Nome difícil, trocas e mais: os segredos de novela que terminava em 1999

Vivianne Pasmanter em Andando nas Nuvens

Vivianne Pasmanter em Andando nas Nuvens

Que tal relembrar algumas curiosidades e os bastidores de Andando nas Nuvens, novela das sete que terminava há exatos 23 anos, em 6 de novembro de 1999? A trama foi estrelada por nomes como Marco Nanini, Débora Bloch, Marcos Palmeira e Vivianne Pasmanter (foto abaixo), entre outros.

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O início

– No primeiro capítulo de Andando Nas Nuvens, exibido em 22 de março de 1999, uma pane no sistema de energia do hospital em que Otávio Montana (Marco Nanini) está internado o faz despertar após 18 anos dormindo! Otávio fora acometido por uma encefalite letárgica, conhecida como a doença do sono, desde a queda que sofreu, do alto de uma varanda, ao presenciar o assassinato de seu pai, Gregório Montana (Ary Coslov, diretor da trama, em participação especial).

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– A encefalite letárgica também foi tema do filme Tempo de Despertar (1990), no qual um jovem médico (Robin Williams) estudava o tratamento mais adequado para vítimas da moléstia (dentre elas, o personagem de Robert de Niro). O autor de Andando Nas Nuvens, Euclydes Marinho, conferiu o longa, por sugestão de Daniel Filho. E optou então pela abordagem da encefalite letárgica ao invés de um coma causado, como exemplo, por um acidente vascular encefálico (AVE) – o popular derrame cerebral – que deixaria sequelas em Otávio.

– O projeto estava engavetado na Globo desde 1997, quando fora cogitado para substituir Zazá, também às 19h, e recusado por José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni. Na época, Euclydes já contava com time de colaboradores escalados – Ângela Carneiro, Denise Bandeira e Maria Helena Nascimento (recentemente promovida ao horário das 21h).

– A ideia surgiu quando um amigo de Marinho entrou em coma. O autor começou a imaginar o que aconteceria com o camarada após a retomada de consciência, ao se deparar com as mudanças ocorridas em sua vida, alheias à sua vontade.

Nome difícil

– Na ocasião, Andando Nas Nuvens ainda atendia por A Última Noite do Século; provavelmente, uma referência ao fato de Otávio “dormir” em 1981, século XX, e despertar já na eminência do século XXI.

– Batizar o folhetim não foi tarefa fácil. Além de ‘Última Noite’, foram cogitados os títulos A Volta por Cima, Alto Astral, As Cinco Fases do Amor, Feliz por um Triz, Folhetim, Louco Varrido, Maluco Beleza, Na Crista da Onda e Quebra-Cabeça.

– Andando nas Nuvens foi a primeira novela de Euclydes Marinho como titular. Em Brilhante (1981), ele atuou apenas como colaborador de Gilberto Braga. Em Mico Preto (1990), dividiu os roteiros com Leonor Bassères e Marcílio Moraes. Sobre esta última, ele declarou ao Estado de São Paulo, na época da estreia de ‘Andando’:

“‘Mico Preto’ não era de ninguém; ninguém sabia o que era aquilo”.

– O desenvolvimento do enredo estava atrelado ao convite feito a Marco Nanini. Caso o ator – afastado das novelas desde Pedra Sobre Pedra (1992) – recusasse, Euclydes optaria por um “plano B”: Otávio Montana morreria no capítulo 15 e a trama se debruçaria sobre o famigerado “quem matou?”.

– Nestes sete anos, Nanini se manteve no vídeo em projetos menores, como episódios de A Comédia da Vida Privada (1995) e a minissérie O Auto da Compadecida, exibida em janeiro de 1999. Da substituta de ‘Compadecida’, Chiquinha Gonzaga, a produção de Andando Nas Nuvens recrutou Caio Blat (Thiago), Carla Regina (Ana Paula), Marcello Novaes (Raul), Susana Vieira (Gonçala) e Taumaturgo Ferreira (Átila) – todos com apenas dias de descanso entre o término de uma e o início de outra. Marcos Palmeira também emendou, praticamente, o tímido Alexandre Toledo, de Torre de Babel (finalizada em janeiro), e o atrapalhado Chico Mota.

Mudanças no elenco

– Isadora Ribeiro chegou a gravar como Oneide, esposa de Alex (Otávio Augusto), amigo de Otávio que o acolhe após o despertar. A atriz, contudo, acabou substituída por Isabela Garcia – numa das personagens mais inexpressivas de sua carreira.

– Após despertar, Otávio se depara com toda sorte de dispositivos dos quais nunca tinha sequer ouvido falar: videocassete, CD, celular, computador, notebook, internet… E também com as três filhas, já crescidas. A primogênita Júlia (Débora Bloch) era uma intrépida jornalista, com mais idade do que o pai tinha – e ainda acreditava ter – quando despencou da varanda. Beth (Vivianne Pasmanter) vivia no encalço de um bom partido após o casamento falido com Nicolau (Carlos Evelyn, irmão de Deborah Evelyn e então cunhado do diretor Dennis Carvalho). Já Celi (Mariana Ximenes) demonstrava vocação para noviça.

– Malu Mader foi o primeiro nome pensado para Júlia Montana, formando par com Marcos Palmeira – o que ocorreria anos depois, em Celebridade (2003). A atriz, contudo, acabou remanejada para Força de um Desejo, produção das 18h. Em 1997, Claudia Raia foi cotada para o papel.

– Diretor-geral de criação da Globo na época, Daniel Filho exigiu a presença de Fernanda Souza no elenco. A atriz, que estava no auge da popularidade graças a Mili, sua personagem em Chiquititas (1997), do SBT, atendeu ao chamado, respondendo por Joana, a retraída filha da extrovertida Janete (Eliane Giardini), irmã de Chico Mota.

– Mariana Ximenes também veio do SBT. Mais precisamente de Fascinação, exibida no ano anterior, na qual também se envolvia com o personagem de Caio Blat. Os tipos, contudo, foram invertidos: em ‘Andando’, a noviça Celi foge das investidas de Thiago, que, decidido a perder a virgindade com seu primeiro amor, desperta a desconfiança do pai sobre sua sexualidade. Em Fascinação, era Emília quem corria atrás de Gustavo.

– No primeiro tratamento da sinopse, Janete era chamada Anair. E Chico Mota atendia por Chico Vargas. ‘Vargas’ passou a ser o nome do falecido marido de Janete.

Referências

– Numa homenagem ao clássico de 1978, dirigido por Daniel Filho, a academia de dança de Janete foi batizada Dancin’ Days. Para a personagem, Eliane Giardini fez aulas com Jayme Arôxa.

– Outras “referências novelísticas” marcaram as locações. O bairro da Urca, famoso por conta de A Gata Comeu (1985), abrigava boa parte das gravações. A casa no Cosme Velho que servia de sobrado para a família Montana também hospedou o casal Zuleika e Rômulo (Eva Wilma e Cláudio Corrêa e Castro), de História de Amor (1995). Também de ‘História’, a construção que serviu de locação para a clínica do Dr. Carlos Moretti (José Mayer), vista também em Roda de Fogo (1986), Zazá (1997), Brida (1998) e, posteriormente, Como Uma Onda (2004). Nos cenários, fotos de Vivianne Pasmanter como Laura, de Por Amor (1997), então o seu último trabalho.

– O Rio de Janeiro foi reverenciado a todo momento. Segundo o diretor Dennis Carvalho, a novela possuía um clima “bossa nova”, que resgatava o charme da Cidade Maravilhosa.

– Paisagens cariocas davam o tom da abertura, que trazia cartões postais, como o Pão de Açúcar, em movimento. Lembrava, de leve, a vinheta de Estúpido Cupido (1976).

– O tom da novela remetia aos sitcons de sucesso da TV americana. Marinho também admitiu a inspiração em comédias românticas dos anos 1940 e 1950.

– Outra referência: o colunista social do Correio Carioca, Jacques Delon (Antônio Pedro), tomou como base o perfil do folclórico Ibrahim Sued, que ocupava a mesma função na redação do jornal O Globo.

– Cerca de R$ 90 mil foram gastos em cada capítulo da produção.

– O lançamento contou com um making-of, exibido pelo canal Multishow, da Globosat, no domingo anterior à estreia (21), 19h.

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Polêmicas

– Cláudio Marzo emprestou seu charme ao vilão Antônio San Marino, responsável pela morte de Gregório. Empresário do ramo da comunicação – desde que assumiu a redação do jornal da família Montana, Correio Carioca -, San Marino almejava seguir carreira na política, contando com o auxílio do marqueteiro Bob Lacerda (Felipe Camargo).

– Enquanto Cláudio Marzo revivia o par de Cambalacho (1986) e Bambolê (1987) com Susana Vieira, Felipe Camargo reeditava o romance com Lúcia Veríssimo, aqui como a terapeuta Flora, já visto em Mandala (1987).

– Entre as polêmicas de bastidores, destaque para a campanha antitabagismo, liderada por Daniel Filho, em meio ao empenho do Ministério da Saúde em advertir o consumidor sobre os malefícios do cigarro. Chico Mota, fumante inveterado, enfrenta diversas situações, hilárias, na tentativa de largar o vício. Na mesma época, Nana, personagem de Nívea Maria em Suave Veneno, às 20h, também deixou o tabagismo de lado.

– Ainda, críticas – por parte da imprensa especializada em TV – ao núcleo jovem. Diferente de outras produções, nas quais os adolescentes estavam sempre em ebulição, Celi, Joana e Thiago prezavam pela castidade. Surgiu então Valéria (Isabel Guéron), que “desvirginou” o rapaz. Em contrapartida, Mariana Ximenes, Fernanda Souza e Caio Blat ocupavam todas as revistas destinadas ao público infanto-juvenil, tamanho sucesso!

– Susana Vieira queixou-se, educadamente, do perfil de Gonçala.

“O público reclama que apareço pouco. É um desperdício para mim e para a TV. Fico muito parada, gravo pouco. Estou acostumada a ralar mais. Mas sou obediente ao autor. Estou no barco e vou com ele”, disparou em entrevista ao jornal O Globo, de 23 de maio de 1999.

– De fato, Gonçala San Marino era um pouquinho “de menos” para quem acabara de interpretar Branca Letícia de Barros Mota, em Por Amor…

– Otávio Augusto também se aborreceu com Alex, conforme relatado pelo próprio, também ao jornal O Globo (26 de setembro de 1999):

“Ele é um quinto coadjuvante. Nesta trama, os atores superaram os personagens e a própria história”.

– Segundo Otávio, o ciúme da mulher Oneide prejudicaria o casamento de Alex. A dona de casa então se envolveria com Tião Alemão (Tony Tornado), dono do bar Berlim, vizinho à redação do Correio Carioca. Nada disso aconteceu.

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Personagens cresceram

– Já Judite (Nicette Bruno) e Lúcia Helena (Júlia Lemmertz) cresceram – e muito! – ao longo da narrativa. A mãe e a ex-mulher de Chico Mota viviam às turras, até o envolvimento do jornalista com Júlia. Unidas, elas fizeram um verdadeiro inferno na vida da primogênita dos Montana. Obcecada por intervenções cirúrgicas, Lúcia Helena chegou a operar os seios para deixá-los maiores do que os de sua rival. E também forçou a filha, a pré-adolescente Constância (Gabriela Martins), a aporrinhar a madrasta.

– Júlia Lemmertz atuou grávida durante boa parte da trama. Já na reta final, a atriz passou a usar de objetos de cena para esconder a barriga. A direção também passou a privilegiar closes e enquadramentos que escondessem a gestação.

– A produção apostou em participações especiais. Atores iam e vinham, conforme as necessidades do enredo, movimentando a narrativa. Neste contexto, destaque para Bruna Lombardi como Frida, cientista que pesquisava a fórmula do amor, entrevistada por Chico e Júlia; Milton Gonçalves como um delegado; Regina Maria Dourado como Ieda, mãe de Raul; e Zezé Polessa como Bonitona, motoqueira que ajuda Otávio a fugir da clínica psiquiátrica.

– Andando Nas Nuvens demorou a decolar! A novela se aproximou de índices considerados alarmantes pela Globo, na ocasião – abaixo dos 30 pontos. Segundo publicações da época, Marinho chegou a “trocar ideias” a respeito da condução com autores tarimbados, como Gilberto Braga, Manoel Carlos, Ricardo Linhares, Silvio de Abreu e Walther Negrão.

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Segunda fase

– A novela já estava estabilizada, indo de 35 a 40 pontos, quando entrou em sua “segunda fase”. Foi quando San Marino conseguiu dispensar Gonçala, deixando-a sem um tostão. Também enviou Otávio para uma clínica psiquiátrica; este tiro, porém, saiu pela culatra já que o “desmemoriado” se lembrou do que acontecera na noite da morte de seu pai, após tomar outro choque elétrico.

– Neste momento, ‘Andando’ apostou numa narrativa mais folhetinesca. Beth casou-se com o primogênito de San Marino, Arnaldinho (Márcio Garcia), alegando esperar um filho dele – na verdade, herdeiro de Raul. Já Júlia, cuja semelhança com a mãe, Eva, impressionava, tornou-se alvo das investidas de San Marino, seu verdadeiro pai – também genitor de Joana, a quem Janete pede auxílio após perder a academia, por conta das dívidas do namorado Átila, não podendo mais sustentar a filha.

– Com a volta de Eva, vivendo sob a identidade da Condessa Astrid Von Brandenburg, estabeleceu-se um imbróglio: um retrato da personagem fora pintado tomando por base os traços de Débora Bloch, já que Júlia era muito parecida com a mãe. Logo, era preciso encontrar uma atriz que guardasse as devidas semelhanças com Bloch. Renata Sorrah fora escolhida para o papel. A mudança física de Eva foi justificada com uma cirurgia plástica, na intenção de fugir de San Marino. Testemunha da morte de Gregório, Eva deixou o país com o dinheiro do sogro, temendo ser o próximo alvo do vilão, seu amante.

– Nos capítulos finais, Ary Coslov voltou à cena, então como um garçom. Ao vê-lo, Otávio exclama: “Que garçom estranho, parece meu pai!”. O caco, inserido pelo ator, acabou mantido na edição final. Dennis Carvalho também participou da trama, em off: era voz do comissário que anunciou a chegada de Júlia ao Brasil, no primeiro capítulo.

– Karla Karenina, reverenciada como Dita, a empregada de Silvana (Lilia Cabral) em A Força do Querer (2017), participou de Andando Nas Nuvens como Iracema, arrumadeira na casa dos San Marino. Karla já era conhecida do público, por conta de sua presença na Escolinha do Professor Raimundo (1990).

– O Casseta & Planeta, Urgente! transformou Andando Nas Nuvens em ‘Fernando Nas Nuvens’, uma referência ao então presidente Fernando Henrique Cardoso, parodiado por Hubert. FHC surgiu na mesma situação de Otávio Montana: despertando de um sono profundo e se deparando com o Brasil que não conhecia.

– A trilha sonora popularizou o grupo Fat Family, responsável pelo tema de abertura, ‘Gulosa’. Para a vinheta, os integrantes regravaram a canção, substituindo o trecho “quero ser a dona do seu prazer” por “quero andar nas nuvens com você”. Também Maurício Manieri, alçado ao estrelato com ‘Minha menina’, tema de Beth e das vinhetas de intervalo.

– Outro êxito foi a mochila de couro transpassada que Júlia usava para transportar seu notebook. A peça, da Zoomp, custava uma pequena fortuna: R$ 259,00.

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