Apesar de ter conquistado a concessão para a criação da Rede Manchete em 1981, junto com Silvio Santos, que logo colocou no ar o SBT, Adolpho Bloch (1908-1995) teve paciência e inaugurou sua emissora somente dois anos depois, em 1983, com um início muito promissor, já incomodando a Globo logo de cara.

Após investir US$ 50 milhões em instalações, equipamentos e enlatados, além de contratar 800 profissionais, a Rede Manchete estreava há exatamente 38 anos, em 5 de junho de 1983, às 19 horas, com um pronunciamento de seu proprietário.

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“Meus amigos, hoje é um dia importante para a Família Manchete. Como você sabe, a nossa riqueza é o trabalho e o otimismo. Para nós, a televisão foi um desafio. Estamos felizes em continuar contribuindo para a construção de um Brasil grande. O presidente João Figueiredo confiou em nossa empresa. Para nós, a televisão representa responsabilidade. Deixo com vocês, meus amigos, a Rede Manchete de Televisão. Ela está no ar”, disse o empresário ucraniano.

O primeiro programa apresentado pela Manchete foi O Mundo Mágico, um show de variedades que contou com diversas apresentações, como Milton Nascimento, Paulinho da Viola, Ney Matogrosso, Alceu Valença, entre muitos outros. A atração incomodou a Globo, principalmente no Rio de Janeiro. Enquanto o Fantástico alcançou 35 pontos, o show da Manchete chegou perto, com 33 – uma proeza.

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Logo em seguida, assim que terminou o jornalístico global, a Manchete colocou no ar o filme Contatos Imediatos de Terceiro Grau (foto abaixo), de Steven Spielberg, até então inédito na TV brasileira. A Manchete gastou nada menos que US$ 800 mil para adquirir os direitos de exibição do longa-metragem, mas o investimento foi recompensado com a liderança: venceu a Globo por 27 a 12, algo impensável no início dos anos 1980.

A Globo não admitia preocupação com a chegada da nova emissora, mas reforçou sua programação, principalmente em cenas de ação nas novelas, com a recém-estreada Guerra dos Sexos e a principal delas, Louco Amor.

“Ela vai dar um banho em emissoras como a TVS [atual SBT] e a Bandeirantes”, afirmou o então diretor de Eventos Especiais da Globo, Aloysio Legey, à revista Veja de 15 de junho de 1983. Já o diretor-superintendente da Manchete, Rubens Furtado, estava muito animado com a estreia. “Esse filme foi um estardalhaço”, disse à mesma reportagem.

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Televisão de alto nível

A Manchete não chegou para disputar o primeiro lugar com a Rede Globo, mas queria conquistar o segundo lugar. Até então, o SBT era vice-líder absoluto, seguido por Record e Band. As pretensões da emissora giravam em torno de 8 a 12 pontos – e fatia compatível no total de verbas publicitárias.

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À Folha de S. Paulo de 5 de junho de 1983, Rubens Furtado explicou. “A TVS se dirige ao público C e D; a Bandeirantes não tem público definido, enquanto a Globo pretende ser eclética. Pesquisas nos mostraram a insatisfação dos segmentos A e B com a programação que lhes é oferecida atualmente. Então, decidimos optar por esse público. Além disso, os Bloch têm a tradição de ter, em sua empresa, iniciativas de alto nível”, enfatizou.

O fôlego inicial da estreia não conseguiu ser repetido nos dias seguintes – o Jornal da Manchete era muito extenso e nem toda a grade continha atrações capazes de puxar grande audiência. Mas a Manchete beliscava alguns destaques aqui e ali, como na transmissão exclusiva do Carnaval de 1984, quando voltou à liderança, derrotando Champagne, da Globo.

Mas os concorrentes não acreditavam na proposta da emissora. “Quando entramos, também imaginamos um segundo lugar. Ninguém entra para perder. Porém, acho que se a Manchete quiser sobreviver, a curto prazo terá de optar por uma programação semelhante à nossa e a da Globo, procurando classes mais populares. Como já ficou provado, aqueles que optaram por públicos mais sofisticados tiveram problemas graves, como a Bandeirantes, por exemplo”, destacou à Folha o então vice-presidente do SBT, Luciano Callegari.

Dito e feito: em pouco tempo, a Manchete iniciou reformulações em sua programação, buscando maior audiência e faturamento.

Apesar de grandes momentos como as coberturas carnavalescas e novelas como Pantanal, A História de Ana Raio e Zé Trovão e Xica da Silva, após sucessivas crises e uma grande dívida, a Manchete saiu do ar em 1999, dando lugar à RedeTV!.

Ironicamente, o primeiro slogan da emissora era “a televisão do ano 2000”, mas ela não conseguiu chegar lá.

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Thell de Castro

Apaixonado por televisão desde a infância, Thell de Castro é jornalista, criador e diretor do TV História, que entrou no ar em 2012. Especialista em história da TV, já prestou consultoria para diversas emissoras e escreveu o livro Dicionário da Televisão Brasileira, lançado em 2015 Leia todos os textos do autor