André Santana

A “segunda temporada” de Todas as Flores decepcionou grande parte dos fãs da novela de João Emanuel Carneiro. A trama não conseguiu manter o nível da primeira leva de capítulos, apostando pesado em reviravoltas absurdas e sem sentido.

Letícia Colin
Reprodução / Globoplay

Personagens que arrebataram o público na primeira metade da trama simplesmente perderam o brilho, envolvidos em histórias tolas e sem propósito. Em meio a tantos erros, apenas Zoé (Regina Casé) e Vanessa (Letícia Colin, foto acima) souberam se manter como grandes trunfos da obra.

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Mudança de personalidade

Todas as Flores - Humberto Carrão e Sophie Charlotte
Divulgação / Globo

O principal erro da segunda parte de Todas as Flores foi que vários personagens tiveram que mudar de personalidade para forçar uma virada na trama. Os mocinhos Maíra (Sophie Charlotte) e Rafael (Humberto Carrão) foram os mais afetados com o “fenômeno”.

João Emanuel Carneiro parece viciado em construir mocinhas vingadoras e comprometeu a credibilidade de Maíra ao tentar transformá-la em uma. A jovem, que era uma mulher interessante e digna de torcida na primeira fase, transformou-se num pastiche no melhor estilo Gloria Perez.

É evidente que Maíra precisava agir quando teve seu filho roubado por Zoé. Mas não da maneira como aconteceu. Afinal, havia maneiras bem mais inteligentes de recuperar a criança e denunciar a vilã do que, do nada, ela resolver comprar crianças também. Foi forçado e transformou uma boa protagonista numa chata de galochas.

Rafael também mudou da água pro vinho na segunda fase. Após ser feito de trouxa por todo mundo capítulos a fio, do nada ele resolveu desconfiar de todos. Assim, seu jeito meio abobalhado na primeira fase deu lugar a um pilantrinha sonso, irônico e debochado. Assim mesmo, sem qualquer sutileza.

Sem brilho

Todas as Flores - Thalita Carauta
Reprodução / Globoplay

No entanto, a grande mudança de personalidade da segunda temporada aconteceu com Mauritânia (Thalita Carauta). A ex-atriz pornô, que despontou como o grande destaque do início da história, teve um desenvolvimento capenga na segunda leva.

No início, Mauritânia era uma mulher solar, debochada e que não abaixava a cabeça. Mesmo vivendo seus dramas familiares, ela se mantinha reta em seus propósitos. Tanto que a cena em que ela critica o trabalho de Vanessa foi um dos grandes hits do início da trama. A sequência resumia bem quem era Mauritânia.

Porém, esta esperteza desceu pelo ralo na reta final. A viva Mauritânia se revelou uma trouxa ao cair num golpe manjado de Humberto (Fabio Assunção). Além disso, sua participação na fase derradeira se resumiu ao romance sem graça com Javé (Jhona Burjack).

Deu errado

Douglas Silva, Leonardo Lima e Mary Sheila em Todas as Flores
Divulgação / Globo

Por outro lado, outras tramas já estavam dando errado desde o começo e assim seguiram até o fim. É o caso do núcleo de Oberdan (Douglas Silva), que rendeu momentos constrangedores do início ao fim.

Na primeira fase, as constantes traições do sambista, que vivia fazendo Jussara (Mary Sheila) de trouxa, não tinham a menor graça. Na segunda fase, a coisa piorou com a transformação de Celinho (Leandro Lima Carvalho), que passou de celibatário a pegador. Tudo muito ruim.

No fim, salvou-se apenas Zoé e Vanessa. A vilã de Regina Casé surpreendeu do início ao fim com suas múltiplas camadas. Ela foi capaz das maiores atrocidades, ao mesmo tempo em que demonstrava um amor legítimo pela filha e pelo neto. Já Vanessa foi a megera típica, caricata e divertida que caiu como uma luva nas mãos da talentosa Letícia Colin.

Com Todas as Flores, João Emanuel Carneiro ensaiou voltar à boa forma, depois das problemáticas A Regra do Jogo (2015) e Segundo Sol (2018). No entanto, alguns vícios do autor acabaram comprometendo o desenrolar da trama que, no geral, contou uma boa história. A obsessão por “viradas” acabou jogando no buraco um enredo que tinha seus méritos.

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André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Cresceu acompanhado da “babá eletrônica” e transformou a paixão pela TV em profissão a partir de 2005, quando criou o blog Tele-Visão. Desde então, vem escrevendo sobre televisão em diversas publicações especializadas. É autor do livro “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, publicado pela E. B. Ações Culturais e Clube de Autores. Leia todos os textos do autor