Diversas novelas da Rede Globo sofreram com a ação da Censura Federal, como O Bem-Amado (1973), a versão original de Roque Santeiro (1975), que acabou não sendo exibida, e Duas Vidas (1976).

Mas uma das grandes afetadas desta lista foi O Homem Proibido, de 1982, que sofreu inúmeras pressões dos membros do governo por ser baseada em romance homônimo de Nelson Rodrigues (1912-1980), considerado forte para o horário das seis, e estrelada pelo astro da pornochanchada brasileira na época, David Cardoso.

A novela, escrita por Teixeira Filho, que apresentou a sinopse original sob pseudônimo de Suzana Flagg, não conseguiu estrear na data prevista. Estava tudo pronto para a exibição do primeiro capítulo no dia 1º de março de 1982, mas o governo não emitiu a autorização necessária para se colocar o programa no ar.

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“O diretor da Central Globo de Produções, Borjalo, e o autor da novela passaram ontem o dia em Brasília, tentando contornar o problema. Segundo a TV Globo, os cortes foram determinados pela chefe do Departamento de Censura, Solange Maria Teixeira Hernandes, que ainda quer rever os capítulos depois de efetuados os cortes. Com isso, até o início da noite de ontem, a assessoria de imprensa desconhecida a solução que seria dada ao problema”, disse matéria da Folha de S. Paulo de 2 de março de 1982.

Às 18h, foi exibido um rápido comunicado lido por um locutor: “Em virtude de não ter sido liberada pela Censura Federal, não apresentaremos hoje o primeiro capítulo da novela O Homem Proibido”. Os telespectadores assistiram trechos do especial de fim de ano de Roberto Carlos de 1981.

A história, ambientada no Rio de Janeiro (RJ), não tinha nada demais: contava as aventuras amorosas de quatro jovens. Ao protagonista Paulo (David Cardoso), se juntavam Sônia (Elizabeth Savalla), Joyce (Lídia Brondi) e Carlos (Edson Celulari). Sônia e Joyce brigavam pelo amor de Paulo, enquanto Carlos era apaixonado por Joyce.

A trama, enfim, foi liberada para exibição a partir de 2 de março, quando a Globo se comprometeu a fazer cortes em 10 capítulos. Com isso, “em nome da moral e dos bons costumes”, conforme alegavam os censores, a trama começou a ficar inviável. A censura apontava, por exemplo, que os diálogos entre Joyce e Sônia indicavam que as duas eram homossexuais, o que era negado veementemente pelo autor.

Teixeira Filho foi obrigado a criar novos personagens para preencher espaço e inserir os protagonistas em seus núcleos familiares, para o desenvolvimento das histórias paralelas.

Os censores implicaram até com o tema de abertura: Queixa, de Caetano Veloso, teve que ser substituída por uma versão instrumental logo após a estreia.

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Tiro pela culatra

“Por que não programaram a novela para 22 horas? Não sei se Teixeira Filho teve que fazer promessas de bom comportamento aos zelosos titulares de nossa moral e de nossos costumes”, ironizou a crítica Helena Silveira em sua coluna na Folha de S. Paulo de 26 de fevereiro de 1982.

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Alguns dias depois da estreia, Ricardo Cravo Albim, representante da ABERT (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), classificou a intervenção da censura na novela como “radicalismo crescente”.

Só que o tiro dos censores saiu pela culatra: a repercussão das ações funcionou como publicidade, atraindo os telespectadores. A novela passou longe de ser um fiasco como O Amor é Nosso, exibida no horário das sete em 1981.

O Homem Proibido teve 146 capítulos e foi exibida até 20 de agosto de 1982, dando lugar a Paraíso, de Benedito Ruy Barbosa, que fez sucesso.

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Thell de Castro

Apaixonado por televisão desde a infância, Thell de Castro é jornalista, criador e diretor do TV História, que entrou no ar em 2012. Especialista em história da TV, já prestou consultoria para diversas emissoras e escreveu o livro Dicionário da Televisão Brasileira, lançado em 2015 Leia todos os textos do autor