Uma das fórmulas dos programas sensacionalistas é fazer do palco uma tribuna popular. Pessoas comuns levam seus problemas pessoais para que o apresentador tente resolver de uma forma pacífica, mas o que acontece são gritos e pancadarias.
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Ratinho conseguiu a fama por conta desses casos e, muitas vezes, bateu a Globo no horário nobre. Mas uma dessas reportagens, porém, mostrou que a suposta vida real era ficção.
Depois do sucesso arrebatador na Record, Ratinho foi contratado pelo SBT em 1998 e enfiou no bolso um contrato milionário. O Programa do Ratinho seguiu com os assuntos polêmicos e brigas no palco. Tudo parecia verídico, até que um pedreiro revelou a realidade.
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José de Oliveira estava no terminal de ônibus de Mauá (SP) quando foi abordado por uma mulher.
“Ela me mostrou a Regina [produtora do Programa do Ratinho], que disse que me daria 100 reais para eu fazer um papel na televisão”, contou à Folha de S. Paulo em 18 de outubro de 1998.
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Um homem que foi traído
José aceitou, foi até o SBT e descobriu qual seria o “personagem” que iria interpretar no palco.
“Só fui saber que era papel de corno e que já havia uma fita gravada quando cheguei no SBT. Já era tarde para desistir. E a Regina disse que eu não ganharia nada. Então fiz o melhor possível”, disse.
“A produção me instruiu a fazer esse trabalho. Disseram que não era para bater na cara, mas o rapaz que fazia o papel de meu cunhado me deu um soco no rosto, e eu tive que revidar. Colocaria até um chapéu de chifres na minha cabeça. Agora todo mundo me chama de chifrudo”, finalizou.
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“Acham que sou gay”
Além de José, outra pessoa aceitou participar da atração, mas o papel era outro: o homem que virava travesti e traía a mulher.
“Estava na padaria, e essa pessoa [produtora da atração] me convidou para fazer um papel no Programa do Ratinho. Eu estava sem dinheiro e topei”, disse Josmar Ramos à Folha de S. Paulo.
Ele foi levado para um salão de beleza, foi maquiado e recebeu roupas femininas. O balconista foi levado até a Avenida Industrial, que fica em Santo André (SP), local conhecido por ser um ponto de prostituição de travestis.
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No palco, duas mulheres que ele não conhecia diziam ser esposa e cunhada de Josmar, afirmando que ele traía a mulher na madrugada e que tinham imagens para provar. Assim foram exibidas cenas dele vestido de mulher na avenida.
Após sua participação, ele ganhou 100 reais e usou o dinheiro para comprar roupas para os seus filhos.
“Mas todos acham que sou gay”, afirmou.
Processo nas costas
Depois da denúncia da Folha, o caso ganhou repercussão e foi parar no Jornal Nacional.
No processo do promotor Clilton Guimarães dos Santos, uma multa exigia 35 milhões de reais ao SBT, além do Programa do Ratinho exibir quadros “educativos ou institucionais em defesa dos direitos humanos, do meio ambiente, do consumidor e de esclarecimentos contra as drogas”.
O apresentador usou o seu programa para responder o promotor e as críticas que sofreu de órgãos da imprensa.
“Até acho que o senhor deva processar o meu programa. Vou constituir um advogado e vou responder. Mas por que o senhor não vai processar os traficantes de São Paulo? Os ladrões do governo? Vale a pena perder tempo com isso“, esbravejou.
O apresentador afirmou que tomaria todas as medidas para evitar as fraudes.
“Eu ia mandar investigar todos os casos. Se era ou não era falso. Pois bem, em uma semana nós não temos condições de verificar. Agora quem vier para o nosso programa vai assinar um documento elaborado pelo nosso advogado e a pessoa vai ter que falar a verdade, se não vou processá-lo”, afirmou.
Leão na jaula
E no meio dessa história, o nome de outro apresentador apareceu nos depoimentos ao Ministério Público. Gilberto Barros, o Leão, foi acusado de levar ao palco histórias combinadas. O Leão Livre, exibido pela Record, seguia a cartilha da baixaria de Ratinho.
José de Oliveira e Geraldo Barbosa do Nascimento afirmaram em depoimento que a produtora que trabalhava para o SBT como freelancer também prestava serviços à Record. O alvo eram pessoas desempregadas que simulavam brigas e ganhavam um cachê de 100 reais.
A produção do Leão negou os fatos e afirmou à Folha de S. Paulo, em 24 de outubro de 1998, que todos os casos eram verdadeiros.
Isso fez com que os programas sensacionalistas apostassem em outros quadros e situações, como os exames de DNA. Esse tipo de história voltaria no início dos anos 2000, com os programas de João Kleber e Márcia Goldschmidt. Ambos foram acusados de fraude e todas as acusações foram negadas.