De visita indesejada à dona da casa: a trajetória de Ana Maria Braga no Mais Você

Dou a mão à palmatória. Vociferei contra o VIVA quando tomei conhecimento da reapresentação das primeiras temporadas do Estrelas, do Encontro com Fátima Bernardes e do Mais Você nos fins de tarde / início de noite do canal. Ainda não vejo a menor graça nos dois primeiros, mas não tive como não me render ao último. O programa me ganhou com referências às novelas da época, 1999: Terra Nostra, então em cartaz às 20h, é a mais reverenciada pela produção do programa; além, claro, das chamadas de A Indomada (1997) em Vale a Pena Ver de Novo – uma das reprises “mais precoces” da faixa.

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É interessante notar como um formato aparentemente estagnado mudou ao longo dos anos. Nestas quase duas décadas de história, o Mais Você abriu mão de pautas frias e da falação – minutos e minutos dedicados, por exemplo, a uma matéria sobre cultivo de plantas ornamentais – para investir no noticiário “quente”, nas reportagens concisas e nos realities, dos amadores do Jogo de Panelas aos profissionais do Fecha a Conta. Mais do que isso: Ana Maria Braga deixou de ser a “visita indesejada” para se tornar a “dona da casa”.

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Lembro bem da transição Record TV – Globo, repercutida em todos os veículos – ainda naquele tempo em que se consumia mais revistas e jornais do que internet. Uma corrente apontava o “erro” da apresentadora, estrela à frente do Note e Anote e do programa noturno que levava seu nome; apenas mais uma no olimpo e na grade engessada da emissora-líder. Outros insistiam em dizer que a “brega” Ana Maria não condizia com o “padrão Globo de qualidade”. Chegavam a cogitar, insistentemente, outro destino: o SBT, pouco ou quase nada “chique”.

Aninha deu de ombros. Galgou espaço entre o Vídeo Show e o Vale a Pena Ver de Novo e estreou seu Mais Você em 18 de outubro de 1999, às 13h40, demonstrando o deslumbramento nas falas, nos gestos e no olhar. Parecia aquela prima que deixou o interior para se encantar na capital. Perdeu-se em meio à beleza da casa nova: o vespertino, que estreou com 24 pontos de média e 28 de pico, viu a audiência ratear logo no primeiro mês, chegando a preocupantes 15 pontos; 12, no fatídico 17 de novembro em que perdeu para o famigerado Chaves.

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Ana Maria reagiu na segunda-feira seguinte, 23 de novembro – programa que o VIVA exibiu na última terça-feira, 6. Mal entrou no estúdio, retirou o ponto eletrônico do ouvido (sua ligação com o diretor) e desabafou: “Eu me sinto como alguém que chegou numa casa nova. E ela é tão bonita, tão bem-feita, que eu fico com medo de mexer nas coisas. […] Quero agradecer sua paciência e dizer que só quando eu chegar à minha casa poderei chegar também à sua. […] Se eu não me sentir mais eu, não serei mais você“.

Na declaração, o peso do salário de R$ 150.000 e dos investimentos de cerca de R$ 3 milhões em sua atração. E o de sentir-se desconfortável no novo sofá, alheia à sua cozinha, malquerida dentro do próprio lar. Num gesto simbólico, a loira tirou as luvas e iniciou o caminho de sucesso que ainda trilha – e no que depender, da audiência e do faturamento, continuará trilhando por muito tempo. O Mais Você, contudo, tardou a emplacar. Acabou remanejado para às 11h; “entrou em férias” por três meses, voltando ao ar às 8h, horário onde se consagrou.

19 anos depois, Ana Maria Braga é mais “dona da casa” do que nunca. Parou de convidar cozinheiros; passou a pilotar o fogão. Deixou o conselheiro sentimental de lado; tomou para si a responsabilidade de orientar seus telespectadores. Destaque das manhãs da Globo, conduz o Mais Você com simpatia, pulso firme – nota-se, no ar, que ela, tal e qual Fausto Silva, praticamente se dirige, feito raro na TV – e entusiasmo. Aquele entusiasmo que quase não se via lá nas primeiras edições do Mais Você. Ponto para ela. Ponto para nós.


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