Personagem que nem deveria existir não acrescentou nada em Pantanal
04/10/2022 às 20h15
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Impossível não cair na repetição em torno da fidelidade tacanha de Bruno Luperi ao roteiro de Benedito Ruy Barbosa. O neto se recusou a mudar qualquer mínimo conflito que seja no remake de Pantanal. Tirando pequenas alterações que em nada afetam o roteiro, a trama é praticamente idêntica ao conjunto que foi exibido em 1990 na Rede Manchete. É como se a Globo estivesse reprisando a obra da concorrente, mas com a sua tecnologia e o seu elenco. E isso não é o significado de remake, embora alguns achem.
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A maior falha da atitude de Luperi está na persistência dos erros da versão original. O autor tinha a chance de consertar todas as falhas que a produção teve há 32 anos e transformá-la em um produto perto da perfeição. Mas a sua justificativa é que a trama foi gravada com muita antecedência por conta das cheias do Pantanal e pela pandemia.
Sem desculpa
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Só que a desculpa usada recentemente em uma breve entrevista no Encontro não se sustenta. Um Lugar ao Sol, Nos Tempos do Imperador e Quanto Mais Vida, Melhor! foram novelas prejudicadas pela pandemia. Foram obras fechadas que não puderam ser modificadas de acordo com a resposta do público. Só que Pantanal não se enquadra nesse time.
O remake foi tratado com todos os privilégios possíveis pela Globo, incluindo o intenso trabalho de divulgação. E várias cenas da novela foram gravadas com a produção já no ar. Aliás, até hoje tem ator gravando cena. Incluindo sequências da reta final e de publicidade inseridas na história. Então como Luperi pode usar a desculpa de uma frente grande de capítulos?
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Se o remake tivesse sido um fracasso de audiência, não daria para modificar nada? Há controvérsias. E todo o longo preâmbulo deste texto tem como objetivo chegar ao casal Zé Lucas (Irandhir Santos) e Irma (Camila Morgado). Sem dúvida, o maior tiro no pé do escritor em sua ‘adaptação’.
Improviso
Novamente é preciso lembrar: Zé Lucas foi um perfil criado de última hora por Benedito em 1990. Tudo porque o público não se conformou com a saída de Paulo Gorgulho da novela depois da mudança de fase; ou seja, o personagem nem deveria existir.
O ator vivia o Zé Leôncio, papel que foi para Cláudio Marzo com a passagem de tempo. Para resolver o problema, o autor criou mais um filho para o protagonista. Mas como foi uma espécie de improviso, o personagem não tinha um planejamento ou um arco dramático estruturado. Lucas acabou jogado de um núcleo para o outro e muitas vezes não tinha função, era mais um estorvo de cena. Afinal, em um momento estava em busca de um rumo na vida quando encontrou o pai por acaso.
Depois, virou rival dos irmãos para a conquista da tal sela de prata e posteriormente teve uma paixão súbita por Juma (Cristiana Oliveira), que resultou em um quase estupro. Ainda se apaixonou pela jornalista Érica (Gisela Reimann) e a largou no altar quando descobriu a farsa da gravidez. Só terminou ao lado de Irma (Elaine Cristina) porque Benedito precisou retirar Almir Sater (intérprete do Trindade) da história para o ator protagonizar Ana Raio de Zé Trovão. Ou seja, foram situações que prejudicaram a narrativa do folhetim na época.
Tudo poderia ter sido melhorado no remake. Até mesmo para uma valorização de Zé Lucas. Afinal, o papel ficou com o brilhante Irandhir Santos. Era a oportunidade de criar um novo arco para o primogênito de Leôncio (Marcos Palmeira). Ia alterar muito a história? Não muito. E ainda que alterasse, qual o problema?
Tramas paralelas
Tramas paralelas equivocadas são corriqueiras em folhetins e com Pantanal não seria diferente. Tanto que, quando o grande público lembra da obra de 1990, um dos perfis que ninguém ligava ou recordava com carinho era justamente o Zé Lucas. Juma, Velho do Rio, Maria Marruá, Leôncio, Tenório, Maria Bruaca, enfim, nunca faltou nome para o telespectador guardar na memória. Só que Lucas nunca esteve na lista. E não esteve porque era uma das falhas do enredo.
Com a saída de Trindade (Gabriel Sater), seguindo à risca o roteiro original, o remake perdeu muito. Até porque está em uma longa fase de barriga onde nada de relevante acontece. A história também se arrastava há 32 anos, mas tinha mais de 200 capítulos. Agora, a produção terá 173 capítulos. Houve uma redução significativa, mas nem assim Luperi evitou a criticada fase de marasmo muito lembrada em 1990.
Isso porque não criou nenhum conflito novo, então não adiantou reduzir o número de dias de folhetim no ar. E toda a construção do envolvimento entre Zé Lucas e Irma soa forçado. A personagem se conformou muito rapidamente com o abandono do homem que dizia amar. Se sofreu por três dias, foi muito.
Rejeição
Na época, era compreensível a superficialidade da aproximação porque o autor teve que se virar com o que tinha diante da eliminação de um personagem tão emblemático. Mas Luperi não precisou lidar com imprevistos. Ele apenas copiou e colou tudo o que o avô fez, ainda que tenha soado equivocado. Ou seja, quis repetir os erros e não consertá-los.
A rejeição do público nas redes sociais é imensa e as várias críticas merecidas. Importante ressaltar que nenhum autor tem a obrigação de ceder a pressão popular ou a palpites sobre suas histórias. Afinal, são ficções onde eles são os criadores.
Mas no caso de Bruno Luperi é tudo diferente. A trama não é dele e Benedito não teria criado o romance entre Irma e Zé Lucas se Almir Sater não tivesse sido escalado para uma outra produção. E o próprio neto faz questão de repetir em entrevistas que o avô lhe deu total liberdade na adaptação.
Se é verdade ou não, só os familiares e a Globo sabem, mas a afirmação apenas reforça a sua covardia em mexer no roteiro. O casal formado por Camila Morgado e Irandhir Santos se mostrou o maior equívoco da reta final do remake.