Atualmente vivendo Hélio em Terra e Paixão, Rafael Vitti viveu uma situação inusitada em Além da Ilusão. Ele contracenou com seu pai, João Vitti, que foi galã da Globo nos anos 1990 e fez uma participação especial. Nessa trama, o personagem foi condenado injustamente por um crime que não cometeu – e o mesmo aconteceu com seu pai em outra produção da emissora.

João Vitti em Despedida de Solteiro
João Vitti em Despedida de Solteiro

A novela em questão era Despedida de Solteiro, escrita por Walther Negrão e exibida pela Globo entre junho de 1992 e janeiro de 1993.

Na obra, João vivia Xampu. Ele e seus três amigos, João Marcos (Felipe Camargo), Pedro (Paulo Gorgulho) e Paschoal (Eduardo Galvão), participavam de uma festa de despedida de solteiro de um deles numa cachoeira. Porém, no dia seguinte, a prostituta Arlete (Gabriela Alves) foi encontrada morta.

João Marcos acabou preso durante a cerimônia de seu casamento e seguiu para a cadeia com seus amigos. Os quatro foram condenados a 21 anos de prisão.

Despedida de Solteiro

Após sete anos de reclusão, eles conseguiram liberdade condicional. No entanto, Xampu volta bastante doente e, antes de morrer, se casa com Bianca (Rita Guedes), uma moça interesseira.

Assustado com o repentino sucesso, João Vitti nem teve tempo de curtir a experiência, pois seu personagem morria no capítulo 18.

“Gravei minha última cena no dia da estreia da novela. Ficou aquele gosto de foi bom, mas quero mais”, brincou o ator em entrevista ao Jornal do Brasil, em junho de 1992.

Tema censurado

Durante suas pesquisas para criação da trama, o autor chegou a visitar presídios e ficou impressionado com a alta incidência do vírus da Aids entre os internos. Cerca de 16% da população carcerária era HIV positivo em 1992, segundo Negrão.

“Foi uma experiência marcante. Achei que a novela poderia funcionar como um alerta para a precária situação dos presos aidéticos. A TV pode e deve fazer esse merchandising social. Mas, na época, a Globo censurou a minha ideia, com o argumento de que o tema seria um ‘voduzão’ para uma novela das 18 horas”, disse Walther Negrão ao livro “Autores – Histórias da Teledramaturgia”, do projeto Memória Globo.

A ideia inicial era que o personagem Xampu contraísse o vírus HIV na cadeia, após ser estuprado por outro preso. Porém, com a censura, ele contraiu hepatite B numa briga de faca com um inimigo de cadeia que já estava contaminado.

“Fiquei com pena. Até plasticamente é muito complicado mostrar um personagem depauperado pela Aids”, comentou Negrão.

“Nunca ficou claro”

João Vitti e Rafael Vitti

Em entrevista ao portal Gshow em 2019, o intérprete de Xampu comentou sobre a morte do seu personagem na história.

“O Xampu morreu de Aids, mas isso nunca ficou claro na trama. Não sei se foi alguma questão interna ou se foi porque era uma novela das seis, mas ele morreu porque na época a proposta do autor era abordar a questão da Aids de forma discreta”, relembrou.

As cenas do seu personagem na prisão foram gravadas no extinto Carandiru e João aproveitou para se aprofundar na pesquisa. Ele visitou uma ala que era chamada de “sanatório”, onde ficavam os presidiários soropositivos.

“Não existia uma atenção a isso, então acredito que a proposta do Walther Negrão era jogar luz sobre essa questão prisional que estava acontecendo”, comentou o ator, que ainda completou: “A novela foi em 1992, a Aids começou a pipocar em 1985, e em 1990 estavam morrendo pessoas, eu perdi alguns amigos”.

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Sebastião Uellington Pereira é apaixonado por novelas, trilhas sonoras e livros. Criador do Mofista, pesquisa sobre assuntos ligados à TV, musicas e comportamento do passado, numa busca incessante de deixar viva a memória cultural do nosso país. Escreve para o TV História desde 2020 Leia todos os textos do autor