André Santana

Elas por Elas fez um enorme sucesso na Globo em 1982, quando foi exibida na faixa das 19 horas. Portanto, a emissora esperava que este êxito se repetisse no remake, que está no ar no horário das 18h. Porém, um mês depois da estreia, o folhetim ainda não disse a que veio.

Deborah Secco em Elas por Elas
Deborah Secco em Elas por Elas (Reprodução / Globo)

O fiasco da versão de Thereza Falcão e Alessandro Marson da obra de Cassiano Gabus Mendes pode estar ligado ao fato de sua trama soar bastante anacrônica. Os novos autores se esforçaram para atualizar a história, mas não alcançaram este objetivo na trama que envolve Lara (Deborah Secco) e Taís (Késia).

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Trama atualizada

Alessandro Marson e Thereza Falcão
Thereza Falcão e Alessandro Marson, autores do remake de Elas por Elas (Reprodução / Gshow)

Mais de 40 anos separam a primeira da segunda versão de Elas por Elas. Por conta disso, os autores Alessandro Marson e Thereza Falcão não mediram esforços para atualizar a trama de Cassiano Gabus Mendes para adequá-la aos dias de hoje. E, no geral, a dupla foi bem-sucedida na missão.

As sete protagonistas do remake de Elas por Elas são contemporâneas, têm carreiras e outras preocupações que não apenas romances, família e maridos. Além disso, houve o cuidado quanto à diversidade, com maior presença de negros e uma mulher trans entre as estrelas principais.

Algumas histórias que seriam impossíveis hoje em dia também foram modificadas. Os novos autores entenderam que não seria possível acontecer uma troca de bebês de sexo diferente na maternidade e trataram de mexer nessa história envolvendo os filhos de Helena (Isabel Teixeira) e Adriana (Thalita Carauta).

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História datada

Deborah Secco e Késia Estácio em Elas por Elas
Deborah Secco e Késia Estácio em Elas por Elas (Reprodução / Globo)

Porém, mesmo com o esforço da dupla, uma trama de Elas por Elas segue bastante datada e não dialoga com os dias de hoje. Trata-se da relação entre Lara e Taís, duas amigas que passam por uma situação bastante complicada.

Taís foi enganada por Átila (Sérgio Guizé), o marido de Lara. Sem saber que se tratava do marido da amiga, já que ela acreditava que o rapaz era solteiro e se chamava Herbert, a modelo teve um caso com o advogado. Taís só descobriu a verdade sobre o namorado quando deu de cara com ele na festa organizada por Lara.

Depois disso, Átila morreu e Lara descobriu que ele tinha uma amante. Agora, a advogada investiga para descobrir quem é a tal Patinha, que se encontrava com seu marido num apartamento. Já Taís, desesperada com a situação, faz de tudo para que Lara não saiba que é ela a Patinha.

Lara nutre um afeto verdadeiro por Taís e nem sonha que a amiga era a amante de seu marido. Já Taís também gosta de Lara e se sente culpada pelo que aconteceu. Por isso, a modelo teme que a amiga descubra a verdade e não seja capaz de perdoá-la. Um problemão!

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Não faz sentido

Elas Por Elas - Sandra Bréa
Sandra Bréa em Elas por Elas – Divulgação / Globo

O problema do enredo envolvendo Lara e Taís é que ele fazia mais sentido nos anos 1980. Na primeira versão de Elas por Elas, Márcia (Eva Wilma) e Wanda (Sandra Bréa) passavam pela mesma situação e a irmã de Mário Fofoca (Luis Gustavo) fazia de tudo para não ser descoberta.

O temor de Wanda era mais crível há 40 anos. Afinal, mesmo que as duas mulheres tenham sido enganadas por Átila (vivido originalmente por Mauro Mendonça), nos anos 1980 era mais “aceitável” a traição masculina. Era normalizado a disputa de duas mulheres por um homem. Com isso, a culpa de uma traição fatalmente caía sobre as mulheres envolvidas.

Já em 2023, houve um avanço considerável na relação entre as mulheres. Tanto Lara quanto Taís parecem mulheres de seu tempo e ambas têm total capacidade de compreender muito bem que o grande culpado pelo que aconteceu com elas é Átila. Ambas foram enganadas por ele.

Sendo assim, uma boa conversa entre Lara e Taís resolveria essa questão rapidamente. Lara até poderia ficar chocada inicialmente, mas tudo passaria e a amizade falaria mais alto. O esforço que Taís faz para manter seu namoro com Átila em segredo, neste contexto, não faz sentido.

Não é a primeira vez

Tony Ramos e Irene Ravache em Guerra dos Sexos
Tony Ramos e Irene Ravache em Guerra dos Sexos (Reprodução / Globo)

Não é a primeira vez que um remake da Globo naufraga por conta da história anacrônica. A segunda versão de Guerra dos Sexos (2012) também foi um fiasco ao se mostrar como uma história completamente datada.

Silvio de Abreu foi o autor das duas versões, e o novelista não se deu ao trabalho de atualizar a novela, já que acreditava que a “guerra dos sexos” era universal. Ledo engano. No ar, a nova versão de Guerra dos Sexos não fazia o menor sentido ao expor conflitos já totalmente superados.

Nos anos 1980, a mulher lutava para se equiparar ao homem no mercado de trabalho. Já na década de 2010, esta luta continuava, mas com novos contornos. Com isso, a segunda versão de Guerra dos Sexos estava fora de seu tempo. Este descompasso afugentou o público.

Isso pode estar acontecendo também em Elas por Elas, ao menos na trama envolvendo Lara e Taís. O conflito das duas amigas é a cara dos anos 1980, mas parece bastante inadequado em 2023. Os novos autores deviam encerrar logo este entrecho e criar tramas novas para as personagens de Késia e Deborah Secco.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor