A estreia de Lícia Manzo no horário nobre, após as primorosas A Vida da Gente e Sete Vidas, vem sendo o melhor dos presentes.

Um Lugar ao Sol está no ar há menos de um mês, mas a autora já conseguiu apresentar sua história central com bastante habilidade e, aos poucos, os núcleos paralelos vão surgindo e, também, com vários conflitos bem construídos. Não há cena desnecessária. Tudo tem um sentido ou uma razão para estar ali.

Impressiona como Lícia vem desenvolvendo seu roteiro sem enrolação ou pontas soltas. Todos os núcleos têm uma ligação e as peças acabam se encaixando mais cedo ou mais tarde.

A autora está conseguindo contar sua história com dinamismo, apresentando capítulos repletos de acontecimentos e encerrados sempre com ganchos de tirar o fôlego. Como a produção terá apenas 107 capítulos, há uma maior facilidade para evitar a chamada barriga (período de enrolação).

Mas, ao mesmo tempo, havia o risco de uma pressa que atrapalharia o entendimento e a densidade do enredo, o que não tem acontecido.

Autora mostra um novo lado

Licia Manzo

A escritora está mostrando um novo lado até então desconhecido do público que acompanhou suas duas novelas anteriores. Isso porque as já citadas A Vida da Gente e Sete Vidas não eram folhetins de grandes viradas ou ganchos impactantes. Eram folhetins que retratavam o cotidiano de uma forma delicada e envolvente.

Tanto que não havia necessidade de finais arrebatadores para prender o telespectador ao capítulo seguinte. Dava gosto acompanhar a vida daqueles personagens tão humanos e reais. Parecia que você estava vendo tudo pelo buraco da fechadura.

Mas a essência de Lícia segue em Um Lugar ao Sol. Os perfis têm várias camadas e a sensibilidade domina a narrativa. Todos têm suas falhas e suas virtudes. É fácil mergulhar na vida daquelas pessoas.

É até difícil resumir tudo o que já aconteceu na novela, mas está claro que não é uma mera história de gêmeos. Renato foi assassinado e Christian quando assumiu o lugar do irmão acabou se transformando no vilão de sua própria vida, ainda que enfrente as consequências das canalhices de seu irmão, que morreu em seu lugar quando encarou a consequência da vida do outro.

Confuso? Nem tanto. É um grande novelo que destrói o emocional de várias pessoas enquanto vai sendo desenrolado.

Destaques do elenco

Cauã Reymond está com o papel mais desafiador de sua carreira e tem feito jus ao protagonismo. A relação de Christian e Bárbara vem despertando atenção em virtude da avalanche de sentimentos que permeia o casal. Alinne Moraes está brilhante interpretando uma mulher tão dependente e frágil emocionalmente.

A trama de Rebeca (Andrea Beltrão em um retorno triunfal às novelas) é outro ponto alto da história e sua saga lembra muito a de uma Helena de Manoel Carlos. A modelo que não sabe lidar com o passar dos anos tem sido defendida com talento pela atriz e seu envolvimento com Felipe (Gabriel Leone), agora ex-namorado da amiga de sua filha, já desperta uma boa expectativa.

Até porque também implica no conflito direto com Cecília (Fernanda Marques, boa revelação), que não aceita a forma como a mãe se comporta e vive.

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A amizade de Rebeca com Ilana (Mariana Lima), que funciona como uma troca de desabafos e conselhos, ainda destaca a perfeita sintonia entre as atrizes. Lícia ainda escreveu uma cena corajosa em que Rebeca se masturbou, após ter se recusado a transar com o marido.

A autora faz questão de mostrar mulheres de 50 anos com vida sexual ativa. Sem qualquer moralismo besta. O conflito que surgirá entre a personagem e a terapeuta, que é avó de Felipe, interpretada pela grande Regina Braga, é mais um que promete.

Há também muitos outros núcleos e situações que vêm causando a melhor das impressões, mas é desanimador constatar a forma como a novela vem sendo tratada pela Globo.

Globo errou feio em alguns pontos

Os horários, desde a estreia, seguem volúveis, o que impede a fidelização do público. A frase “televisão é hábito” existe há muito tempo e a emissora sempre se diferenciou das concorrentes por respeitá-la. Não é o que vem sendo feito.

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Para culminar, precisava estrear a produção em novembro e com uma divulgação tão fraca? O canal já estreou muitas tramas neste mês, é verdade, mas não eram produtos que substituíram reprises.

E nem uma reprise que fracassou como a de Império. Não poderiam reduzir a reexibição da trama de Aguinaldo Silva, que foi colocada quase na íntegra, para antecipar a estreia da Lícia ao menos em um mês?

Segundo alguns sites, a decisão não foi tomada para não prejudicar o remake de Pantanal ano que vem. Afinal, assim a produção acabaria começando na época do Carnaval, período de audiência catastrófica.

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Ou seja, houve uma decisão pensada da empresa para sacrificar um produto com o intuito de beneficiar o outro?

A verdade é que sempre ficou claro o entusiasmo da Globo com a adaptação do sucesso de Benedito Ruy Barbosa na TV Manchete. Parecia até que o próximo folhetim era esse e não o da Lícia.

Um Lugar ao Sol, que ainda tem a ótima direção de Maurício Farias e uma trilha sonora escolhida a dedo, merece mais prestígio da Globo e mais atenção do telespectador.

É um novelão da melhor qualidade e quem ainda não viu tem tempo para colocar os capítulos em dia e começar a acompanhar. Vale a pena.

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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor