Quando se ouve Palpite, clássico de Vanessa Rangel, é impossível não associar ao casal Milena (Carolina Ferraz) e Nando (Eduardo Moscovis), de Por Amor. Em outro exemplo, quando escutamos Love By Grace, de Lara Fabian, lembramos da icônica cena de Camila (Carolina Dieckmann) raspando sua cabeça em Laços de Família. Ou então A Miragem, de Marcus Vianna, que abrilhantou a história de amor de Lucas (Murilo Benício) e Jade (Giovanna Antonelli) em O Clone com seu inesquecível verso “Somente por amor…”.

São inúmeros os exemplos de trilhas marcantes que logo remetem a personagens ou casais inesquecíveis em nossa teledramaturgia. A sensação de escutar uma música e logo lembrar daquele tipo que marcou época é muito boa. Em alguns casos, a popularidade da trilha na novela ajuda inclusive a alavancar a carreira musical do artista. No entanto, de uns tempos para cá, a tendência vem se modificando e causando uma inevitável estranheza.

Novelas recentes como Rock Story e A Força do Querer têm chamado atenção em suas trilhas pelo fato de pouquíssimas músicas serem dirigidas especificamente para personagens. Na trama das sete, Me Espera, dueto de Sandy e Tiago Iorc, foi definido como tema do casal Gui Santiago (Vladimir Brichta) e Júlia (Nathalia Dill). Na das nove, Sereia foi uma composição de Roberto Carlos feita especialmente para o enredo de Glória Perez, mais precisamente a sereia Ritinha (Isis Valverde).

De resto, as músicas tocam para praticamente todo mundo. Pode acontecer de a mesma canção embalar cenas de personagens de núcleos totalmente diferentes ou o contrário – um mesmo personagem ou casal ter inúmeros temas. É o caso do casal Jeizeca (Jeiza e Zeca), o melhor par da novela anterior.

O irresistível romance vivido pelos personagens de Paolla Oliveira e Marco Pigossi teve várias músicas em suas cenas. Algumas delas: Olha (versão de Alcione para a música do já citado RC), Coração Machucado (Wesley Safadão) e I Hate You, I Love You (Gnash e Olivia O’Brien). Até mesmo Despacito (Luís Fonsi e Daddy Yankee) já tocou para eles. Assim fica difícil saber qual é o tema do casal.

E O Outro Lado do Paraíso, a julgar pelos primeiros capítulos, não foge à regra. Na atual novela das nove, Hold On (Alabama Shakes) já tocou tanto para as cenas quentes de Lívia (Grazi Massafera) e Renato (Rafael Cardoso) como para uma recente sequência de Suzana (Ellen Rocche) e Samuel (Eriberto Leão).

Também na trama de Walcyr Carrasco, outro caso chamou a atenção: a participação de Simone e Simaria no capítulo de sábado, fazendo um show na cidade de Palmas (onde a história é ambientada) e cantando sucessos como Meu Violão e o Nosso Cachorro e Homem de Família, de Gusttavo Lima.

Até aí tudo bem, não fosse o fato de esta primeira fase do enredo se passar em 2007 – época em que estas músicas não existiam e a dupla ainda não era famosa nacionalmente, apesar de já ser bem conhecida em regiões como o Nordeste brasileiro. Algo difícil de acreditar.

Estes aspectos indicam que, nos últimos tempos, o cuidado com as trilhas sonoras de algumas das principais telenovelas não é o mesmo. É evidente a sensação de estranheza quando uma música toca para um determinado personagem e, algum tempo depois, a mesma canção é ouvida em outro núcleo completamente diferente. O mesmo ocorre quando a música é de uma época desconexa da retratada, como recentemente em Os Dias Eram Assim, ambientada nos anos 70 e 80, mas que tocou Maracatu Atômico, da Nação Zumbi, gravada em 1996.

Como parte integrante da nossa teledramaturgia, as trilhas sonoras das novelas necessitam de um trabalho mais caprichado em sua aplicação nas histórias. O público gosta de ouvir a canção em uma trama e automaticamente associar ao personagem que mais gosta, ou àquela cena inesquecível. Que este detalhe volte a ser levado em consideração nas próximas obras.


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