Chega ao fim a terceira reprise de O Rei do Gado (1996) no Vale a Pena Ver de Novo. Mais uma vez, a saga de Bruno Mezenga (Antonio Fagundes, foto abaixo) conquistou o público, registrando excelentes índices de audiência para a Globo.

Antonio Fagundes

Mas, apesar do êxito, nem todo mundo ficou feliz com o desenrolar e o desfecho da trama. Gloria Pires, por exemplo, não fez questão de esconder sua insatisfação com os rumos de Rafaela, sua personagem na obra de Benedito Ruy Barbosa. E com toda razão! Mal construída, a falsa sobrinha de Geremias (Raul Cortez) oscilou entre o bem e o mal de maneira bastante inconsistente.

Ao que tudo indica, nem mesmo o autor da trama entendeu de fato quem era Rafaela. Tanto que seu desfecho foi uma das várias falhas da reta final do folhetim.

Usurpadora?

O Rei do Gado - Gloria Pires
Divulgação / Globo

Rafaela chega à O Rei do Gado dizendo-se ser Marieta Berdinazzi, a sobrinha que Geremias tanto busca para fazê-la de herdeira. Inicialmente, ela é cúmplice de Fausto (Jairo Mattos), mau-caráter que está de olho na fortuna do velho.

No entanto, não demora muito para que a usurpadora seja desmascarada. A chegada de Luana (Patrícia Pillar), que é a verdadeira Marieta, joga água nos planos da bandida. Porém, Rafaela insiste que é uma Berdinazzi: ela conta que, na verdade, é neta de Bruno (Marcello Antony), irmão de Geremias que morreu na Itália durante a guerra.

Mas, na reta final de O Rei do Gado, Geremias descobriu que Rafaela não é neta de Bruno. Na verdade, seu pai é filho de um segundo relacionamento de Gema (Sonia Tozzi), a mulher com quem o irmão de Geremias se envolveu antes de morrer. É Giuseppe (Emilio Orciollo Neto) o verdadeiro neto de Bruno.

Inconsistências

O Rei do Gado - Gloria Pires e Raul Cortez
Divulgação / Globo

A revelação sobre o passado de Rafaela é cheio de inconsistências, como bem apontou o jornal O Globo, em 19 de janeiro de 1997. A matéria assinada por Lilian Fernandes mostra que são várias as falhas presentes na trama que envolve o passado da “pseudovilã”.

Por exemplo: nunca ficou bem explicado os motivos que levaram Rafaela a não se apresentar como uma Berdinazzi legítima desde o início. Afinal, a trama deixa claro que, apesar de ela não ser neta de Bruno, Rafaela cresceu acreditando que fosse. Ela nem mesmo sabia da existência de seu primo Giuseppe. Pra que fingir ser Marieta se ela acreditava também ser herdeira de Geremias?

Além disso, a matéria de O Globo aponta que um cálculo matemático simples já desmonta a origem de Rafaela, já que seu pai não poderia ter sido concebido durante a guerra. Além disso, num dos últimos capítulos da trama, Geremias afirmou que Rafaela veio para o Brasil com o pai em busca de sua herança, fato confirmado por ela. Porém, no capítulo seguinte, ela afirmou que o pai chegou antes dela.

Ou seja, Benedito Ruy Barbosa parece ter se embananado todo ao criar Rafaela e explicar o passado da jovem. Talvez por isso, a personagem não tenha rendido tanto quanto Gloria Pires (e o público) esperava…

Erros

O Rei do Gado

Além da história capenga de Rafaela, O Rei do Gado também teve outros erros ao longo de sua trajetória. A saga de Pirilampo (Almir Sater) e Saracura (Sergio Reis), por exemplo, começou muito bem, mas perdeu força durante a trama. No final, a dupla virou quase figurante de luxo.

Já a personagem Luana alçou Patrícia Pillar ao estrelato de vez, mas a protagonista da trama não foi desenvolvida adequadamente. A ex-boia fria começou e terminou a trama do mesmo jeito, sem nenhum tipo de transformação.

O Rei do Gado também falhou ao mostrar vários crimes sem castigo. Rafaela tentou matar Geremias, mas acabou sendo recompensada por ele com uma fazenda. Já Marcos (Fabio Assunção) foi responsável pela morte de Ralf (Oscar Magrini), mas não pagou por isso.

Até Geremias passa ileso: ele roubou a família no passado, matou Fausto, mas não tem punição. Pelo contrário: termina feliz ao lado de Judite (Walderez de Barros) após fazer as pazes com Bruno Mezenga (Antonio Fagundes).

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor