André Santana

Em entrevista ao podcast Papo de Novela, o autor Walcyr Carrasco defendeu o final feliz de Ramiro (Amaury Lorenzo) em Terra e Paixão. O novelista explicou que quis passar ao público que as pessoas podem melhorar e se transformar.

Amaury Lorenzo em Terra e Paixão
Amaury Lorenzo em Terra e Paixão

Porém, isso não apaga o desserviço prestado pela maior emissora do país em pleno horário nobre. Ramiro teve um bom arco de redenção, é verdade, mas deixá-lo praticamente impune por seus crimes não foi o final mais adequado para o homem, que matou e torturou muita gente ao longo da novela.

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Defesa

 

Em entrevista ao podcast Papo de Novela, Walcyr Carrasco explicou porque optou pelo final feliz de Ramiro e Kelvin (Diego Martins) em Terra e Paixão.

“Um desfecho que torna o público feliz é o casamento do Kelvin e Ramiro, um casal que deu super certo e que todo mundo torceu o tempo inteiro. É um desfecho que o público está esperando, então, é para já”, admitiu.

O autor reforçou que quis passar uma mensagem positiva ao apostar em um arco de redenção para o jagunço de Antônio La Selva (Tony Ramos).

“A mensagem que tento passar em todas as novelas é que as pessoas podem se transformar, podem ser melhores”, cravou.

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Impunidade

Ramiro (Amaury Lorenzo) e Kelvin (Diego Martins) em Terra e Paixão
Ramiro (Amaury Lorenzo) e Kelvin (Diego Martins) em Terra e Paixão (divulgação)

Walcyr Carrasco não está errado ao dar um tom otimista a um personagem que poderia ser odioso. Kelvin e Ramiro realmente formavam o melhor casal de Terra e Paixão e, por isso mesmo, mereciam um final feliz.

Porém, o autor errou ao optar pela impunidade para construir o arco de redenção de Ramiro. A transformação foi até convincente, já que conseguiu desenvolver diferentes camadas no personagem. É possível cravar que Ramiro foi um homem que cresceu sem amor e, ainda por cima, precisou reprimir sua verdadeira orientação sexual. Por isso, acabou se tornando uma pessoa violenta.

O amor de Kelvin, neste contexto, mostrou um novo e possível caminho para Ramiro. Assim, sua transformação é crível, e esse é um dos motivos que levou o público a se apaixonar por ele.

Porém, tal transformação não apaga tudo o que Ramiro fez. O autor devia ter tomado cuidado para não deixar um homem que assassinou tanta gente passar quase impune. Ramiro era réu confesso e, mesmo assim, se manteve livre de qualquer pena até o final da história. Foi preso só quando matou Antônio, demonstrando que Justiça só se faz neste país quando o crime envolve “figurões”.

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Caminhos possíveis

Todas as Flores - Letícia Colin e Regina Casé
Regina Casé e Letícia Colin em Todas as Flores (Reprodução / Globoplay)

Outras novelas já mostraram bandidos redimidos, mas tomaram o cuidado de não deixá-los sem punição. Nestes casos, o final feliz veio só depois que estes personagens cumpriram suas penas e quitaram suas dívidas com a justiça.

Em Todas as Flores (2022), por exemplo, Zoé (Regina Casé) passou uns bons anos na cadeia antes de reencontrar Maíra (Sophie Charlotte) e ser perdoada pela filha. O mesmo aconteceu com Carminha (Adriana Esteves) em Avenida Brasil (2012), que fez as pazes com Nina (Débora Falabella) após deixar o presídio. Christian (Cauã Reymond) também amargou alguns anos vendo o sol nascendo quadrado antes de iniciar uma nova vida em Um Lugar ao Sol (2021).

Em Terra e Paixão, Ramiro ficou solto mesmo depois de ter confessado todos os assassinatos que cometeu. E foram muitos! No final, só foi preso porque matou Antônio diante de várias testemunhas. Ainda assim, ficou claro que passaria pouco tempo na prisão, por conta de uma delação premiada. É justo?

Mas estamos falando de Walcyr Carrasco, um autor que puniu Félix (Mateus Solano) – um vilão que jogou um bebê em uma caçamba – apenas lhe dando uns dias de pobreza vendendo cachorro-quente…

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor