Quem está assistindo a supersérie Os Dias Eram Assim, exibida pela Globo, viu que os personagens principais, Alice (Sophie Charlotte) e Renato (Renato Góes), se reencontraram durante uma manifestação das Diretas Já, evento que uniu o país todo em prol de uma ideia: eleições diretas para presidente da república.
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O movimento começou em 1983, uma época em que a ditadura estava perdendo força, mas ainda existiam traços da censura no ar. E como foi a cobertura da televisão de um evento grandioso que pedia a volta da democracia em plena ditadura?
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Canal Livre e Teotônio Vilela
O senador alagoano Teotônio Vilela foi o principal mentor do movimento. Em entrevista histórica ao programa Canal Livre, da Rede Bandeirantes, o parlamentar trouxe à tona a ideia das Diretas Já que, em poucos meses, ganharia forma e força no meio político. Infelizmente, o menestrel das Alagoas acabou falecendo um ano depois e não viu a força que sua iniciativa gerou em todo o país.
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Bandeirantes: Ao vivo nas Diretas
Em 1983, o então deputado Dante de Oliveira, apresentou no Congresso Nacional uma emenda que previa a volta das eleições diretas para a presidência da republica. Em poucos meses, as manifestações foram ocorrendo no país e a imprensa cobria de forma tímida, apresentando apenas alguns destaques sobre o tema em seus telejornais.
A Globo mostrava trechos curtos dos comícios apenas em seus telejornais locais. Já a Rede Bandeirantes foi uma das primeiras e únicas a transmitir ao vivo alguns comícios, principalmente o maior de todos até então, na praça da Sé, reunindo em torno de 300 mil pessoas.
A omissão da Rede Globo
Um dos fatos mais lembrados foi a omissão da Rede Globo em noticiar os comícios pró-diretas em todo o Brasil: Roberto Marinho barrou a cobertura, preocupado que o fato poderia levar a uma inquietação nacional. No Jornal Nacional, Ernesto Paglia fez uma matéria em que o ponto central era o aniversário de São Paulo, os 430 anos da cidade, destacando as festividades e uma manifestação na Praça da Sé. Porém, justamente naquele dia, ocorreu o movimento que reuniu 300 mil pessoas em prol das diretas e o JN apenas o citou como um evento político de pouca importância.
A Globo foi duramente criticada por não dar o devido valor ao fato.
De um lado, a emissora sofria pressão para dar destaque aos comícios e, do outro, a pressão era dos militares, exigindo que a Globo ficasse de fora disso.
Diretas Já: finalmente no horário nobre
O movimento crescia cada vez mais e era impossível ficar alheio a tudo que ocorria naqueles meses de 1984. A Globo foi, aos poucos, mostrando as manifestações que ocorriam no país em seu principal telejornal, o Jornal Nacional.
No dia 10 de abril, ocorreu a maior manifestação da historia das Diretas Já: um milhão de pessoas no bairro da Candelária, no Rio de Janeiro, pediam a volta das eleições diretas. O comício tomou quase toda duração do Jornal Nacional, que transmitiu alguns discursos ao vivo e atrasou a tão aguardada novela das oito.
Na tentativa de intimidar a emissora, o exército usou um helicóptero para sobrevoar a sede da TV. O Jornal da Globo, naquele dia, dedicou 21 minutos ao comício. A Vênus platinada não resistiu ao clamor de uma sociedade que, por muitos anos, foi calada pelos militares.
A censura volta a atacar
No dia 25 de abril de 1984, seria votada pela Câmara dos Deputados a emenda que poderia trazer as eleições diretas para o povo. O presidente João Figueiredo adotou medidas de emergência no Distrito Federal, impossibilitando que qualquer veículo de comunicação falasse sobre elas e transmitisse ao vivo a votação da emenda.
Essa “medida de emergência” era pura e simplesmente a censura: qualquer reportagem que era feita passava pelo crivo do Dentel, o antigo Departamento Nacional de Telecomunicações. Com esse veto, grande parte delas foi totalmente censurada. Nos telejornais da Globo, repórteres e alguns âncoras mostravam um apoio silencioso: usavam broches ou peças de roupas na cor amarela, a cor das diretas. Jô Soares, que tinha um quadro no Jornal da Globo, ficou 30 segundos em silêncio e a população só saberia do resultado após a votação.
TV Gazeta “lacrada” e fora do ar
No dia 24 de abril, um dia antes da votação no congresso, Paulo Markun, apresentador do telejornal da TV Gazeta São Paulo No Ar, ligou para o então vice-governador de SP, Orestes Quércia, que estava em Brasília. Eis um trecho da conversa entre o jornalista e o vice-governador:
Markun – Alô, vice-governador? Tudo bem? Como está o tempo aí?
Quércia – Bem, hoje, é muito agitado.
Markun – Fez sol, não?
Quércia – É, fez sol, muita buzina.
Markun – Muito trânsito?
Quércia – Muito trânsito. Hoje, o trânsito estava muito congestionado.Por volta das 18 horas. E houve um barulho muito grande em Brasília, todos os carros buzinando, isso nunca ocorreu em Brasília, primeira vez.
Markun – Congestionamento de trânsito, que é absolutamente inesperado numa cidade planejada.
Essa conversa comentava, sutilmente, o buzinaço que ocorria naquele momento na capital federal em manifestação pelas Diretas Já. No dia seguinte, O Dentel foi até a TV Gazeta e lacrou os transmissores da emissora, retornando apenas no dia seguinte, depois de 24 horas fora do ar.
Mesmo assim, a emenda acabou não passando no congresso, pois não conseguiu atingir a maioria de dois terços exigidos para ser aprovada e acabou perdendo por 22 votos. Mas o movimento Diretas Já marcou o fim da ditadura, que ocorreu no ano seguinte após a vitória de Tancredo Neves no colégio eleitoral. O país se uniu ante a um desejo: escolher o próximo presidente por voto direto.
Em 1984, os dias eram assim. Hoje, com todos os escândalos de corrupção em todos os grandes partidos, os dias poderiam ser assim, como na época das Diretas Já.
Fonte:
Diretas Já: 15 meses que abalaram a ditadura (Domingos Leonelli, Dante de Oliveira)
Jornal Nacional – A noticia faz historia (Zahar)
Av. Paulista, 900 – A historia da TV Gazeta (Elmo Francfort)