Uma das novelas mais marcantes de todos os tempos, A Viagem foi exibida recentemente pelo canal Viva, para delírio dos saudosos da teledramaturgia brasileira. Mas você sabia que a Globo tem em mãos um projeto para continuação da história?

A trama de sucesso, primeira com temática espírita que se tem notícia, foi guiada pela figura marcante de Alexandre (Guilherme Fontes), um suicida que passa a infernizar a vida de todas as pessoas responsáveis pelo seu trágico destino. Isso inclui o seu irmão, Raul (Miguel Falabella), e o cunhado, Téo (Maurício Mattar), com quem o jovem não mantinha boa relação.

No meio dessa trama, Diná (Christiane Torloni) se divide entre o amor pelo irmão condenado e o envolvimento amoroso com o conceituado criminalista Otávio Jordão (Antônio Fagundes), que não mediu esforços para incriminar Alexandre.

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À frente dos roteiros, a autora Solange Castro Neves (foto abaixo) deu vida aos personagens sob a vigilância marcante da lendária Ivani Ribeiro, que assinou a novela.

Em conversa exclusiva com a reportagem, Solange relembrou os momentos marcantes da trama, sua saída da Rede Globo e seus projetos para o futuro.

Confira:

A Viagem voltou ao Viva. Você acompanhou a trama? Qual a sensação de assistir a novela que fez tanto sucesso quase 30 anos depois?

É sempre bom rever um grande trabalho como foi esse de A Viagem. Essa novela foi um grande desafio para mim, pois, na época, a Ivani já não estava em condições devido a sua saúde estar muito debilitada e trabalhei praticamente sozinha. Dormia no máximo duas ou três horas por dia. Quando o Mario Lucio Vaz e o Boni descobriram que eu estava à frente de tudo e que a Ivani estava internada há tempos no hospital, brincaram perguntando o que eu tomava para entregar seis capítulos por semana, sem a ajuda de ninguém. Quando eu respondi que eu tomava guaraná em pó, eles morreram de rir e ironizavam dizendo que o guaraná em pó era milagroso. Apesar de todos os obstáculos que enfrentei, tenho muito orgulho de ter feito parte desse trabalho maravilhoso, que ampliou a consciência de muitos telespectadores na época e ainda o faz até hoje.

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Consegue recordar-se da sequência mais marcante a ser escrita em A Viagem? A que você atribui o mesmo sucesso da novela entre as novas gerações?

Laura Cardoso estava em uma sequência de cenas onde ela brilhava com seu grande talento, quando era obsediada por Alexandre, perturbando e criando conflitos dentro de sua família, quando ela teve de se ausentar por tempo indeterminado, para fazer uma operação. A grande preocupação da atriz era o desfecho da sua personagem. Ela não queria, de maneira nenhuma, morrer na trama e eu prometi a ela que não iria acontecer. Ela gravou cenas dentro do hospital onde estava em tratamento e depois, quando em recuperação, sua volta aos estúdios da Globo foi motivo de grande comemoração.Essa cena eu escrevi com muito carinho e gratidão. Quanto ao sucesso da novela, acredito que o público esteja carente de respostas, principalmente agora nesse momento que estamos vivendo, de pandemia. Saber que existe vida após a morte, é uma forma de acalentar a alma e amenizar o medo, que temos, do desconhecido.

Você apresentou para a Globo uma sinopse de um projeto que seria a continuação de A Viagem (O Retorno). Pode nos contar alguns detalhes sobre essa produção?

Há muitos anos, apresentei uma sinopse à Globo sobre a continuação de A Viagem, mas chegamos à conclusão de que o telespectador não estava, ainda, preparado para essa nova etapa. Agora, entrando em uma nova era, a de Aquário, em que todos os segredos estão sendo revelados, por acreditar que a humanidade está sedenta de respostas, tenho certeza de que o momento é propício. A trama tem como ideia principal o processo da reencarnação, ou seja, a vida após a vida. Certamente, todos aqueles que se encantaram com a temática de A Viagem, gostarão de saber que a vida é a continuação de uma longa história e que tudo tem uma razão de ser. Não cai uma folha da árvore sem que o Pai tenha ciência disso.

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Após o falecimento de Ivani, a autora deixou duas obras prontas: a sinopse da novela Quem é Você? e uma minissérie chamada O Sarau, inspirada nas obras de Machado de Assis. A última produção nunca foi ao ar, você sabe o motivo?

Sempre fui uma grande admiradora das obras de Machado de Assis. O Sarau é uma compilação dessas obras, tendo a ideia principal a Dualidade da Vida que ele, mais do que qualquer outro autor consagrado, simbolizou em seus textos. O Sarau, portanto, é um duelo entre dois homens apaixonados pela mesma mulher. Um desafia o outro através das obras desse grande autor. Apresentei esta sinopse um pouco depois que Ivani faleceu. Por motivos graves de saúde em minha família, saí da Globo em comum acordo com a casa, depois de 14 anos de trabalho, que só tenho a agradecer pelo carinho, respeito e confiança. Fui trabalhar na Record porque as produções eram feitas aqui em São Paulo e eu poderia dar assistência ao meu marido que estava muito doente.

Você escreveu o início da novela Quem é Você, sob a supervisão de Lauro César Muniz. Após alguns capítulos, você saiu da emissora e o autor deu continuidade a novela. Em 22 de março de 1996, a Folha de São Paulo explicou que, “a Globo tem o direito de mudar o rumo das novelas. Se o autor não concordar, a emissora compra os direitos da história”. Qual o real motivo por trás da sua saída da emissora?

Vinha de vários trabalhos sucessivos ao lado de Ivani Ribeiro e Cassiano Gabus Mendes. Com a perda dos dois, e também do Paulo Ubiratan, um grande diretor e amigo querido, além do afastamento do Boni, uma das pessoas mais inteligentes e leais que conheci em minha vida, senti-me órfã na casa em que trabalhava por tantos anos. Nessa novela, Quem é Você, seria a primeira vez que iria roteirizar com a supervisão de Lauro Cesar Muniz, um grande autor, mas com estilo e métodos de trabalho muito diferentes dos meus. Fomos levando até que um novo problema surgiu. Meu marido descobriu que estava com uma doença grave e a minha família precisava de mim. Conversei com o Boni, com o Mario Lúcio Vaz e pedi meu afastamento e o Lauro assumiu sozinho, a trama.

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Após sua saída da Rede Globo, você escreveu duas novelas na Record (Marcas da Paixão e Roda da Vida – sendo a primeira reprisada atualmente na Rede Família). Quais lembranças você tem desse período? Qual o saldo sobre essas duas tramas?

Acredito que foram saldos positivos para mim e para a casa. Cada obra realizada simboliza um desafio conquistado. A Record, na época, estava começando a dramaturgia e tivemos muitos obstáculos a serem vencidos. Com a união da equipe e de todo o elenco, da produção, enfim, todos os envolvidos nessas duas novelas, tivemos o sucesso esperado. Toda vez que vejo um trabalho meu no ar, penso que poderia ter feito algo a mais. Sou muito crítica comigo mesma. Ainda assim, fico muito feliz em relembrar momentos tão gratificantes em minha vida. Só tenho a agradecer à casa pelos anos que ali trabalhei.

A Globo adaptou a novela O Profeta para o horário das 18h em 2006. Você acompanhou a novela? Você costuma assistir novelas? Destacaria alguma produção recente que lhe chamou atenção?

Eu gostaria de poder acompanhar mais as novelas, pois amo a dramaturgia. No entanto, por causa da correria do dia a dia, fica difícil ter tempo hábil para assistir tudo o que gostaria. A novela O Profeta é uma história lindíssima da Ivani e acredito, apesar de não ter podido acompanhar, que tenha sido novamente um sucesso. Um trabalho recente que assisti e dou os parabéns para todos os envolvidos, foi a série Sob Pressão. Excelente. Atores excepcionais que deram um banho de interpretação, direção perfeita, diálogos ricos e envolventes. Só posso dizer que é sensacional.

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Você leciona cursos de roteiro para jovens autores. Como vê essa possibilidade de repassar seu conhecimento aos novos escritores? Quais seus planos para o futuro?

Adoro dar aulas. Acredito que precisamos sempre reciclar e a cada turma aprendemos ao mesmo tempo em que passamos a nossa vivência. Por causa da pandemia, tenho dado cursos online, mas nada substitui o presencial porque a participação dos alunos em conjunto, enriquece o trabalho de todos. Criei formas didáticas novas para motivá-los enquanto passamos por essa situação endêmica, mas assim que voltarmos ao normal, continuarei com as aulas “ao vivo”.

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Alexandre Pequeno é jornalista e apaixonado pelas novelas brasileiras desde a infância. A paixão foi tanta que seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) foi sobre a novela Mulheres Apaixonadas, de Manoel Carlos. Em 2018, lançou o canal Novelando, onde aborda, de forma bem humorada, sobre as tramas que marcaram a história da TV. Já publicou contos e crônicas em antologias nacionais Leia todos os textos do autor