A Globo confirmou o retorno de Queridos Amigos, minissérie escrita por Maria Adelaide Amaral e exibida em 2008. A trama, estrelada por Dan Stulbach, será uma das atrações do Projeto Resgate do Globoplay em 2024.

Odilon Esteves em Queridos Amigos
Odilon Esteves em Queridos Amigos

A produção foi muito elogiada em sua exibição original. No entanto, nos dias de hoje, ela provavelmente seria condenada pela crítica e por setores da sociedade. Isso porque ela traz dois atores cis, Odilon Esteves e Ricardo Monastero, vivendo as travestis Cíntia e Brenda. Uma escalação que seria polêmica atualmente.

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Trama

Elenco da minissérie Queridos Amigos
Elenco da minissérie Queridos Amigos

Um dos personagens principais de Queridos Amigos é Benny (Guilherme Weber), um homossexual ácido que é muito próximo das travestis Cíntia (Odilon Esteves) e Brenda (Ricardo Monastero).

De acordo com o portal Teledramaturgia, do pesquisador Nilson Xavier, Cíntia foi inspirada em Telma Lipp, e Brenda, em Vera Abelha. Tratam-se de duas travestis famosas no cenário paulistano entre as décadas de 1970 e 1990.

Cíntia, aliás, marcou a estreia do ator Odilon Esteves na televisão. Recentemente, o ator mineiro integrou o elenco de Mar do Sertão (2022), vivendo o tímido advogado Firmino.

“Cíntia sobrevive como artista, trabalha como uma espécie de crooner. É tão próxima de Benny que ele a leva em festas dos amigos, deixa que conviva com as crianças numa boa. Quis mostrar que ela é uma personagem muito digna”, afirmou Odilon ao jornal O Globo em 14 de fevereiro de 2008.

 

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Escalação controversa

Rafael Primot em Tapas e Beijos
Rafael Primot em Tapas e Beijos

Na época, a escalação de atores cis para viverem travestis na televisão foi vista com naturalidade. Mas, atualmente, isso seria condenável. Cada vez mais aberta à inclusão – felizmente! -, a televisão brasileira tem, aos poucos, dado mais espaço para artistas trans e travestis. Por isso, a Globo provavelmente escalaria atrizes travestis para encarnarem as personagens.

O diretor e roteirista Rafael Primot, responsável pela série Chuva Negra (disponível no Globoplay), é um defensor da inclusão na dramaturgia. Ele, que já viveu a travesti Stephanie na série Tapas & Beijos, afirmou recentemente que não faria mais a personagem.

“Eu ter feito uma personagem travesti foi importante para a causa, porque elas não eram chamadas para fazer. Agora, não é mais o momento de eu estar lá, porque a gente precisa abrir esse espaço”, explicou ele, em entrevista ao portal Notícias da TV.

“Agora, a gente precisa se recolher como artista e abrir espaço para que outras pessoas ocupem cada lacuna. Inclusive atrás das câmeras, porque 90% dos realizadores são homens héteros. E, em um terceiro momento, a atriz trans vai fazer papel de cis e vai estar tudo certo, a gente nem vai debater isso, porque ela é uma artista acima de tudo”, completou.

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“Hoje eu não faria”

A Força do Querer - Carol Duarte e Silvero Pereira
Divulgação / Globo

Mas Rafael Primot não é o único ator que já viveu uma travesti na TV a afirmar que não faria mais essa personagem. Silvero Pereira, que ficou famoso como Elis Miranda em A Força do Querer (2017), também declarou que não aceita mais trabalhos assim.

“Hoje eu não faria a Elis Miranda, muito provavelmente. Porque eu também me reeduquei sobre essa história, e a gente precisa estar de acordo com as lutas e as causas. Depois de A Força do Querer, eu não aceitei mais nenhum personagem trans/travesti, e inclusive deixei de fazer meus espetáculos por causa disso”, declarou o ator em entrevista ao podcast Papo de Novela, em 2022.

“Eu fui entendendo, sendo informado e compreendendo essa questão dentro do mercado. Se a gente aceita, a gente está impedindo o mercado de ir em busca dessas pessoas. Hoje, nós não vivemos num mercado em que exista proporcionalidade. Se nós existíssemos dentro de um mercado de proporcionalidade, onde as pessoas têm acesso ao estudo e à formação, aí sim a gente estaria em uma outra discussão”, analisou.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor