André Santana

Aline (Barbara Reis), de Terra e Paixão, é uma protagonista de personalidade. Ao contrário das mocinhas clássicas, ela não abaixa a cabeça diante dos inimigos e sempre puxa para si a responsabilidade sobre sua própria vida. Por conta disso, ela seria uma heroína digna de torcida, certo?

Débora Falabella e Barbara Reis em Terra e Paixão
Débora Falabella (Lucinda) e Barbara Reis (Aline) em Terra e Paixão (Fábio Rocha / Globo)

Errado. Apesar das qualidades, Aline não consegue despertar a empatia do público, que torce mais por personagens como Lucinda (Débora Falabella) e Anely (Tatá Werneck).

A principal falha da professora é a incapacidade de demonstrar algum afeto verdadeiro na trama de Walcyr Carrasco, diferentemente das personagens citadas acima. Seus sentimentos parecem efêmeros e, por isso mesmo, pouco convincentes. Com isso, ela não gera identificação na audiência.

Com Aline, Walcyr Carrasco repete o mesmo erro de concepção de Gloria Perez, que, em Travessia (2022), apresentou uma mocinha que também era difícil de torcer.

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Viúva

Aline (Barbara Reis) em Terra e Paixão
Aline (Barbara Reis) em Terra e Paixão (reprodução/Globo)

A maior prova de que Aline demonstra não nutrir afetos verdadeiros foi a maneira como ela lidou com suas perdas. Logo no início da trama, ela viu o marido Samuel (Ítalo Martins) ser assassinado por bandidos que invadiram suas terras. Porém, mesmo sendo chamada de viúva até hoje, ela nunca demonstrou a dor desta perda.

Pelo contrário. Em uma de suas primeiras falas, Aline admitiu que não amava Samuel, mas as circunstâncias a levaram a se casar com ele. Logo em seguida, ela já começou a se envolver com Daniel (Johnny Massaro).

Por mais que ela não amasse o marido, Aline nunca demonstrou odiá-lo. Sendo assim, ao que parece, ela ao menos o respeitava. Por isso, ficou estranho a maneira como tudo se desenrolou. Aline perdeu o marido e, simplesmente, tocou sua vida, como se nada tivesse acontecido.

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Sem luto

Johnny Massaro (Daniel) e Barbara Reis (Aline) em Terra e Paixão
Johnny Massaro (Daniel) e Barbara Reis (Aline) em Terra e Paixão (Reprodução / Globo)

Capítulos depois, Aline enfrentou outra perda. Ela era a namorada de Daniel quando o jovem advogado morreu. Sendo assim, seria natural que ela sofresse com a dor da perda. Embora o casal nunca tenha demonstrado muita química, Aline repetiu algumas vezes que estava apaixonada.

Porém, Daniel mal foi enterrado e Aline se envolveu com Caio (Cauã Reymond). Nada contra a mocinha buscar a felicidade e encontrar um novo amor, pelo contrário. Mas é estranho que, depois da morte do advogado, o sentimento que ela tinha por ele tenha simplesmente desaparecido. Não houve o momento do luto.

Outros relacionamentos de Aline também chamam a atenção pelo distanciamento. Ela repete que age por seu filho, mas poucas vezes a vemos ao lado do garoto. Até mesmo Jonatas (Paulo Lessa) sempre fez de tudo para ajudá-la, e ela nunca tentou retribuir de alguma maneira. Em suma: Aline parece uma mulher desapegada de tudo e de todos.

Esse jeito desprendido de Aline faz com que o público não se identifique com ela. Como a mocinha não viveu essas dores, ela não conseguiu despertar a compaixão da audiência. Assim, fica muito difícil torcer por ela.

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Erro que se repete

Lucy Alves
Lucy Alves em Travessia (Reprodução / Globo)

O público costuma não perdoar certos deslizes das mocinhas de novela. Tanto que Brisa (Lucy Alves), a protagonista de Travessia, não caiu nas graças do espectador por conta da série de atitudes pouco inteligentes que tomou no início da história. Como torcer por alguém que só enfia os pés pelas mãos?

O erro se repete com Aline, de Terra e Paixão. O público não perdoou o pouco afeto demonstrado por ela em relação às perdas, ao trato com o filho e a quem a rodeia. Aline acabou se mostrando volúvel e, por isso, não conseguiu conquistar o espectador.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor