Em seu primeiro trabalho como novelista exclusivo da Globo, Benedito Ruy Barbosa enfrentou uma série de obstáculos. O autor de clássicos como Pantanal (1990) e O Rei do Gado (1996) lutou bravamente para levar O Feijão e o Sonho (1976) até o fim, há 46 anos, em 9 de outubro de 1976. De incêndio à enfermidade do protagonista e desistência do diretor, o folhetim passou por várias dificuldades.

O Feijão e o Sonho - Cláudio Cavalcanti e Nívea Maria

Benedito (foto abaixo) já havia passado pela Globo em 1971, com Meu Pedacinho de Chão. Neste período, no entanto, ele estava a serviço da TV Cultura, que coproduziu a trama educativa. A contratação se deu no período em que a emissora adaptava clássicos da literatura brasileira, importantes para a consolidação do então recém-lançado horário das seis.

Incêndio na Globo

Benedito Ruy Barbosa

O Feijão e o Sonho era baseada no livro homônimo de Orígenes Lessa, publicado em 1938. Em foco, o poeta Campos Lara (Cláudio Cavalcanti), que sonhava viver de sua arte, e a esposa Maria Rosa (Nívea Maria), sempre preocupada com o futuro de sua família, especialmente no que colocar à mesa para o companheiro e os três filhos.

O desenrolar da narrativa era complexo. Campos Lara e Maria Rosa atravessaram quatro fases: a primeira em 1925, em Sorocaba, interior de São Paulo; a segunda de 1925 a 1927, no bairro do Bexiga, capital paulista; a terceira passada em 1937 em Capinzal, Santa Catarina; o epílogo novamente em São Paulo, entre os anos de 1946 e 1947.

Às vésperas da estreia, um incêndio de grandes proporções atingiu a sede da Globo no Rio de Janeiro, destruindo estúdios e toda a parte eletrônica – além de consumir boa parte do acervo. O jeito foi deslocar as gravações da novela para os estúdios da TV Educativa, além de externas em bairros como Jardim Botânico e cidades como Conservatória.

Os problemas passaram também pela saída do codiretor Walter Campos do projeto. Ele desistiu de seguir na equipe logo no início dos trabalhos.

Baixas no elenco

O Feijão e o Sonho - Lúcia Alves e Roberto Bonfim

Com as gravações em curso, outras duas baixas. Roberto Bonfim precisou sair em definitivo de O Feijão e o Sonho por conta de um problema de saúde. Ele, que a princípio fora cogitado para viver o filho de Campos Lara, Ivan – entregue a Élcio Romar –, respondia por Gomes, cunhado do poeta.

Cláudio Cavalcanti sofreu um infarto, que o deixou longe dos estúdios por um mês. Os contratempos atrasaram a novela. Quando a substituta Escrava Isaura (1976) começou a ser gravada, os trabalhos da trama de Benedito Ruy Barbosa ainda não estavam finalizados, algo que não havia acontecido no núcleo das 18h até então.

De criador para criador

O Feijão e o Sonho - Cláudio Cavalcanti e Nívea Maria

Apesar dos problemas, O Feijão e o Sonho foi um sucesso de público e de crítica. Orígenes Lessa também aprovou a versão televisiva de seu romance, conforme Benedito contou ao livro A Seguir Cenas do Próximo Capítulo, de André Bernardo e Cíntia Lopes:

“Por vezes ele me ligava para elogiar uma cena ou outra. Aí eu respondia: ‘Mas Orígenes, eu tiro tudo do livro’. Sabe o que ele me respondeu? ‘Tira nada, Ruy. Essa cena nem me passou pela cabeça!’”.

Ruy Barbosa afirmou ter sido muito feliz enquanto escrevia o folhetim por conta das semelhanças dos protagonistas com seus pais.

“Era como se tivesse sido escrita para contar a história dos meus próprios pais. Meu pai era o feijão, que saiu do Rio para ir atrás de seu sonho: casar com minha mãe, que morava em Minas Gerais”, relatou.

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Sebastião Uellington Pereira é apaixonado por novelas, trilhas sonoras e livros. Criador do Mofista, pesquisa sobre assuntos ligados à TV, musicas e comportamento do passado, numa busca incessante de deixar viva a memória cultural do nosso país. Escreve para o TV História desde 2020 Leia todos os textos do autor