Morre Gilberto Braga, o que melhor retratou a elite com ironia em novelas

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Morreu nesta terça (26), aos 75 anos, o novelista Gilberto Braga. Ele sofria de Alzheimer e estava internado no Hospital Copa Star, no Rio de Janeiro, onde tratava uma infecção sistêmica a partir de perfuração de esôfago.

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Gilberto Tumscitz adotou o sobrenome Braga, de sua mãe. Nascido no Rio de Janeiro, em 1945, completaria 76 anos na próxima segunda-feira, 1º de novembro.

Era casado há 48 anos com o decorador Edgar Moura Brasil. Antes de ingressar na televisão, Gilberto foi professor de francês e crítico de teatro e cinema na imprensa carioca.

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Em 1973, Gilberto estreou na Globo roteirizando Casos Especiais. Sua primeira experiência em telenovela foi dividindo com Lauro César Muniz a autoria de Corrida do Ouro, em 1974. No ano seguinte, foi colaborador de Janete Clair na novela Bravo!, enquanto duas adaptações suas, de obras literárias, eram exibidas no horário das seis: Helena, de Machado de Assis, e Senhora, de José de Alencar.

Entre 1976 e 1977, escreveu outras adaptações que já mostravam o domínio do jovem autor ao roteirizar telenovelas: Escrava Isaura e Dona Xepa, dois grandes sucessos daquela época. Foi a deixa para Gilberto estrear no horário nobre em grande estilo: em 1978 escreveu Dancin’ Days, que virou mania nacional e consagrou o novelista. Um sucesso arrebatador.

Seguiram-se outros títulos (Água Viva, Brilhante, Louco Amor e Corpo a Corpo), até que, em 1988, Gilberto Braga mobilizou o país com Vale Tudo (escrita com a parceria de Aguinaldo Silva e Leonor Bassères), um dos maiores êxitos da TV brasileira, discutindo corrupção e o “jeitinho brasileiro”. De quebra, “Quem matou Odete Roitman?”, pergunta que parou o país no último capítulo. É considerada por muitos especialistas “a melhor novela brasileira de todos os tempos”.

Apesar de lembrar vagamente da época em que ia ao ar a novela Senhora (em 1975 eu tinha seis anos), meu primeiro contato com Gilberto foi na reprise de Escrava Isaura em 1979. Lembro quando passou Dancin´Days, Água Viva e Brilhante (entre 1978 e 1982), mas meus pais não permitiam o horário nobre para crianças. Pude acompanhar Água Viva em 1984, na reprise vespertina.

Em 1983, curti Louco Amor, um sucesso popular – do bordão “E, e eu não sei, Gonçalo?”, de José Lewgoy. Curioso que, apesar do sucesso de audiência, Gilberto não gostava dessa novela, já que ela não passava de um emaranhado folhetinesco muito próximo dos dramalhões mexicanos.

Corpo a Corpo – pouco lembrada – deu o que falar na época em que foi exibida (1984-1985): tinha o diabo personalizado na figura do ator Flávio Galvão e uma discussão sobre racismo nunca antes vista em uma telenovela. Essa novela, Gilberto gostava!

Anos Dourados, a minissérie de 1986, foi um sucesso. Não tinha como não se encantar com o “puppy love” entre Marcos e Lurdinha (Felipe Camargo e Malu Mader). E, de quebra, Dona Celeste, a megera visceral interpretada por Yara Amaral. Com O Primo Basílio (1988), Gilberto retomava a adaptação de um clássico da literatura (de Eça de Queiroz). E tivemos Marília Pêra em um de seus melhores papeis na TV: a sinistra empregada Juliana.

O Dono do Mundo (1991) decepcionou os que esperavam uma Vale Tudo 2. O público não comprou a heroína tonta Márcia (Malu Mader), que se deixou seduzir pelo sacana Felipe Barreto (Antônio Fagundes) em plena noite de núpcias com seu noivo.

Anos Rebeldes (1992) é outra daquelas obras emblemáticas de nossa Teledramaturgia. Retratou de maneira contundente os “anos de chumbo” da Ditadura Militar. Como pano de fundo, a história de amor de Maria Lúcia (Malu Mader) e João Alfredo (Cássio Gabus Mendes).

Pátria Minha (1994) fechava a trilogia das novelas que propunham discutir mazelas da sociedade brasileira (com Vale Tudo e O Dono do Mundo). Mas, por mais que o autor tenha tentado levantar questões sociais, os problemas conjugais reais entre Vera Fischer e Felipe Camargo (do elenco) chamaram mais a atenção do público do que a novela em si.

Labirinto (minissérie de 1998) trouxe um Gilberto policial. Em Força de um Desejo (1999-2000, escrita com Alcides Nogueira e Sérgio Marques), ele estava de volta em uma trama de época do horário das seis. Celebridade (2003-2004) ficou marcada pela pérfida dupla Cachorra e Michê (Laura de Cláudia Abreu e Marcos de Márcio Garcia) e Paraíso Tropical (2007, escrita com Ricardo Linhares) pelo irresistível casal Bebel (Camila Pitanga) e Olavo (Wagner Moura).

Seguiram-se Insensato Coração (2011, com Ricardo Linhares) e Babilônia (2015, com Ricardo Linhares e João Ximenes Braga). Esta última, marcada pela rejeição do público.

Gilberto Braga será para sempre lembrado pelas abordagens policiais (foram vários “quem matou?”) e pela retratação pitoresca da elite carioca. Foi o autor que melhor retratou o high society, com charme, glamour e sofisticação, sempre com apelo folhetinesco, imprescindível a toda telenovela, e com uma visão irônica da aristocracia.

Gilberto era o nosso Balzac. Tia Celina e Odete Roitman concordariam.

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