O Rio de Janeiro vive um período que pode ser considerado catastrófico. O país todo está em um momento caótico, mas a cidade maravilhosa consegue estar pior. E um dos casos mais preocupantes é a violência, culminando ainda na falência das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora, antes vistas como uma esperança). Mais de cem policiais já foram mortos só esse ano e até o final desse texto algum outro terá morrido. Com base nisso, Glória Perez resolveu prestar uma justa homenagem aos policiais mortos no capítulo desse sábado (14/10) de A Força do Querer.

Na penúltima semana da novela, a autora inseriu um novo personagem na trama que tinha como único objetivo morrer: o PM Gerson (Well Aguiar), amigo de Jeiza (Paolla Oliveira), que acompanhou a vitória da colega em uma luta de MMA. A amizade dos dois era antiga, segundo o roteiro, e a cumplicidade ficou mostrada nos breves momentos deles juntos.

No final do capítulo de sexta (13/10), o policial foi assaltado e morto por dois marginais assim que a dupla viu a farda e uma arma no carro da vítima. “É policial”, gritou um, implicando no imediato disparo do segundo, matando o rapaz.

Foi uma cena aterrorizante e que todo brasileiro já viu ou presenciou. A realidade disfarçada de ficção. Jeiza ainda matou um bandido, mas o outro escapou. O grito de desespero dela, logo após constatar a morte do amigo, representou a dor de 108 famílias de policiais que sofreram (e sofrem) esse ano. Paolla Oliveira deu um show de emoção e o momento arrepiou o telespectador. O choro da esposa e do filho da vítima também comoveu, relembrando tantas matérias nos telejornais que foram ao ar ao longo de 2017.

Apesar de tudo ser fruto de ficção, foi um fato cruelmente real e corriqueiro na vida dos brasileiros, principalmente dos cariocas – vale ressaltar que o irmão do ator que interpretou esse PM também era policial e foi morto por marginais (trágica coincidência).

O capítulo de sábado mostrou o velório do policial, exibindo uma mensagem de homenagem aos 108 PMs mortos no RJ. Ainda houve um discurso enfático de Caio (Rodrigo Lombardi) exigindo a reforma do Código Penal, que estacionou em 1940. “Fuzil é a arma que mais mata entre nós. Tão assaltando com fuzil na rua. E a pena é de três anos. Ou seja, em seis meses ele pode estar de volta. Nós apreendemos 24 armas por dia. E, ainda assim, enxugando gelo, com a falta de material humano, a gente consegue evitar uma barbárie. O que nós exigimos, o que a sociedade exige, é uma reforma criminal. Porque a sociedade está em 2017, o crime acompanha a sociedade em 2017, e o nosso Código Penal parou em 1940”, indignou-se.

Além da bela homenagem, a autora tocou no necessário ponto da fragilidade das leis, que reforçam a todo instante o clima de impunidade que reina no país. Quase sempre todos os bandidos presos têm várias passagens pela polícia e muitos foram liberados pela justiça. E nada muda. O pior é que os presídios estão superlotados, ou seja, era para ter ainda mais lotação nas cadeias. E ninguém trabalha nos presídios. Enfim, uma sucessão de erros.

Em 2002, o Estatuto do Idoso foi criado graças ao trabalho do autor Manoel Carlos, em Mulheres Apaixonadas. O escritor emocionou o público com o drama de Flora e Leopoldo (saudosos Carmem Silva e Oswaldo Louzada), avós constantemente maltratados pela neta, Dóris (Regiane Alves). Quem sabe agora exista uma iniciativa semelhante por causa da dedicação de Glória Perez.

A Força do Querer representou a Polícia Militar da melhor forma possível, ignorando os policiais corruptos e a parte podre da PM. A autora fez questão de mostrar a parte íntegra da corporação, representada lindamente pela figura de Jeiza, quase uma Mulher Maravilha. E agora, com essa bela homenagem aos policiais mortos, Glória homenageou várias famílias dilaceradas pela dor e ainda tocou em uma ferida aberta da sociedade brasileira.

SÉRGIO SANTOS é apaixonado por televisão e está sempre de olho nos detalhes, como pode ser visto em seu blog. Contatos podem ser feitos pelo Twitter ou pelo Facebook. Ocupa este espaço às terças e quintas


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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor