Uma cena forte chocou o mundo em janeiro de 1987. Acusado de corrupção, o político norte-americano Budd Dwyer cometeu suicídio com um tiro na boca durante uma entrevista coletiva transmitida ao vivo por emissoras de televisão da Pensilvânia. As imagens repercutiram em todo o mundo, inclusive no Brasil.

Dwyer, membro do Partido Republicado, foi membro da câmara e do senado da Pensilvânia entre as décadas de 1960 a 1980. Posteriormente, foi trabalhar no tesouro nacional, posição que ocupava quando surgiram as denúncias. No final de 1986, ele foi acusado de receber a quantia de US$ 300 mil.



Foi oferecido um acordo de delação premiada – semelhante aos que estão sendo feitos na Operação Lava Jato, no Brasil, quando o acusado assume a culpa e coopera com as investigações. Se aceitasse, poderia pegar, no máximo, cinco anos de prisão.

Mas Dwyer jurou inocência e recusou o acordo. Sem isso, a pena poderia chegar a 55 anos de cadeia e a devolução da quantia recebida.



Um dia antes do anúncio de sua sentença, o político convocou uma coletiva de imprensa onde prometeu esclarecer o caso. Quando todos pensavam que ele assumiria a culpa, veio a surpresa: Dwyer já havia arquitetado um plano para se matar em frente às câmeras.

Durante o encontro, ele novamente jurou inocência. “Eu agradeço ao bom Deus por ter me concedido 47 anos de desafios instigantes. Agora minha vida mudou, sem uma razão aparente. Eu enfrento uma pena máxima de 55 anos numa prisão e o pagamento de US$ 300 mil por ser inocente”, declarou, dizendo-se vítima de perseguição política.



Após mais algumas palavras, citando os sistemas judicial e político dos Estados Unidos, Dwyer chamou três assessores, entregando um envelope a cada um deles: no primeiro, uma nota de suicídio para sua esposa; no segundo, a declaração de doação de órgãos; já no terceiro, uma carta para o governador da Pensilvânia.

Em seguida, o político pegou um quarto envelope, de onde retirou um revólver e avisou: “por favor, deixem o recinto se isto os ofende”. Os jornalistas ficaram desesperados e tentaram evitar o pior, mas não teve jeito. Dwyer avisou que o revólver poderia machucar alguém, enfiou o cano na boca e puxou o gatilho, caindo morto na hora.

Ouviram-se gritos no local, além da grande poça de sangue que se formou. Um assessor, em vão, pediu para que os presentes não entrassem em pânico.



Autocensura na Globo

As emissoras da Pensilvânia exibiram o fato ao vivo, perto do meio-dia, horário com grande audiência infantil – para piorar, ocorrera uma tempestade de neve naquela manhã e as escolas estavam fechadas. Os telejornais nacionais mostraram trechos do vídeo, mas não a cena completa.

O mesmo aconteceu no Brasil. O Jornal Nacional daquele dia citou o fato, mostrando Dwyer pegando a arma e dando o tiro, mas imagem foi congelada neste momento, com o áudio do disparo prosseguindo.

Armando Nogueira (1927-2010), que era o diretor de jornalismo da Globo na época, explicou sua decisão no especial sobre os 50 anos da televisão brasileira exibido pela emissora em 2000. “Eu mandei congelar a imagem, mantive o tiro, o áudio em cima da imagem. Isso é uma forma de autocensura, mas nós estávamos começando a dominar o veículo”, declarou.



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Thell de Castro

Apaixonado por televisão desde a infância, Thell de Castro é jornalista, criador e diretor do TV História, que entrou no ar em 2012. Especialista em história da TV, já prestou consultoria para diversas emissoras e escreveu o livro Dicionário da Televisão Brasileira, lançado em 2015 Leia todos os textos do autor