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A programação da Globo vive um contraste. Enquanto as reprises de Chocolate com Pimenta (2003) e O Rei do Gado (1996) bombam à tarde, as inéditas Cara e Coragem e Travessia são ignoradas por boa parte do público.
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O mais impressionante deste cenário é que tanto O Rei do Gado quanto Chocolate com Pimenta estão sendo exibidas pela quarta vez na emissora.
Afinal, qual a lição que a Globo deve tirar desta situação?
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Clássicos
As duas reprises vespertinas da Globo são dois grandes clássicos da dramaturgia. Chocolate com Pimenta consolidou o estilo “comédia romântica de época” que consagrou a carreira de Walcyr Carrasco. Já O Rei do Gado é o dramalhão rural típico de Benedito Ruy Barbosa que, ao lado de Renascer (1993) e Pantanal (1990), forma uma trinca poderosa.
Apesar de serem duas novelas diferentes, elas utilizam muito bem as fórmulas mais básicas de um bom folhetim. São tramas calcadas na emoção: cada uma ao seu modo, elas fisgam o público pelo que há de mais elementar.
Chocolate com Pimenta é um romance ingênuo, divertido e familiar. Conta com uma galeria de personagens carismáticos, que seguram a trama por meio de gags que vão se reciclando ao longo de seus mais de 200 capítulos. Seus personagens parecem vivos e se conectam com o público por meio da identificação.
Já O Rei do Gado traz um pano de fundo contemporâneo que ainda parece bastante atual, mesmo já tendo se passado quase 30 anos de sua produção.
Ao mesmo tempo, fisga o espectador médio com duas fórmulas básicas: o romance a la My Fair Lady de Bruno Mezenga (Antonio Fagundes) e Luana (Patrícia Pillar), além do conflito familiar shakespereano entre os Mezenga e os Berdinazzi. É uma trama muito bem construída.
Sem emoção
Enquanto isso, o aparente pouco caso do público com Cara e Coragem e Travessia mostram o quanto as novelas atuais carecem de emoção. A novela das sete, por exemplo, se preocupou em criar um mistério, mas não conseguiu fazer a audiência se conectar aos seus personagens. O povão não embarcou na história.
O mesmo problema aparece em Travessia, e de uma maneira ainda pior, já que a trama é toda mal ajambrada. Além da história não fazer sentido, seus personagens não “conversam” com o público. Brisa (Lucy Alves), Oto (Romulo Estrela) e cia parecem gelados, movidos pelas circunstâncias. Não são de carne e osso.
Na verdade, Travessia e Cara e Coragem só reforçam um problema que vem se tornando frequente nos folhetins da Globo: muita preocupação com a forma, pouca preocupação com o conteúdo. É ótimo ver uma novela bem embalada, com cenografia suntuosa e direção surpreendente. Mas tudo isso é apenas um amontoado de técnicas se não houver emoção envolvida. O público quer se emocionar, e não reparar na fotografia da cena.
Remakes em alta
Justamente por isso o remake de Pantanal (2022) fez tanto sucesso. A novela ofereceu ao público um visual de encher os olhos. Mas, mais do que isso, deu aos espectadores emoção. Bons personagens, magia, conflitos humanos bem construídos, tudo dentro do que se espera de uma novela clássica. Um bom folhetim.
Por isso, o público parece mais interessado em histórias antigas do que novas. Porque as novelas antigas, como se vê, tinham um potencial de encantamento muito maior do que as atuais. Algo se perdeu com o tempo, e isso fica claro quando comparamos as reprises com as novelas novas.
Evidentemente, evoluir é preciso. Mas, neste processo, não se pode perder de vista o elemento básico do folhetim, que é a emoção. Veja Todas as Flores, um ótimo exemplo de novela nova, bem fincada na contemporaneidade, mas que em nenhum momento trai o que é primordial num folhetim. É um novelão.
Cara e Coragem passou longe de ser um novelão. Travessia, pior ainda. Enquanto as atuais novelas insistirem nesta toada mecânica, o público continuará preferindo as reprises.