As novelas da Globo já haviam avançado bastante ao mostrar casais homossexuais sem preconceitos. No entanto, os casos recentes envolvendo a censura aos beijos gays em Vai na Fé (2022) e a mudança de rumo de Érico (Carmo Dalla Vecchia) em Amor Perfeito (2023) demostraram uma preocupante regressão.

A Viagem - Guilherme Fontes
Guilherme Fontes como Alexandre em A Viagem (Reprodução / Globo)

Após “amenizar” tramas envolvendo casais homossexuais, agora a emissora deve “evitar” outro tema que não agrada muito ao público mais conservador: o espiritismo. A temática, que já rendeu sucessos históricos, como A Viagem (1994), não deve voltar a ser explorada em novelas tão cedo.

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Fim das tramas espíritas

Espelho da Vida
Rafael Cardoso, Vitória Strada e João Vicente de Castro em Espelho da Vida (divulgação/Globo)

A Globo não pretende voltar a investir no filão do espiritismo nos próximos anos. Sua última produção no segmento foi Espelho da Vida (2018), da autora Elizabeth Jhin. A novelista, aliás, emplacou vários sucessos com a temática, como Escrito nas Estrelas (2010) e Além do Tempo (2015), mas não teve seu contrato renovado em 2020.

Além disso, nos últimos anos, informações sobre um possível remake ou filme de A Viagem circularam pela imprensa especializada. No entanto, qualquer projeto nesse sentido foi devidamente engavetado.

De acordo com o portal Notícias da TV, o fim das tramas espíritas acontece pelo mesmo motivo que levou a Globo a “amenizar” histórias envolvendo casais homossexuais. A emissora está buscando um público conservador, que se afastou do canal sobretudo durante o governo de Jair Bolsonaro.

Segundo a publicação, Amauri Soares, diretor geral dos Estúdios Globo, teria pedido aos autores que evitassem tramas espíritas. O profissional explicou que, em breve, o catolicismo deixará de ser a religião predominante no país e que, dentro de dez anos, os evangélicos serão maioria. Daí o aceno de Vai na Fé a este público – Sol (Sheron Menezzes), a mocinha, era evangélica.

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Conservadorismo

Regiane Alves (Clara) e Priscila Sztejnman (Helena) em Vai na Fé (Reprodução / Globo)
Regiane Alves (Clara) e Priscila Sztejnman (Helena) em Vai na Fé (Reprodução / Globo)

Por conta disso, Amauri Soares teria colocado, em reunião com os autores, o poder de compra deste público e a importância de conquistá-los. O diretor considera que Vai na Fé foi feliz ao despertar o interesse deste nicho e que apostar em uma trama espírita poderia destruir a conquista da trama de Rosane Svartman.

Tanto que, ainda de acordo com o NTV, uma novela de Thelma Guedes para a faixa das seis acabou vetada pela direção. A autora, que atualmente escreve Terra e Paixão com Walcyr Carrasco, havia apresentado uma trama espírita para a faixa das 18h.

Ao que tudo indica, a “regra” da Globo não é nova. Em entrevista ao site NaTelinha, em agosto deste ano, a autora Elizabeth Jhin falou sobre as dificuldades que vinha enfrentando para emplacar novos projetos.

“Fui uma das primeiras a entrar na lista dos demitidos, seguindo a nova política da Globo de contrato por obra. Acredito que houve uma mudança significativa de rumos na emissora e não havia mais espaço para meu tipo de trabalho”, disse.

“Não pretendo ter nenhum vínculo profissional com a Globo. Aliás, não pretendo mais escrever para televisão. Hoje, o escritor tem que enquadrar sua narrativa a uma série de regras ligadas a ideais políticos. São justos e necessários, mas discordo da maneira como são impostos”, explicou a novelista.

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Só no Viva

Escrito nas Estrelas - Nathalia Dill e Jayme Matarazzo
Nathalia Dill e Jayme Matarazzo nos bastidores de Escrito nas Estrelas (João Miguel Júnior / Globo)

Ou seja, o público não vai poder conferir tão cedo na tela da Globo produções parecidas com A Viagem, Alma Gêmea (2005), Amor Eterno Amor (2012) e Além do Tempo, tramas que falam de espiritismo e reencarnação.

Tanto que, até hoje, a Globo nunca reprisou uma novela de Elizabeth Jhin. Tramas como Escrito nas Estrelas e Além do Tempo sempre foram muito pedidas para voltar ao ar, mas o canal nunca promoveu uma reapresentação destas obras.

Ao que tudo indica, as tramas espíritas ficarão restritas ao Globoplay e ao Viva, que atualmente reexibe Escrito nas Estrelas.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor