Malhação – Viva a Diferença vem fazendo um justo sucesso de público e crítica. As razões para tamanho êxito são muitas e uma delas é a escolha certeira do time de protagonistas. Tanto na escalação das atrizes, quanto na construção das cinco personagens. O autor Cao Hamburger e o diretor Paulo Silvestrini foram muito felizes. Entretanto, embora todas as meninas sejam apaixonantes, recheadas de qualidades e defeitos, há uma que sempre se destacou em virtude da sua “diferença”, que acaba sendo mais visível: a fofa Benê.

Daphne Bozaski está simplesmente perfeita na composição primorosa de sua personagem, que tinha o sério risco de virar uma caricatura pouco crível. Afinal, a menina doce, extremamente carente e com aspecto de nerd sofre de Síndrome de Asperger, um grau mais leve de autismo. Esse transtorno neurobiológico é pouco conhecido e o autor acertou em cheio quando o colocou em uma de suas protagonistas. Embora ainda não tenha sido falado claramente na trama, o problema vem sendo exposto através das atitudes da menina.

Benedita tem problemas de convívio social e sempre foi uma pessoa solitária. Tudo mudou quando conheceu Lica (Manoela Aliperti), Ellen (Heslaine Vieira), Keyla (Gabriela Medvedovski) e Tina (Ana Hikari) no metrô, fazendo questão de adicioná-las no WhatsApp, organizando um novo quinteto que se tornou inseparável. Contudo, as dificuldades da frágil menina sempre se mostraram presentes, apesar dessa evolução em torno de um maior vínculo de amizade.

Ela é metódica e não entende ironias, levando tudo ao pé da letra. Muitas vezes, inclusive, essa incapacidade de compreender a malícia na fala dos demais a deixa com um gostoso ar cômico.

Já o incômodo com o toque funciona como uma espécie de alerta mais sério em torno da síndrome. Benê odeia contato físico (característica comum de vários autistas) e já se descontrolou em alguns momentos, após ter sido tocada, entrando em um surto de agressividade. A atriz impressiona quando expõe esse lado mais “sombrio” da personagem, mostrando como está dominando o perfil, se entregando aos sentimentos que em vários instantes acabam embaralhados na cabeça da menina, a deixando desnorteada, sem entender suas reações. Não é fácil convencer em um papel tão complicado, mas a intérprete consegue com aparente facilidade. Não por acaso conquistou o público logo na primeira cena.

A atriz, sabiamente, também conseguiu imprimir um tom “fofinho” e uma expressão inocente como características principais de Benê, despertando a imediata empatia do telespectador, que sente uma vontade inevitável de proteger aquela garotinha de todo o mal. As suas cenas com Aline Fanju, intérprete de Josefina, mãe da menina, são bonitas e cheias de cumplicidade. Há uma troca boa de uma profissional mais experiente com outra ainda começando. E, vale ressaltar, que a zeladora da escola sabe que tem uma filha diferente, pois durante os surtos nunca encosta nela, embora faça questão de ficar perto, servindo como ponto de apoio. Davi Souza, responsável por dar vida ao implicante Julinho, irmão de Benedita, é outro bom colega da intérprete.

E Daphne ainda vem protagonizando momentos delicados ao lado de Bruno Gadiol. A proximidade de Benê e Guto é um dos trunfos da temporada, despertando torcida pelo casal ‘Gunê’. A nerd, por sinal, demonstrou pela primeira vez interesse em uma pessoa por causa dessa relação, que inicialmente começou através das aulas de piano que ele dava para ela, após ter perdido uma aposta. Porém, o personagem demonstrou que também é diferente, expondo uma clara dificuldade de lidar com o sexo. Essa questão, por sinal, começou a ser inserida quando Benedita perguntou se ele queria namorá-la, provocando uma inesperada reação agressiva. A rejeição a deixou destruída emocionalmente, valorizando mais uma vez a atuação da atriz. Todo o namoro deles também vem explorando a relação diferente desse par, tendo a delicadeza como maior característica. Vale a menção, ainda, ao surto da personagem diante dos pais do namorado, em virtude das situações inesperadas que ocorreram durante o jantar com os sogros.

Já as cenas ao lado de Manoela Aliperti, Gabriela Medvedovski, Ana Hikari e Heslaine Vieira são repletas de humor e momentos sensíveis. Há uma harmonia perfeita entre as cinco, fazendo jus ao protagonismo da temporada. É bom ressaltar que esse é o segundo trabalho de Daphne com Cao Hamburger. Ele a dirigiu na elogiada Que Monstro Te Mordeu?, série infantil da TV Cultura, exibida em 2014, onde viveu a Lali Monstra. Ou seja, a parceria bem-sucedida foi repetida agora e se mostrou mais um êxito. Ele pode ser considerado um padrinho dela na televisão, pois tem conseguido explorar muito bem o seu talento, provando que vai muito longe.

A sensível Benê é a personagem mais querida de Malhação – Viva a Diferença e o trabalho de composição de Daphne Bozaski se mostra irrepreensível. É um perfil que desperta atenção em vários aspectos, começando pela Síndrome de Asperger —- que ainda merece maior enfoque no enredo, vale reforçar —-, passando pela construção de amizades verdadeiras e do relacionamento com seu primeiro amor, finalizando na forma como encara sua vida. A atriz vem defendendo todo esse conjunto com habilidade e é uma das gratas revelações dessa temporada tão boa.


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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor