No dia 25 de julho, na tentativa de alavancar sua grade do começo da noite, a RecordTV promoveu mudanças no horário: reduziu o tempo do Cidade Alerta (uma de suas principais audiências), relançou a novela Os Dez Mandamentos (2015) e estreou sua atual atração das 19h30, Belaventura, além de um novo telejornal local (exibido entre as duas). Após pouco mais de um mês, é visível confirmar o quão errada foi a estratégia de reprisar tão cedo a novela de Vivian de Oliveira, de imenso sucesso em sua exibição original.

A saga de Moisés (Guilherme Winter) se beneficiou, na época, com a rejeição do público mais conservador à Babilônia (2015), problemática novela das 21h global, escrita por Gilberto Braga. Porém, a repercussão da história bíblica se ampliou em sua fase mais decisiva: as 10 pragas enviadas por Deus aos egípcios, culminando na abertura do Mar Vermelho.

A nova etapa se iniciou junto com a estreia de A Regra do Jogo (2015-16), de João Emanuel Carneiro, e causou fortes estragos para a novela global. Esta só viria a “respirar” com o fim da primeira parte da trama religiosa, em novembro daquele ano – uma continuação, com o subtítulo Nova Temporada, seria exibida em 2016 com boa audiência, mas sem o mesmo êxito estrondoso.

Apesar disto, a novela de Vivian conquistou o grande público muito mais pelo apelo bíblico do que pela sua dramaturgia. Por vezes, o texto da autora beirava o tom evangelizador e doutrinário, de forma incômoda. O elenco chamava a atenção pela irregularidade de atuações, tendo como maiores destaques Zé Carlos Machado, Adriana Garambone, Denise del Vecchio, Camila Rodrigues e Larissa Maciel.

Ainda assim, a RecordTV decidiu apostar no potencial de Os Dez Mandamentos em uma reprise no horário das 18h15, diminuindo o tempo do Cidade Alerta, para tentar concorrer com Novo Mundo, na Globo, e a mexicana O Que a Vida Me Roubou, do SBT. E foi aí que a emissora da Barra Funda errou. A ótima novela histórica de Thereza Falcão e Alessandro Marson e a trama latina já tinham seu público fiel consolidado e, desta vez, a temática religiosa não chamou tanta atenção.

Não por acaso, frequentemente a TV dos bispos amarga o quarto lugar na faixa, com médias entre cinco e seis pontos, menos do que o programa policial costumava marcar, e perdendo até mesmo para a Band, com o Brasil Urgente.

A baixa entrega prejudica os programas subsequentes e a responsabilidade de reaquecer o horário nobre fica para a atual novela bíblica, O Rico e Lázaro, que apresenta índices inferiores a suas antecessoras – neste caso, deve-se considerar também a influência da saída da emissora das TVs a cabo, no fim de março, o que derrubou sua audiência geral.

A maior prejudicada com esta estratégia errada é a novela de Gustavo Reiz. Com uma história simpática, no melhor estilo conto de fadas, um elenco competente (com destaque para Helena Fernandes, Floriano Peixoto, Paulo Gorgulho, Camila Rodrigues, Giuseppe Oristânio e Lidi Lisboa, entre outros), direção acertada e ritmo agradável (um pouco lento, mas nada que desabone o bom conjunto), Belaventura deveria ter sido mais valorizada pela emissora.

A impressão que se tem é que a Record deu mais importância para a reprise de seu anterior sucesso bíblico do que para um produto novo, que deveria manter os bons índices das antecessoras Escrava Mãe (2016) e Escrava Isaura (reprise da novela de 2004, que chegou em seus últimos capítulos a superar os índices de O Rico e Lázaro).

O intervalo curto entre a novela original e a reprise é uma prática recorrente nas emissoras. O próprio Vale a Pena Ver de Novo, desde sua estreia na década de 80, já reapresentou novelas relativamente recentes, caso de Sassaricando (1987-88), que voltou ao ar em 1990, ou de Da Cor do Pecado (2004), que retornaria em 2007 e 2012.

No SBT, Carrossel (2012-13) também teve uma primeira reapresentação anunciada poucos meses após o encerramento da exibição original. Porém, o retorno foi cancelado em pouco tempo, devido à baixa audiência – o que é improvável que aconteça com a trama bíblica.

Os Dez Mandamentos fez um inegável sucesso de público quando transmitido pela primeira vez, em 2015. Porém, a decisão da RecordTV de reexibir precocemente a história cristã, em meio a uma concorrência consolidada, custou caro e acarretou na perda de ibope. E quem paga o pato, sem merecer, é Belaventura. É de se lamentar, uma vez que a história das 19h30 poderia ser uma ótima opção para quem curte a teledramaturgia não-bíblica produzida pela TV da Barra Funda.


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