Reprise de Ribeirão do Tempo reverenciou tempos de criatividade e competência nas novelas da RecordTV
24/01/2018 às 0h30
Longo curso o de Ribeirão do Tempo, novela de 2010 que a Record TV reexibiu entre 6 de março de 2017 e 23 de janeiro de 2018. Nesta “nova” empreitada da nascente à foz, foram 232 capítulos – apenas 18 a menos do que a exibição original, marcada por um estica e puxa constante, o que obrigou o autor Marcílio Moraes a lançar mão dos mais diversos recursos para que a audiência transcorresse tranquila. O resultado: uma trama oscilante que, assim como um rio, passou por momentos de total calmaria e outros de forte correnteza.
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A reapresentação surpreendeu até o mais incrédulo dos noveleiros: ‘Ribeirão’ chega ao fim com 6,2 pontos de média na Grande São Paulo. Menos do que os 6,8 de Amor e Intrigas (de 2007; reapresentada em 2016) e do que os 6,5 de Prova de Amor (de 2005, reexibida em 2015). A ligeira queda, contudo, não afetou a posição da trama no ranking de audiência. Bem amparado pelo jornalístico Balanço Geral, o folhetim se manteve na vice-liderança, batendo forte no eternamente combalido Fofocalizando, do SBT – em Salvador, como o TV História noticiou ontem (23), a novela liderou durante todo o segundo semestre.
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Sátira do Brasil passada em uma cidadezinha que ninguém sabe onde se localiza, cortada pelo ribeirão que dá nome à história, a novela também manteve, em 2010, público fiel ao longo de quase um ano – 11,5 de média -, mas não gerou burburinho. Ainda assim, certamente agradou em cheio a quem assistiu e pode afirmar, sem dúvida nenhuma, que o prometido pelo autor na época da estreia foi cumprido: personagens curiosos, em uma trama calcada nos remanescentes do período militar e no atual cenário político brasileiro, entremeada por cenas de muita ação e adrenalina.
Ribeirão do Tempo começou com duas tramas correndo em paralelo: a construção de um resort que causaria um grave impacto ambiental na cidade, comandada por Arminda (Bianca Rinaldi) e a desagregação da família de Nicolau (Heitor Martinez). A obra do resort fora embargada, graças ao Professor Flores (Antonio Grassi), figura muito respeitada no lugarejo, que perde sua esposa, Dirce (Françoise Forton), logo no início da trama. Posando de vítima, Flores culpa os construtores do resort pelo homicídio e coloca a cidade em polvorosa. Os ribeirenses sequer suspeitavam que, na verdade, tudo não passava de um plano articulado por Flores, obstinado por uma revolução que não conseguira implantar na época da ditadura, para alcançar o poder. Plano este que ganhou força quando as tramas de Flores e Nicolau confluíram, causando tormenta nas águas serenas do ribeirão.
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Até então visto como um playboy arrogante, Nicolau revelou sua verdadeira face ao matar o pai, Senador Érico (Henrique Martins), influenciado por Flores. Com o crime, o jovem assumiria a vaga do pai no Senado. Era o que Flores precisava para atingir seus intentos. Manipulando Nicolau, ele conseguiria tomar o poder e fazer sua tão sonhada revolução. Ótimos desempenhos de Antônio Grassi e Heitor Martinez, que acabou dominando a novela, aproveitando-se da maldade exacerbada de Nicolau, que chegou a abusar sexualmente de uma menor de idade e acabou se enforcando na praça da cidade, no derradeiro capítulo.
Enquanto isso, outros afluentes desaguavam no ribeirão. Um deles era Querêncio (Taumaturgo Ferreira), artista plástico beberrão que se descobre herdeiro da fortuna de Madame Durrell (Jacqueline Laurence), a todo-poderosa do resort. Rico, Querêncio perde a estribeira e, tal qual Nicolau, também se deixa envolver por Flores, acabando por se eleger prefeito da cidade, cargo do qual lançou mão no capítulo de ontem. O grande barato do personagem, entretanto, foi sua relação com a prostituta Marisa, belo trabalho da bela Daniela Galli. A filha de Querêncio, Filomena (Liliana Castro), se aproveita da fortuna do pai para casar com o endividado Tito (Ângelo Paes Leme), que encabeçava o núcleo da pousada, suplantado ao longo da novela, muito em parte por conta das idas e vindas deste casal.
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Nas margens do ribeirão, outros personagens imprimiam graça e emoção à novela. Juliana Baroni talvez tenha sido o maior acerto na escalação. Fez de sua Karina a grande vilã da cidadezinha. Ana Paula Tabalipa e Raymundo de Souza se aproveitaram da ligação de Iara e Virgílio, seus papeis, com o senador Nicolau, para crescerem dentro da trama. Além destes, Angelina Muniz (Léa), André di Biase (Ari Jumento), Umberto Magnani (Delegado Ajuricaba), Flávia Monteiro (Marta), Cássio Scapin (Sereno), Thelmo Fernandes (Nasinho) e José Dumont (Romeu) surpreenderam ao longo da narrativa.
Mas quem se destacou de fato foi Caio Junqueira que fez de seu abobalhado Joca o grande herói da novela. A parceria com a Bianca Rinaldi, que apesar de um começo ruim conseguiu compreender e se aproveitar de todas as nuances de sua Arminda, arrebatou o público.
Evidente que uma edição não teria feito mal à esta reprise. O sucesso, porém, atesta a eficácia de um bom enredo e de um bom elenco – o mesmo se pode dizer das outras novelas da tarde, Luz do Sol (2007) e Bicho do Mato (2006). Convenhamos: tudo o que não se vê nas tramas do horário nobre, Belaventura e Apocalipse. Será a hora de rever as diretrizes do departamento de teledramaturgia e colocar “ordem na casa”? Creio que sim.