Interpretar gêmeos não é uma tarefa fácil, ainda que a presença de irmãos idênticos tenha virado um clichê folhetinesco. Já foram vários ao longo de mais de cinquenta anos de novelas. Tony Ramos em Baila Comigo, Eva Wilma na primeira versão de Mulheres de Areia, Glória Pires no remake de Mulheres de Areia, Reynaldo Gianecchini em Da Cor do Pecado, Murilo Benício em O Clone, Alessandra Negrini em Paraíso Tropical, Mateus Solano em Viver a Vida, Cauã Reymond em Dois Irmãos, enfim, vários atores já viveram essa experiência na teledramaturgia e todos se saíram muito bem. A missão agora é de Nathalia Dill, que entrou para esse seleto time e está totalmente à vontade em Rock Story.

Na pele das gêmeas Júlia e Lorena, a atriz está podendo expor a sua versatilidade diariamente, convencendo tanto na pele da gêmea boa quanto no corpo da gêmea má. São dois perfis bem diferentes, embora iguais fisicamente, fazendo jus aos outros exemplos já abordados nas novelas.

Afinal, qual a graça em ter gêmeos iguais em tudo? Nenhuma. A não ser que eles nem se conheçam, como foi o caso de Baila Comigo, em um ótimo recurso de Manoel Carlos, que também explorou com competência as nuances de Jorge e Miguel em Viver a Vida, evitando qualquer traço de vilania em um e excesso de bondade em outro. Mas a autora Maria Helena Nascimento optou pelo clichê mesmo.

E vem acertando na condução até agora. Seu grande erro foi ter demorado tanto em trazer Lorena para o Brasil. A vilã ficou cinco meses fora do país (desde que a novela estreou, em novembro de 2016), aparecendo apenas para falar com Júlia pelo computador ou telefone. O recurso cansou e a enrolação ficou evidente.

Mas, apesar desse problema, Nathalia já conseguia brilhar diferenciando as gêmeas com competência. Estava claro que a intérprete se destacaria ainda mais assim que a gêmea traficante, responsável pela prisão injusta da irmã, chegasse ao Brasil. E foi exatamente isso que aconteceu.

Lorena foi visitar a irmã na cadeia assim que chegou e o primeiro momento das duas juntas foi ótimo, valorizando os diferentes trejeitos e expressões faciais. A atriz dominou a cena muito bem e era apenas o início de um exercício dramático ainda mais pesado que viria pela frente. Obviamente, sua carga de trabalho duplicou, pois a irmã má mal aparecia enquanto estava fora e agora aparece tanto quanto a mocinha.

Todas as sequências da gêmea mau-caráter merecem elogios, principalmente pela diferença na atuação de Nathalia. Basta observar sua postura diante dos instantes em que Lorena está com Gui, enfrenta Diana, dissimula para Alex (Caio Paduan) e ainda ameaça os comparsas Romildo (Paulo Verlins) e William (Leandro Daniel). É outra atriz.

Também não há como negar que Lorena é um perfil muito mais interessante que Júlia. A protagonista iniciou uma atrativa trajetória, mas começou a cansar a sua procura incessante por Alex e seus constantes ataques de sofrimento. A mocinha passou a falar só desse assunto, por mais ‘compreensível’ que fosse. Suas idas e vindas com Gui também cansaram. Porém, a intérprete cumpriu bem toda a missão do papel e convenceu em todos os instantes mais dramáticos, tendo ainda uma boa química com Vladimir Brichta.

Mas ela cresceu muito com a entrada definitiva de Lorena, isso é inegável. A ironia constante da vilã é um atrativo e tanto, assim como a sua habilidade para manipular todos ao seu redor, sempre bancando a vítima. Não por acaso conseguia enganar Gui, Júlia, Alex e até Romildo. A única que nunca a engoliu foi Diana, proporcionando bons embates.

Nathalia e Alinne Moraes se destacavam quando Diana e Júlia se encaravam, mas estão ainda melhores nos momentos de enfrentamento da ex de Gui com a cunhada do roqueiro. Afinal, a empresária é um tipo arrogante que não abaixa a cabeça para ninguém e a bandida está acostumada a ameaçar quem atravessa seu caminho. E vale mencionar a primorosa sequência em que Júlia e Lorena se enfrentaram, após a mocinha ter desmascarado a irmã e descoberto que ela foi a responsável pela ruína da sua vida.

A direção de Maria de Médicis e Dennis Carvalho foi brilhante, valorizando os efeitos especiais na hora da briga física, com direito a tapas e empurrões. Parecia mesmo duas pessoas ali e não a mesma atriz. O trabalho da dublê de corpo também merece elogios, além de, claro, o grande desempenho da Nathalia.

Após um elogiado trabalho em Liberdade, Liberdade (2016), onde deu show vivendo a vilã cômica Branca, Nathalia Dill praticamente emendou em Rock Story e novamente se destaca, agora vivendo mocinha e vilã ao mesmo tempo. Aliás, a atriz vive a sua terceira vilã na atual novela das sete (Débora em Malhação foi sua estreia na TV) e sua quarta mocinha – depois de Santinha em Paraíso, Viviane em Escrito nas Estrelas e Laura em Alto Astral. Ou seja, pode-se constatar que a intérprete não tem do que reclamar. São vários trabalhos de destaque e bem variados, sem citar os coadjuvantes que também puderam contar com seu talento.

Rock Story vem se mostrando uma novela das sete merecedora de muitos elogios e um deles é justamente o desempenho de Nathalia na pele de gêmeas. Ela está fazendo jus ao difícil trabalho de viver duas pessoas tão diferentes ao mesmo tempo, honrando a confiança da autora. É de se lamentar bastante a morte precoce da vilã, logo agora que acabou de chegar ao Brasil. O público e a atriz serão os maiores perdedores.

SÉRGIO SANTOS é apaixonado por televisão e está sempre de olho nos detalhes, como pode ser visto em seu blog. Contatos podem ser feitos pelo Twitter ou pelo Facebook. Ocupa este espaço às terças e quintas


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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor