João Emanuel Carneiro ainda não tem um elevado número de novelas em seu currículo, mas várias características suas já ficaram evidentes em muitos trabalhos. Uma delas é a força do núcleo principal e a limitação dos núcleos paralelos. Da Cor do Pecado, Cobras & Lagartos, A Favorita, A Regra do Jogo e até mesmo a aclamada Avenida Brasil apresentaram tramas centrais muito bem estruturadas e atrativas, enquanto pecaram nas secundárias. Porém, ironicamente, o escritor quebrou o que parecia ser uma regra em Segundo Sol.

O núcleo central envolvendo a trama de Beto Falcão (Emílio Dantas) e Luzia (Giovanna Antonelli) se mostra frágil, principalmente em torno da falsa morte do cantor e do conformismo da DJ. Os mocinhos acabam se comportando como dois covardes e as situações protagonizadas por eles não movem o enredo. Como até agora são passivos, viram peças pouco fundamentais na história. Claro que mais para frente é bem provável que tudo isso mude, mas o folhetim já passou do capítulo 60 e o que tem sido visto são conflitos muito mais convidativos nos núcleos paralelos, enquanto os mocinhos ficam se escondendo.

A família do corrupto Severo (Odilon Wagner), por exemplo, é a protagonista dos maiores barracos do roteiro e de muitas viradas de Segundo Sol. O descontrole emocional de Edgar (Caco Ciocler), a submissão de Zefa (Cláudia Di Moura), a fragilidade de Karen (Maria Luisa Mendonça) e a crueldade de Rochelle (Giovanna Lancellotti) são bons ingredientes da problemática estrutura familiar, piorada ainda mais com a volta de um Roberval (Fabrício Boliveira) endinheirado procurando vingança.
O filho da empregada, por sinal, é um perfil complexo que provoca muito mais antipatia do que torcida. E ele movimenta bem o núcleo.

Roberval e Rochelle são os elementos “incendiários”. Se parecem na agressividade e na arrogância, sentindo prazer em humilhar os outros. É preciso citar a cena recente do personagem humilhando Cacau (Fabíula Nascimento) em pleno altar, após ser informado por Rochelle que era traído pela futura esposa com Edgar. Uma sequência longa, forte e muito bem interpretada pelos atores. Outros momentos marcantes envolvendo o núcleo foram o barraco entre Rochelle e Manu (Luisa Arraes) em uma festa promovida pela blogueira e a prisão de Severo, logo depois que a própria neta denunciou o esconderijo da fortuna desviada pelo avô para Roberval. Agora há o “sequestro” (bem sem sentido, diga-se) de Manu como foco dos conflitos.

A trajetória de Rosa (Letícia Colin) é mais uma história considerada secundária que se mostra mais atrativa que a central. A dúbia personagem tem proporcionado várias cenas excelentes para a intérprete e já viveu uma avalanche de emoções até o momento. O romance quente com Ícaro (Chay Suede) conquistou logo no início e sua rivalidade com Laureta (Adriana Esteves) rende ótimas ironias entre as duas. O namoro com o chato Valentim (Danilo Mesquita) cansa, mas ao menos implica em enfrentamentos com Karola (Deborah Secco).

O curioso é que Rosa virou a pedra no sapato da dupla de vilãs e não Luzia, a maior vítima delas. Isso apenas reforça o maior atrativo dos coadjuvantes. A cena em que Rosa foi expulsa de casa pelo pai Agenor (Roberto Bomfim) foi uma das melhores da novela e o desempenho de Kelzy Ecard na pele de Nice merece menção especial. A dor daquela mãe comoveu. Já a aliança inesperada da prostituta com Laureta e Karola, desistindo de contar o segredo descoberto a respeito do roubo do bebê da mocinha, também se mostrou outro trunfo do enredo.

A trama de Maura (Nanda Costa) é mais uma convidativa. O romance com Selma (Carol Fazu) e o assédio do delegado canalha implicaram em bons desdobramentos, destacando ainda o íntegro Ionan (Armando Babaioff), marido da ciumenta Doralice (Roberta Rodrigues), com quem a personagem tem uma bonita cumplicidade. A expulsão da filha de Nice de casa pelo mesmo Agenor foi outro bom momento dramático, assim como a reaproximação com a mãe. A relação entre a policial e a irmã Rosa vem enfrentando uma ruptura desde que a ex-garota de programa virou cafetina, mas as sequências protagonizadas por elas seguem ricas. Todavia, esse imbróglio a respeito da inseminação artificial desejada pela mesma pode prejudicar um pouco o roteiro em virtude do seu envolvimento com Ionan. Em toda novela do autor um gay ou lésbica termina feliz com alguém do sexo oposto. Já cansou.

E, ironicamente, os personagens ditos principais seguem enganados por todos e sem destaque. É normal mocinhos serem feitos de idiotas, mas há um exagero no atual folhetim. Beto seguir com Karola depois de tudo o que Luzia já falou dela é forçado demais, assim como o fato de a mocinha até agora não ter procurado um advogado para saber da sua situação. Fugitiva da polícia por ter assassinado seu marido há 20 anos, a DJ prefere viver como fugitiva trabalhando em festas noturnas e tentando se reaproximar dos filhos, ao invés de ao menos procurar uma defesa da injusta acusação e punir as vilãs que a arruinaram.

A própria família de Beto é desinteressante. Apesar da clara tentativa de repetir o sucesso do núcleo familiar de Tufão (Murilo Benício) em Avenida Brasil, os conflitos em torno de Naná (Arlete Salles), Dodô (José de Abreu), Clóvis (Luis Lobianco) e Gorete (Thalita Carauta) se esgotam facilmente e nem têm graça.

Enquanto isso, os dramas paralelos vão se desenvolvendo de forma competente. A atual tentativa de mexer um pouco no roteiro central tem sido as chantagens de Remy (Vladimir Brichta), amedrontando as vilãs e todos que atrapalham seu caminho. Porém, fica evidente que é apenas uma saída do autor para um famigerado “quem matou?” futuro, da mesma forma como ocorreu com Max (Marcello Novaes) na já citada Avenida Brasil.

Segundo Sol vem se mostrando uma boa novela e João Emanuel Carneiro promete novos trunfos em seu enredo. O núcleo principal tem possibilidade de deslanchar, mas enquanto isso não acontece os secundários vão tomando conta da trama e despertando uma maior atenção do público. Não há dúvida a respeito da maior força dos dramas protagonizados pelos personagens ditos coadjuvantes.


Compartilhar.
Avatar photo

Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor