Um terremoto para eliminar a maior parte dos personagens de uma novela. Essa foi a solução radical encontrada pela autora Janete Clair (1925-1983) quando a novela Anastácia, a mulher sem destino, em 1967, confundia o público da Globo e naufragava nos índices de audiência.
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A produção estreou na emissora, que tinha apenas dois anos de existência, em 28 de junho daquele ano. Era a época das novelas de capa e espada, com histórias rocambolescas, supervisionadas por Glória Magadan (1920-2001).
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Escrita pelo ator Emiliano Queiróz, o eterno Dirceu Borboleta de O Bem Amado (1973), Anastácia era baseada no folhetim francês A Touti Negra do Moinho. A história se passava na Rússia após o fim do czarismo. Anastácia, vivida por Leila Diniz (1945-1972), era uma moça pobre que ignorava quem era seu pai. Posteriormente, descobriu que era a filha caçula do último czar russo, Nicolau 2°. A trama era ambientada em uma ilha vulcânica das Antilhas, onde Anastácia se refugiava após a descoberta de seu passado, escondendo sua identidade.
O público não entendeu o enredo, confuso e longe da realidade brasileira, o que era comum nas atrações daquela época. Além disso, existiam muitos personagens, o que dificultava o desenvolvimento da história.
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Cabide de empregos
A jornalista Rose Esquenazi fez uma reportagem sobre os acontecimentos da novela no Jornal do Brasil de 16 de julho de 1994. “No capa e espada de Emiliano iam entrando todos os amigos desempregados e conhecidos que pediam uma forcinha. Só que, com tanta gente na trama, o autor acabou se confundindo e ninguém, muito menos o público, conseguiu entender a história”, relatou.
Com os baixos índices de audiência e muitas reclamações por meio de telefonemas e cartas, a emissora teve que tomar uma atitude: afastou Queiróz e chamou Janete Clair para dar um jeito. A autora já era reconhecida naquela época, escrevendo novelas para as rádios Nacional e Tupi.
Em seu primeiro trabalho na Globo, Janete criou um terremoto na ilha em que Anastásia se refugiava, eliminando mais de cem personagens de uma só vez.
Em entrevista ao Jornal do Brasil, o dramaturgo Dias Gomes (1922-1999), que era casado com Janete Clair, disse que eles leram juntos os 50 primeiros capítulos e ficaram pensando no que iam fazer. “Brincando, dissemos que precisávamos colocar uma bomba para acabar com aquela gente. Como a trama se passava numa ilha, achamos que um terremoto seria mais adequado”, comentou.
A partir daí, a história dá um salto de 20 anos, recomeçando com apenas sete personagens, entre eles Ênio Santos (1922-2002), Miriam Pires (1926-2004), Henrique Martins e Leila Diniz, que, além de Anastácia, acumulou o papel de filha da protagonista. A audiência subiu, a novela terminou no dia 16 de dezembro de 1967 e Janete Clair ganhou a confiança dos diretores da emissora, sendo contratada em definitivo. Virou um dos grandes nomes da teledramaturgia nacional.
Explosão de shopping em 1998
Em 1998, Silvio de Abreu usou tática similar em Torre de Babel, também na Globo. A novela, que estreou dia 25 de maio daquele ano, não foi bem aceita pelo público.
O autor agiu rápido. Já prevista na sinopse, a explosão do shopping center onde se passava boa parte da trama foi utilizada para eliminar Leila (Sílvia Pfeifer), a homossexual casada com Rafaela (Christiane Torloni). O público rechaçou a possibilidade de Leila, então viúva, se envolver com Marta (Glória Menezes), esta separada de César (Tarcísio Meira).
O relacionamento, uma das possibilidades levantadas na sinopse de Silvio, foi amplamente divulgado, de modo contraditório, pelos veículos de comunicação que condenavam também o excesso de violência do enredo. Foram eliminados também – estes já “marcados para morrer” no primeiro tratamento da novela – o dependente químico Guilherme (Marcello Antony), o grosseirão Agenor (Juca de Oliveira) e Rafaela.
A partir daí, com história mais leve e focada no humor e romantismo, Torre de Babel engrenou e terminou como mais um sucesso.