No dia 17 de outubro de 1972, portanto há 49 anos, terminava O Primeiro Amor, novela das sete da Rede Globo. A trama de Walther Negrão ficou marcada por um triste acontecimento: a súbita morte do ator Sérgio Cardoso, então com 47 anos, quando faltavam apenas 28 capítulos para o desfecho da história.

Um dos grandes nomes do teatro e da televisão brasileira nos anos 1950 e 1960, Cardoso, que vivia o protagonista da trama, o professor viúvo Luciano, morreu decorrente de um ataque cardíaco.

Ironicamente, sua última fala na trama foi premonitória: “não aguento mais. Vou embora daqui”. E ele saiu de cena para não voltar mais.

A morte do ator comoveu todo o Brasil. Mais de 15 mil pessoas, de acordo com reportagens da época, compareceram ao enterro no cemitério São João Batista, na capital fluminense.

À Globo, coube definir o que faria com a novela: encerrá-la precocemente, sumir com o personagem ou colocar outro ator no lugar? Ao livro “Autores, Histórias da Teledramaturgia”, do projeto Memória Globo, Negrão contou que um diretor até sugeriu que o enterro do ator fosse gravado e que fosse usado na novela. “Não tinha nada a ver”, comentou.

Optou-se, dessa forma, por fazer a substituição por outro ator. Leonardo Villar, amigo pessoal de Cardoso, acabou ficando com o papel.

“A substituição do personagem (no capítulo 200) foi feita com todo o elenco reunido no palco do Teatro Fênix, no Rio de Janeiro. Sérgio Cardoso aparecia saindo por uma porta em sua última aparição na novela. Depois, com a cena congelada no vídeo, um texto lido por Paulo José explicava o que acontecera e relembrava a trajetória do ator. Por fim, batia-se à porta e, quando a cena recomeçava, entrava Leonardo Villar, sendo recebido pelo elenco”, contou nosso colunista Nilson Xavier em seu site Teledramaturgia.

Enterrado vivo?

Pouco tempo depois do enterro, surgiu um boato, repercutido em toda a mídia brasileira, de que o ator sofria de catalepsia, uma doença rara que deixa os membros rígidos por horas, como se a pessoa estivesse morta. Por causa disso, Sérgio Cardoso teria sido enterrado vivo.

A história dizia que a família teria pedido que o corpo fosse desenterrado para uma exumação. Ao abrir o caixão, Sérgio Cardoso estaria virado de bruços, com arranhões no rosto. O fato sempre foi negado pelos familiares do ator.

Durante muitos anos a lenda foi contada, com diferentes versões, causando medo principalmente em familiares de pessoas vítimas de ataques cardíacos.

Em novembro de 1979, o assunto voltou à tona após a entrevista do tabelião Manoel Olegário da Costa ao Fantástico, dizendo ser amigo de Cardoso. Em um dos encontros, o ator teria demonstrado, com clareza, o pavor de ser enterrado vivo. “Ele disse realmente que tinha medo que isso pudesse acontecer”, comentou.

A atriz Nydia Licia, que foi casada com o Sérgio Cardoso durante 10 anos, falou pela primeira vez sobre o assunto na mesma reportagem do Fantástico. Ela afirmou que o assunto causava muito sofrimento à família e que o ator nunca havia comentado sobre esse pavor. “Ele nunca teve catalepsia, certeza absoluta. Não somente jamais manifestou algum sintoma de doença nervosa no período que tivemos casado, nem depois. O povo pode comentar, mas não é verdade”, disse.

Licia também disse que não conhecia Costa. “Não conheço esse senhor, não sei se Sérgio o procurou ou se foi uma conversa informal, mas o fato de ter dito na conversa que tinha medo de ser enterrado vivo não quer dizer absolutamente nada”, salientou.

Segundo a atriz, o boato surgiu logo após a morte de Sérgio Cardoso. “Uma pessoa que ninguém conhece procurou um jornal de Manaus, dizendo que Sérgio havia sido enterrado vivo e que a família teria pedido exumação do cadáver. Imediatamente a notícia correu o Brasil inteiro”, declarou.

Ela afirmou, categoricamente, que o caixão nunca foi aberto. “Nunca precisou, de maneira alguma, não tem porque. Sérgio faleceu no dia 18 de agosto de 1972 e ponto final. Ninguém tem dúvida, nem os médicos, nem a família. O resto do público eu espero que não tenha mais”, disparou.

Compartilhar.
Thell de Castro

Apaixonado por televisão desde a infância, Thell de Castro é jornalista, criador e diretor do TV História, que entrou no ar em 2012. Especialista em história da TV, já prestou consultoria para diversas emissoras e escreveu o livro Dicionário da Televisão Brasileira, lançado em 2015 Leia todos os textos do autor