência e a religiosidade… Tudo em nome do objetivo principal: salvar vidas em meio ao caos.

Aliás, o capítulo desta semana merece um destaque especial. Focado nos dramas de Michele (Bruna Griphao), uma garota que tentou se matar para fugir do pai, Valter (Paulo Miklos), que abusava da própria filha; e Priscila (Cristina Lago), uma locutora que tem um tumor no cérebro, mas não quer fazer a cirurgia por estar à espera de um milagre divino; o episódio chamou atenção pela alta densidade de seu roteiro e pelas primorosas interpretações do elenco.

Bruna Griphao, que participou recentemente de Haja Coração (2016), expressou com competência o desespero de Michele ao fugir de seu próprio pai – a ponto de se jogar da sacada do hospital e tentar se matar. Junto a Marjorie Estiano, protagonizou uma grandiosa cena em que a médica incentiva a paciente a denunciá-lo, culminando na prisão dele. Um momento tocante e de muita emoção que evidenciou o talento de uma das melhores atrizes de sua geração e uma jovem promissora e competente.

Júlio Andrade e Cristina Lago, noutra ponta, também protagonizaram um bom momento na sequência em que Evandro tenta convencer Priscila a aceitar a cirurgia. O talentoso ator ainda retratou perfeitamente a revolta do médico ao descobrir que o tomógrafo comprado para o hospital era um modelo inferior ao que foi pedido, em uma licitação fraudulenta, mas se vê obrigado a autorizar a compra do equipamento para salvar Michele após esta tentar o suicídio.

Além dos protagonistas, a série ainda conta com as participações primorosas dos grandiosos Ângela Leal – que interpreta a adorável Dona Noêmia, atendente da cantina do hospital – e Emiliano Queiroz, que vive Seu Rivaldo, um idoso que vive por lá e não sai de sua maca de jeito nenhum, com medo de perder sua vaga, funcionando como um cronista do descaso do poder público com a saúde. Ainda fazem parte do elenco fixo nomes como Heloísa Jorge, Josie Antello e Pablo Sanábio (que vive o médico residente Charles).

Se o filme Sob Pressão já havia mostrado com competência a difícil situação de nossa saúde pública; a série, a julgar pelos dois episódios exibidos na TV (e o terceiro já está disponível para os assinantes do portal GloboPlay), consegue ser ainda melhor.

Seu roteiro expande os horizontes da história original e abre ainda mais possibilidades para os personagens envolvidos e, por tabela, o primoroso elenco. Além disso, é bom ver a Globo investindo novamente em séries fora da comédia, após as tentativas fracassadas de Supermax e Nada Será Como Antes, no ano passado.


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