Benedito Ruy Barbosa, autor de O Rei do Gado, desenvolveu a novela para a Globo enquanto travava batalhas com o SBT. O episódio, um dos mais peculiares da televisão brasileira na década de 1990, envolveu também dois colegas de ofício de Benedito: Gloria Perez e Walther Negrão.
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Em 1996, empolgado com os resultados do departamento de Dramaturgia comandado pelo diretor Nilton Travesso, Silvio Santos correu atrás de novelistas da principal concorrente. Ele estabeleceu acordos com Ruy Barbosa, Gloria e Negrão. Os três, porém, voltaram atrás…
Vai e volta
O acerto do SBT com Benedito Ruy Barbosa e Walther Negrão (foto) foi anunciado pelo jornal O Globo, em 25 de fevereiro de 1996. A matéria também destacou o interesse do canal em Aguinaldo Silva, além de Alcides Nogueira, Ângela Carneiro, Elizabeth Jhin, Maria Adelaide Amaral e Vinícius Vianna, então colaboradores.
Posteriormente, Silvio Santos adquiriu o passe de Gloria Perez. Os compromissos propostos pelo empresário respeitavam os contratos dos autores com a Globo: eles só mudariam de empresa dentro de dois anos, caso não estivessem no ar.
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Benedito então foi cuidar de O Rei do Gado, enquanto Negrão deu início às pesquisas de Anjo de Mim. Gloria, conforme estabelecido após concluir Explode Coração (1995), voltou-se para o julgamento dos assassinos de sua filha, Daniella Perez.
Meses depois, a rede dos Marinho convenceu os novelistas a permanecerem na casa. Silvio reagiu! Ele acionou a Justiça para cobrar explicações de Ruy Barbosa, Gloria e Negrão. O caso de Benedito, em específico, gerou protestos de executivos da emissora, por conta da antecipação do pagamento.
Desacerto
Guilherme Stoliar, então vice-presidente do SBT, detalhou o negócio fechado com Benedito Ruy Barbosa e as expectativas sobre em entrevista ao Globo, em 2 de junho de 1996.
“Ele assinou conosco para escrever duas novelas a partir de 1998, quando termina o contrato com a Rede Globo. […] Ele tem um contrato com a gente e já recebeu US$ 1 milhão. Queríamos explicação sobre as notícias divulgadas pela imprensa de que ele teria renovado o contrato com a Globo, mas não tenho dúvida de que ele honrará o compromisso e até 2001 já terá escrito as duas novelas”, afirmou.
Também para O Globo, em 22 de maio de 1996, Benedito se defendeu:
“Tudo isso é muito chato. Sou amigo do Silvio Santos e assinei com o SBT porque estava mesmo decidido a trocar de canal em janeiro de 1998, quando acaba o meu contrato com a Globo. Depois disso, no entanto, eles criaram tanta confusão, que eu só posso achar que o desejo de me ter não era tão grande assim”.
Peixe fora d’água?
Na mesma matéria, Ruy Barbosa salientou que sua preocupação, no momento, era o folhetim estrelado por Antonio Fagundes (foto), então às vésperas da estreia.
“Não quero desviar minha atenção de ‘O Rei do Gado’. O Luiz Fernando Carvalho (diretor) está começando a gravar a segunda fase da novela e este é mais um trabalho que estamos fazendo com todo o carinho”, enfatizou.
“Não tenho medo nenhum de sair da Globo. Sei que tenho condições de fazer sucesso em outras emissoras mas, sem sombra de dúvida, é ela quem dá a melhor retaguarda, os recursos necessários para se contar uma bela história”, completou o autor, de bem-sucedidas passagens pela Band e pela Manchete.
Roberto Talma, então parceiro do SBT graças à produtora JPO – responsável por tramas como Colégio Brasil (1996) e Dona Anja (1996) –, discordou do novelista.
“Ele é um autor de produção cara, um épico que repete o mesmo Rei Lear (peça de William Shakespeare) há anos. Suas novelas são caras até para a Globo e requerem uma cultura administrativa que o SBT ainda não desenvolveu”, lamentou em depoimento ao jornal O Estado de São Paulo, de 2 de junho de 1996.
Casos encerrados
Em 2007, o SBT obteve a primeira vitória no processo contra os “quase funcionários”. A Globo, que havia se comprometido a arcar com os custos dos distratos, pagou os R$ 17,8 milhões referentes à dívida de Walther Negrão com Silvio Santos.
O dono do Baú, aliás, aproveitou a ocasião para alfinetar Benedito Ruy Barbosa e Gloria Perez. Em nota redigida por ele, e publicada no site da emissora, Silvio afirmou que “contratos devem ser respeitados e, quando isso não acontece, os infratores pagarão na Justiça pelas irregularidades”.
O processo relacionado a Gloria chegou ao fim logo depois, com o ressarcimento ao SBT de R$ 24,4 milhões. Pelo desacordo com Benedito, a rede de TV recebeu R$ 25 milhões.