Fechar os olhos para O Outro Lado do Paraíso é ignorar violência contra a mulher

02/11/2017 às 9h00

Por: Duh Secco
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É consenso nos comentários a respeito de O Outro Lado do Paraíso, internet afora: a novela de Walcyr Carrasco é muito pesada. Será mesmo? Não seria “pesada” a realidade de um país onde os índices de mulheres agredidas por seus companheiros só faz aumentar? Ao transformar em ficção dados que só vemos em noticiários, através de personagens ocultos – para evitar retaliações dos parceiros às declarações -, o autor obriga o público a reagir. E se sentir desafiado por uma novela, é fato, incomoda quem assiste.

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É o que está acontecendo agora com agressões de Gael (Sérgio Guizé) contra Clara (Bianca Bin), em ‘Outro Lado’. É incômodo ver uma mulher apanhar a ponto de baixar na enfermaria, não é? Na vida real, infelizmente, também acontece. E muitas mulheres também reagem como Clara, que inventa acidentes domésticos para poupar Gael de eventuais acusações – ele também a estuprou em plena lua-de-mel.

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Para o telespectador da recém-encerrada A Força do Querer, o contraste chega a soar assustador: saem Jeiza (Paolla Oliveira) e Ritinha (Ísis Valverde) – a que colocou o namorado pra fora ao descobrir uma traição e a que dispensou dois pretendentes por gostar mais de si – e entra Clara, consciente do crime do marido, mas condescendente com suas atitudes.

O “desamor” faz lembrar Bibi (Juliana Paes), outra personagem da novela anterior, capaz de matar ou morrer em nome da ilusão que criou em torno de Rubinho (Emílio Dantas), o aprendiz de traficante que só valorizava a esposa nos momentos em que se via encalacrado com seus “superiores” ou com a polícia. A diferença é que Bibi era “cheia de si”; Clara, além de apática, não tem consciência de seu valor – lembra aquela vizinha, a prima, a amiga que se julga inferior ao “homem da casa” e, por isso, merecedora de uns tapas.

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Clara é capaz de reconhecer Gael em terceiros – como na cena em que Nick (Fábio Lago) contou a ela sobre as agressões que sofreu de um namorado, por anos -, mas não faz nada para puni-lo, nem mesmo para coibir novas investidas criminosas. Sua postura é tão incômoda quanto as surras que leva; e a previsão é de que ela apanhe até mesmo durante a gestação. O machismo de outras personagens, como Nádia (Eliane Giardini), também soa desagradável à audiência, por ser, infelizmente, verídico.

Walcyr Carrasco não pode abrir mão da trama de Clara e Gael, como outros autores fizeram com assuntos espinhosos, em nome dos índices. A violência doméstica irá implicar na degradação psicológica da mocinha, internada em uma espécie de “prisão” psiquiátrica, onde trabalhará para se tornar uma mulher implacável, disposta a destruir os que a destruíram. A virada folhetinesca promete catalisar o público, que agora hesita em espiar a trama, como se tapasse os ouvidos diante dos gritos de socorro de milhares de mulheres agredidas a todo o tempo.

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