Pega Pega, atual novela das sete, tem muito o que comemorar em termos de audiência. Com autoria da estreante Cláudia Souto e direção de Luiz Henrique Rios, o folhetim apresenta uma média geral de 28 pontos até o momento – a melhor trajetória inicial de uma trama do horário desde o fenômeno Cheias de Charme (2012).

Apesar dos ótimos números, a novela não provoca nem de longe a mesma repercussão das histórias de outras faixas (especialmente A Força do Querer, Novo Mundo e Malhação Viva a Diferença). E grande parte disso se deve ao seu roteiro insosso e inconsistente.

Fundamentado no assalto ao hotel Carioca Palace, em que quatro funcionários roubaram 40 milhões de dólares – valor pelo qual o negócio foi comprado pelo empresário Eric (Mateus Solano) -, o enredo não tem um fio condutor convincente.

O desenvolvimento da situação é arrastado e atualmente se pauta pelo arrependimento de um dos ladrões, o garçom Júlio (Thiago Martins), que quer devolver a sua parte e, em meio a isso, apaixona-se pela inspetora federal Antônia (Vanessa Giácomo), encarregada do caso. O romance é muito bobo e o rapaz irrita por sua passividade e vitimismo excessivos.

O romance entre Eric e Luiza (Camila Queiroz), neta do dono do hotel – Pedrinho Guimarães (Marcos Caruso) – , desde o começo se revelou um dos maiores erros da trama. A evidente falta de química entre os atores – apesar de um treinamento intensivo feito antes da estreia -, as atuações pouco convincentes de Solano e Camila e o desenvolvimento excessivamente rápido das situações não permitiram que se criasse uma identificação do casal com o público. Afinal, de um capítulo para outro, eles se beijaram, foram para a cama, ela já se declarou perdidamente apaixonada e ainda se achou no direito de se sentir traída porque Eric comprou o hotel. Difícil engolir algo tão sem propósito.

A história de Bebeth (Valentina Herzsage), filha de Eric, que se sente culpada pela morte da mãe, também causou estranhamento pelo fato de ela aparecer falando com um canguru imaginário – o que posteriormente foi explicado em função de um transtorno de personalidade. Mais tarde, o canguru foi retirado da história, mas o núcleo continuou sem dizer a que veio.

Outra trama sem nenhuma utilidade é o núcleo do teatro de bonecos, do qual fazem parte Márcio (Jaffar Bambirra), Teresa (Dani Barros) e Rodrigo (Danton Mello). O canguru com o qual Bebeth conversava era uma marionete perdida deste núcleo, que entedia por ter um conflito desinteressante: Rodrigo é contra a exploração comercial de sua arte.

Nem mesmo a história de amor interrompido entre Pedrinho e a esnobe Sabine (Irene Ravache) consegue despertar atenção. Sócia de Eric Ribeiro, a socialite odeia o Brasil e voltou ao país para tirar satisfações com o empresário e, em meio ao conflito, reencontra seu antigo amor do passado. Apesar do bom entrecho, a fraca condução não permite uma melhor exploração desta história.

Em função de todo este conjunto frágil, vários atores têm seu talento desperdiçado, como Marcos Caruso (novamente fazendo um bon vivant falido), Irene Ravache (que merecia um tipo mais à sua altura após brilhante atuação em Além do Tempo), Milton Gonçalves, Cristina Pereira e Nicette Bruno – estas últimas vivem Prazeres e Elza, tias de Júlio. E ainda há o desempenho inexpressivo de Thiago Martins, um evidente erro de escalação.

Apesar disso, três nomes conseguem se sobressair: Nanda Costa, Mariana Santos e Marcelo Serrado. A primeira, que interpreta a maluquinha camareira Sandra Helena, acertou o tom da personalidade sexy e deslumbrada da loira e superou o trauma do fracasso de Morena, sua protagonista em Salve Jorge (2012-13), além de ter uma ótima sintonia com João Baldasserini (o recepcionista Aguinaldo).

Mariana, oriunda de participações no campo do humor (especialmente o Zorra Total e o Amor e Sexo), investe em um tipo totalmente diferente: Maria Pia, uma mulher ressentida e sem vaidade nenhuma, secretamente apaixonada por Eric. E Serrado, após interpretar o vilão Carlos Eduardo em Velho Chico, está perfeito na pele do concierge Malagueta, articulador do roubo, e forma uma divertida dupla com Mariana – uma vez que Maria Pia descobriu sobre o crime. Quem também merece elogios é Vanessa Giácomo, que mostra segurança em sua interpretação da policial Antônia.

Os bons números de Pega Pega são influenciados pela ótima entrega da reta final de sua antecessora Rock Story (cujo roteiro primou pela inteligência e sagacidade) e pelo bom momento que a Globo vive em sua grade atual. Porém, a despeito do sucesso, a novela de Cláudia Souto não empolga, desperdiça o talento de atores e se arrasta em situações desinteressantes. Por tudo isso, Pega Pega é uma prova evidente de que audiência e qualidade nem sempre andam juntas.


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