Não aprendeu a lição: autor repete erro de outra novela em Mar do Sertão

Sérgio Guizé em Mar do Sertão

Sérgio Guizé em Mar do Sertão

A nova novela das seis está há muito pouco tempo no ar. Menos de três semanas. Mas o tanto de conflito que já aconteceu impressiona. Só que isso não é um elogio. Agilidade não pode ser confundida com correria e o autor de Mar do Sertão não está sabendo diferenciar uma coisa da outra. Quanto mais o tempo passa na trama, mais cenas são ignoradas e mais incômodo provoca no telespectador. Em menos de cinco capítulos já foram mais de três passagens de tempo e muitos cortes.

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O curioso é que a primeira semana de história foi tranquila e com poucos acontecimentos relevantes. Tudo parecia seguir em um ritmo moderado. No entanto, no dia do acidente sofrido por Zé Paulino (Sérgio Guizé) e Tertulinho (Renato Góes), que marcou a primeira virada do enredo, o folhetim ganhou um ritmo que prejudicou a narrativa.

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Há um atropelo de situações que não tem como o público compreender. É tanta pressa que muitas vezes quem está assistindo se perde. E seria algo compreensível se a produção fosse curta, mas tem a duração normal de uma novela e só chega ao fim em março de 2023.

Sequências vitais

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Todo o impacto do acidente sofrido por mocinho e vilão foi diluído pelo descarte de sequências vitais, como Zé Paulino tentando se salvar no mar e não conseguindo, Tertulinho chegando em casa e contando mais alguma mentira para os pais e Candoca (Isadora Cruz) recebendo o choque da notícia do desaparecimento de seu grande amor, enfim.

Já houve uma passagem de tempo de sete dias e com a exibição de uma cena de um guindaste retirando o carro das águas. Ou seja, nem a tensão dos personagens com a expectativa de encontrarem o protagonista vivo foi mostrada. Cenas que renderiam ótimas atuações para o elenco.

E era só o começo da correria desenfreada. Logo após o velório do mocinho, já houve o desenvolvimento de uma aproximação entre Tertulinho e Candoca. A mocinha nem teve tempo de ter um luto. Para culminar, sua mãe, vivida pela grande Cyria Coentro, descobriu que Zé Paulino estava vivo, mas morreu antes de contar para a filha. Tudo muito rápido.

Atropelamento

A mocinha nem conseguiu chorar pela morte de sua ‘mainha’. Isso porque as duas melhores amigas já estavam empurrando o vilão para Candoca não criar o filho sozinha e sem dinheiro. Ah sim, a personagem engravidou, mas é tudo tão atropelado que um telespectador mais desatento nem perceberia.

Tertulinho acabou descobrindo que Zé Paulino estava vivo e já providenciou uma identidade falsa para se passar por primo do rival e assim ser credenciado como acompanhante no hospital. Hospital? Sim, porque o senhor que ajudou o mocinho o levou para ser internado em uma clínica e encontrou o vilão por acaso. Tudo em um piscar de olhos.

Tertulinho também soube que Candoca venderia sua casa para investir o dinheiro em estudos e se tornar uma médica. Só que a mocinha não sabia que a mãe já tinha vendido a casa para este objetivo. Soube por Vespertino (Thardelly Lima), agiota da cidade. O agiota, por sua vez, aceitou o carro do vilão para devolver a casa para Candoca, só que antes mandou um capanga (Caio Blat) furtar o dinheiro que tinha dado para a falecida. Tudo em uma cena de menos de cinco minutos.

Um ano depois…

Mas o telespectador ainda não tinha ideia que mais uma leva de atropelos estaria por vir. Na última segunda-feira (05/09), Tertulinho tentou matar Zé Paulino e desligou os aparelhos que o mantinham vivo. Só que os médicos conseguiram salvá-lo. O vilão não perdeu tempo e foi logo pedir Candoca em casamento. A mocinha não aceitou.

Só que houve outra passagem de tempo. Desta vez de um ano. E logo com a exibição da cena do casamento e tudo diante dos olhos de Zé Paulino, que observou a união da porta da igreja – com um visual maltratado e usando uma bengala. Como o mocinho conseguiu sair do hospital? Para onde foi? Com quem ficou? E Candoca? Quando decidiu se casar? Como foi o nascimento de seu filho com Zé Paulino? Tertulinho teve uma briga séria com o pai e saiu de casa antes da passagem de tempo. Foi morar em que lugar? Enfim, nada disso o autor achou relevante mostrar.

Ainda é preciso mencionar outra situação que decepcionou: o encontro do mocinho com seu pai. Zé simplesmente apareceu na casa de Daomé (Wilson Rabelo) e o pai agiu como se tivesse visto o filho outro dia. Não se emocionou em vê-lo vivo e nem um mísero abraço teve. Zé também pouco se lixou com o momento.

Só disse que tinha perdido parte da memória, se indignou com o casamento de Candoca com Tertulinho e encerrou dizendo que se vingaria do coronel que demitiu seu pai. Não houve qualquer catarse. E o que significa catarse? O sentimento de alívio ou forte emoção que o telespectador sente após uma cena dramática, uma virada, ou quando o roteiro atinge seu ápice.

Dez anos depois…

Já no capítulo desta terça (06/09) ocorreu a passagem de tempo definitiva de dez anos. Zé Paulino voltou milionário e com sede de vingança. Como ficou rico? O autor não achou relevante contar. Ah, o pai que o protagonista tanto amava morreu e o telespectador nem viu. E Zé ficou mais de dez anos sem visitá-lo. Candoca e Tertulinho já descobriram que o mocinho está vivo no capítulo desta quarta (07) e Zé soube que tem um filho. Tudo em menos de cinco minutos.

Não houve catarse, não houve impacto, não houve nada. Uma cena jogada sem qualquer cuidado. O vácuo das cenas que não foram sequer gravadas dificilmente será preenchido e todas farão muita falta. Não eram situações irrelevantes para o roteiro. Todas enriqueceriam a obra.

Não é a primeira vez

É importante lembrar que Mário Teixeira cometeu o mesmo erro crasso em O Tempo Não Para, novela das sete exibida em 2018, quando correu tanto com a história que transformou o folhetim – que teve um início delicioso – em algo sem rumo e cansativo. Foram muitas críticas na época sobre a perda de qualidade da trama. Não é possível que não tenha aprendido nada.

Mar do Sertão é uma novela tradicional, onde o clichê se encontra em todas as situações, principalmente no triângulo central. A audiência está ótima. O enredo se mostrou promissor. O elenco está bem escalado e os personagens são atrativos. Só que a pressa de Mário Teixeira destoa em meio a tantos acertos.

Não dá para entender o objetivo do escritor. Do que adianta correr tanto para depois criar uma barriga (período de enrolação presente em quase todos os folhetins) imensa ao longo dos meses, afastando o público? Resta torcer para que a correria não tenha provocado estragos maiores. Porque o início da história já foi muito prejudicado.

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