Nos últimos meses, o público vem acompanhando notícias pela imprensa a respeito da grande reestruturação pela qual a Globo está passando. Não somente a Rede Globo, mas todo o Grupo Globo, incluindo a Globosat, com os canais como Multishow, Viva, Sportv, entre outros, o Sistema Globo de Rádio, a Editora Globo, o Globoplay e outras empresas da organização.

Em março deste ano, foram apresentados os resultados financeiros de 2019 do Grupo, que apontaram queda na receita, no lucro e no faturamento com publicidade. De acordo com os dados do balanço, divulgados pelo jornal Valor Econômico, integrante do Grupo, a receita líquida consolidada da companhia foi de R$ 14,1 bilhões em 2019 – queda de 4% em relação a 2018. Já o lucro consolidado foi 37,2% menor do que o registrado em 2018, com o montante de R$ 752,5 milhões. No ano anterior, o lucro foi de R$ 1,2 bilhão.

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Mesmo com alguns números negativos, o maior conglomerado de comunicação do Brasil não parece ter a saúde abalada. No caixa, estão R$ 10,5 bilhões, crescimento de 3% a mais do que a reserva financeira do ano anterior, de acordo com reportagem do Meio & Mensagem. A dívida não é pequena, mas seria 3,3 vezes menos que o dinheiro guardado. Já no ano passado, a Globo economizou R$ 500 milhões com inúmeros cortes.

A grande aposta da Globo está no Globoplay. A emissora está querendo virar uma Netflix – e está correta nesse pensamento, já que não há como escapar desse futuro. Para isso, investiu pesadamente em sua plataforma de streaming, produzindo séries e documentários (ressalte-se que nada que ainda tenha empolgado muito o público), além de disponibilizar novelas antigas pedidas pelos telespectadores, como Tieta, A Favorita e Explode Coração, entre outras.

Em agosto de 2019, foi inaugurado o MG4, complexo de três estúdios de produção com o que existe de mais moderno em matéria de estrutura e equipamento. As produções do Globoplay também vão se utilizar do novo espaço. Somente aí, foram investidos R$ 200 milhões.

O projeto de reestruturação, chamado Uma Só Globo, provocou, nos últimos meses, mudanças em cargos estratégicos, ascensão de alguns e queda de outros. Programas dos canais por assinatura, como o Lady Night e o Música Boa, do Multishow, começaram a ser exibidos pela Globo. Profissionais do Sportv começaram a aparecer em programas e transmissões da Globo – e vice-versa, com o departamento totalmente integrado. As redações de jornalismo da Globo, GloboNews e G1 trabalham juntas. E por aí vai.

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Demissão de estrelas

Além de todo esse projeto, que ainda está em andamento, a Globo resolveu fazer cortes drásticos em sua inchada estrutura, assustando o público. A emissora já chegou a ter milhares de artistas sob contrato de exclusividade entre os anos 1970 e 1990, mas a situação mudou.

Os medalhões, que recebem altos salários e, muitas vezes, têm baixa produtividade, começaram a perder espaço. Mesmo jovens valores, que antes eram segurados pelo canal, estão livres para trabalhar onde quiserem, através dos projetos por obra. Chega de receber e ficar meses (ou anos) fora do ar.

Dessa forma, uma série de nomes deixou o cast global recentemente: Bruna Marquezine, Bruno Gagliasso, Bianca Bin, Aguinaldo Silva, Vera Fischer, Miguel Falabella, Stênio Garcia, Zeca Camargo, Malu Mader, Otaviano Costa, Reginaldo Leme, José de Abreu e, na última terça, Renato Aragão e José Loreto. E, pelo que informam as fontes dentro do Grupo, mais cortes estão a caminho.

Somente com essas dispensas na dramaturgia, de acordo com o colunista Ricardo Feltrin, do UOL, a economia vai ser superior a R$ 100 milhões anuais. Já no jornalismo, deixarão de gastar R$ 20 milhões por ano. É muita coisa.

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No campo esportivo, a situação não é menos crítica: a emissora trava uma guerra com o Flamengo, que iniciou nesta quarta a transmissão de seus jogos pelo YouTube, e pode ficar até sem a Copa do Mundo de 2022, já que entrou na Justiça do Brasil e da Suíça para rever o contrato milionário com a FIFA, deixando de pagar uma parcela de US$ 90 milhões, alegando prejuízos durante a pandemia. O mercado está apreensivo para acompanhar os próximos passos – a Globo transmite a Copa do Mundo, de forma ininterrupta, desde 1970.

O coronavírus, aliás, causou uma devassa nas receitas da Globo e das outras emissoras, com a redução dos investimentos em publicidade. A grade de novelas e shows da emissora exibe praticamente apenas reprises, incluindo os três horários de novelas noturnas. Também sumiram os jogos de futebol e as corridas de Fórmula 1, que garantem cotas com altíssimo lucro. Outra perda foi a Olimpíada de 2020, adiada para 2021, e que estava sendo aguardada com expectativa.

Em abril, a agência de análise de investimentos Moody’s alertou para os problemas financeiros do Grupo e rebaixou sua nota de crédito de Ba1 estável para Ba1 negativo, salientando, no entanto, que a Globo tem “crédito e liquidez sólidos”. E nem vamos entrar na questão da guerra travada com o presidente Jair Bolsonaro, que ameaçou até não renovar ou cassar a concessão da emissora, algo difícil de ser feito na prática.

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Com tudo isso, fica a pergunta: o que vai acontecer com a Globo? Alguns analistas enxergam que o Grupo está apenas se precavendo para poder investir nas plataformas digitais, como o Globoplay, e não acumular prejuízos maiores nesse ano difícil.

Por outro lado, outras pessoas entendidas do assunto veem o atual momento com preocupação. “Foi um gesto de desespero”, sentenciou um ex-executivo da emissora em entrevista ao Notícias da TV. “Mesmo que os executivos da Globo equacionem o problema financeiro no curto prazo, a capacidade de adaptação no longo prazo está comprometida”, disse outro especialista.

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Thell de Castro

Apaixonado por televisão desde a infância, Thell de Castro é jornalista, criador e diretor do TV História, que entrou no ar em 2012. Especialista em história da TV, já prestou consultoria para diversas emissoras e escreveu o livro Dicionário da Televisão Brasileira, lançado em 2015 Leia todos os textos do autor