Dentre tantas novelas que “ficaram pelo caminho” – leia-se foram engavetadas ainda na sinopse ou tiveram suas produções interrompidas pelas mais diversas intempéries – uma sempre é citada pelos noveleiros e estudiosos do assunto: Escândalo, de Miguel Falabella. Prevista para agosto de 1998, a trama nunca saiu do papel. Em termos.
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Boa parte dos conflitos previstos na sinopse foram reaproveitados pelo autor em outros trabalhos. O título fazia referência ao principal cenário da novela: a redação de um tradicional jornal, cujo fundador morre já nos primeiros capítulos, deixando a administração (e a editoria) nas mãos de seu filho intelectual, sem tino para os negócios.
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Para salvar o periódico da falência, o herdeiro (papel de José Wilker) decide investir numa linha sensacionalista – contando com uma intrépida paparazzi (Rosi Campos). O mote remete à série A Vida Alheia (2010), também de Falabella, ambientada na redação de uma revista de fofocas, de propriedade de Catarina Faissol (Marília Pêra).
Uma das atrizes mais recorrentes nas obras de Falabella, Marília (falecida em 2015) também era cotada para Escândalo: como a viúva de um banqueiro, irmã de Wilker, que, ao mesmo tempo em que tentava assumir o controle acionário do jornal, lutava pela guarda do neto contra a viúva de seu filho, que morreu tragicamente.
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Parece familiar, não? Era este o conflito de Ester Bogari (Zezé Polessa), a vilã de A Lua Me Disse (2005), opositora de Heloísa (Adriana Esteves), que criava com muita luta o menino que tivera com Ricardo (Frank Borges) – e que se envolvia com o cunhado Gustavo (Wagner Moura). Em Escândalo, “Heloísa” caberia a Malu Mader.
Miguel Falabella prometia uma história de amor forte, resultado da repercussão aquém das expectativas do casal romântico de Salsa e Merengue (1996), seu trabalho anterior. O público desta trama das 19h se interessou mais por personagens periféricos do que por Madalena (Patrícia França) e Eugênio (Marcello Antony) – que terminaram separados.
O humor, contudo, daria o tom do folhetim – na equipe de texto, a habitual parceira Maria Carmem Barbosa, além de Cláudio Paiva (da equipe do Sai de Baixo (1996)) e Aloísio de Abreu (oriundo do teatro). Através da graça, Falabella pretendia “cutucar feridas que sempre estiveram abertas”, como afirmou ao Estado de São Paulo, de 13 de julho de 1997.
Além de corrupção, ética e homossexualidade, Escândalo previa discussões sobre o ofício do artista – com Arlete Salles como uma atriz decadente. E sobre racismo, através de uma família negra de classe alta, formada por Clementino Kelé, Chica Xavier, Elisa Lucinda e Zezeh Barbosa (irmãs em Aquele Beijo (2011)).
O ator Ricardo Brasil fez testes para integrar este núcleo. Chegou a ligar para Miguel, mas, sem sucesso, tratou de buscar outras formas de chamar a atenção do autor e da equipe para seu trabalho: espalhou em ruas do Rio de Janeiro outdoors com o apelo “Falabella, eu quero fazer Escândalo!”.
Mas, no fim das contas, nem mesmo Miguelito fez Escândalo. Sem maiores explicações, a Globo elegeu a regionalista Meu Bem Querer, de Ricardo Linhares, para substituir Corpo Dourado, de Antônio Calmon.
Em entrevista a Isto É, em agosto de 1999, o autor lamentou o “engavetamento”: “Até hoje não fizeram comentário sobre a novela. Mas já entreguei a Deus. Tenho horror a gente que arrasta cadáver. Tudo na minha vida vem certo”. E Escândalo veio certinha, em outros projetos e outras épocas.