– Gisele Joras, autora de Amor e Intrigas, foi a grande vencedora de um concurso promovido pela Record visando a descoberta de novos roteiristas. Cerca de 600 trabalhos concorreram ao prêmio de R$ 20 mil, além da chance de ter uma novela produzida pela emissora, então em notória expansão.

– Joras não era, propriamente, uma estreante. Ela já havia feito vários roteiros institucionais, além de ter assinado os scripts da série Teca na TV, do Canal Futura, realizada por uma produtora independente. E possuía projetos, na gaveta, tanto para a televisão (sitcons) quanto para o cinema. Gisele, formada em arquitetura, também já havia lançado um romance, Abra e Entre (2003).

– Para auxiliar a nova contratada, a Record recrutou o experiente Luiz Carlos Maciel, envolvido nas produções de Prova de Amor (2005) e Vidas Opostas (2006), dois dos maiores sucessos da teledramaturgia da casa. A equipe contava ainda com o tarimbado Antônio Carlos da Fontoura, além de Maria Luiza Ocampo e Melissa Cabral, outras duas roteiristas reveladas no concurso. Posteriormente, Ana Clara Santiago, Emílio Boechat e Valéria Motta se integraram ao time.

– A esposa de Luiz Carlos Maciel, a atriz Maria Cláudia, também participou da produção. Maria vivia Eugênia Dutra, uma artista condenada ao ostracismo, que vivencia uma relação amorosa e possessiva com seu biógrafo, Paco Loyola (Sérgio Menezes). Por fim, ela acaba matando o rapaz.

– A intenção do canal era recrutar nomes do elenco de Paraíso Tropical (2007), a novela das oito que a Globo havia encerrado na última semana de setembro. Uma das atrizes pretendida era Beth Goulart, destaque no folhetim de Gilberto Braga e Ricardo Linhares, como a amargurada Neli. Beth, contudo, só migrou para a emissora em 2011, para viver a vilã Regina, de Vidas em Jogo.

– Houve acerto apenas com Bruna di Túlio, que, em ‘Paraíso’, interpretou Vivianne, a primeira namorada do vilão Olavo Novaes (Wagner Moura). Em ‘Amor’, ela assumiu a carreirista Fabíola Castro, publicitária contratada pela agência de Mário Motta (Nicola Siri).

– Estreando em novelas, a comediante Gorete Milagres que arrebatou o público, no fim dos anos 1990, com sua simplória Filó, caipira que frequentava o banco de A Praça é Nossa (SBT, 1987). Na época, Gorete protagonizou uma ferrenha disputa entre Globo e SBT pelo seu passe; acabou ficando na emissora de Silvio Santos, onde chegou a ganhar um programa solo.

– Também Otaviano Costa, como o arrivista Bruno Molinaro. Mirando sua ascensão profissional, o rapaz oculta a origem humilde, rechaçando qualquer contato com os pais idosos, Dora (Sônia Guedes) e Giuseppe (Rogério Fróes). Até então apresentador, Otaviano se lançava como ator numa novela da Record, encerrando a batalha jurídica que travava com o canal – que o dispensou em 2004, antes do término de seu contrato.

– A grande vilã da trama estava a cargo de Renata Dominguez. Revelada em Malhação (2001), Renata migrou para a Record em 2004, acumulando papéis de destaque em A Escrava Isaura, Prova de Amor e Bicho do Mato (2006). Para evitar o desgaste emocional que uma vilã, fatalmente, causa, Renata fez um curso de técnicas de composição de personagens, com um renomado preparador americano, Robert Castle.

– O ponto de partida de Amor e Intrigas e a trajetória de Valquíria remetem a Vale Tudo (1988), clássico da teledramaturgia brasileira, e sua vilã Maria de Fátima (Glória Pires). Ainda morando na pacata Ouro Preto (MG), a malvada vende a confecção da mãe, Dilma (Ângela Leal), partindo com cerca de R$ 80 mil para o Rio de Janeiro. Maria de Fátima fez o mesmo com a mãe, Raquel (Regina Duarte), passando adiante a única propriedade da família, uma casa deixada pelo avô. Só que Raquel seguiu firme atrás da filha, enquanto Dilma, diante do choque, acabou morrendo. Outra diferença: a presença da irmã Alice (Vanessa Gerbelli), que reúne forças para ir atrás de Valquíria – cumprindo o papel que coube à mãe na novela de Gilberto Braga.

– O hábito da Valquíria de falar sozinha, contando seus planos em voz alta, foi criticado por setores da imprensa.

– Outros pontos em comum com Vale Tudo: Valquíria arruma um amante, tão criminoso quanto ela, Petrônio (Heitor Martinez) – correspondente a César (Carlos Alberto Riccelli), caso e cúmplice de Maria de Fátima. Ela ainda seduz Bruno, mesmo este estando comprometido com Rafaela (Mylla Christie), a amiga que a acolheu no Rio de Janeiro; tal e qual Fátima fez ao tomar Afonso (Cássio Gabus Mendes) de Solange (Lídia Brondi). O alvo principal de Valquíria, contudo, era Felipe Junqueira de Albuquerque (Luciano Szafir), o empresário que se apaixona perdidamente por Alice.

– Felipe foi o primeiro protagonista de Luciano Szafir, que chamou a atenção do público de Vidas Opostas como Leonardo, incorruptível promotor de justiça. Em Metamorphoses (2004), coprodução da Record com a Casablanca, Szafir também foi escalado para o principal papel masculino, mas reformulações no enredo retiraram o peso de seu personagem, o cirurgião Lucas.

– Para a campanha de lançamento, a Record apostou numa peça publicitária produzida pela agência DPZ, que colocou boa parte do elenco em um tabuleiro de xadrez, se servindo do slogan: “O jogo do bem contra o mal nunca foi tão intrigante. Seu destino é você quem escreve”.

– Peças de xadrez, inseridas em cartões portais, ainda deram o tom da abertura. A exitosa ‘Como é grande o meu amor por você’, composição de Roberto Carlos na voz de Davi Moraes, embalava a vinheta.

– Lamentavelmente, a Record extirpou a abertura na reapresentação da trama, entre 2 de maio de 2016 e 13 de março de 2017, às 15h. Os créditos eram exibidos sobre as cenas que abriam o capítulo.

– Amor e Intrigas possuía 38 cenários fixos, sendo a casa de Dorotéia (Esther Góes) – a mãe megera de Felipe – o maior deles. Já Valquíria passou por três apartamentos diferentes, do mais luxuoso a uma quitinete bem pobrezinha.

– As primeiras cenas foram rodadas durante cinco dias em Ouro Preto, Minas Gerais. A produção, pasmem, utilizou a fachada de duas igrejas católicas, Santa Efigênia e Rosário, nas externas. Uma novidade em se tratando de Record, de propriedade de Edir Macedo, fundado da evangélica Igreja Universal do Reino de Deus.

– Os bairros cariocas da Lapa e de Santa Teresa também serviram de locação. Neste último, ficava o casarão de Celeste (Denise Del Vecchio), convertido em pensão. A divertida senhora é ludibriada por Petrônio, que furta os documentos de Kiko (Márcio Kieling), fazendo-se passar pelo sobrinho de Celeste. Entre as maldades do vilão: a tentativa de afastar a “tia” do filho adotivo Hugo (Lucas Cotrim); o envolvimento com Débora (Adriana Garambone), primogênita de Dorotéia, usando outra identidade falsa; e o assassinato de Joyce (Lívia Rossi), cujo cadáver foi escondido dentro de um freezer na pousada de Débora, onde a moça trabalhava como recepcionista.

– Já Dorotéia almejava conquistar Camilo (Jonas Bloch), primo de seu falecido marido que, ao longo da narrativa, perde a esposa Marília (Sylvia Bandeira). A matriarca dos Junqueira de Albuquerque desprezava Débora, fruto de um caso seu com Romeu (Paulo Figueiredo) – repetindo o comportamento de outra vilã icônica de nossa TV, Branca Letícia de Barros Mota (Susana Vieira), de Por Amor (1997).

– Ainda no lado maléfico da força, Alexandra (Francisca Queiróz), noiva de Felipe que acaba se casando com Paulo (Matheus Rocha), embora apaixonada por Jurandir (Cláudio Gabriel). Este, mesmo após a morte, segue visitando a amante – no melhor estilo Dona Flor e Seus Dois Maridos, obra-prima de Jorge Amado.

– O primeiro capítulo de Amor e Intrigas registrou 12 de média contra 36 da Globo. A audiência foi se esvaindo até chegar a preocupantes 8 pontos, em dezembro. Em fevereiro, o primeiro recorde: 15 de média. Mesmo em confronto direto com a novela das 20h da concorrente, Duas Caras, ‘Amor’ bateu os 17 pontos em março. E chegou a 18 em abril. Mas, em razão das constantes trocas de horário, os números oscilaram para baixo na reta final.

– Nos primeiros dez dias de exibição, Amor e Intrigas foi exibida às 20h30. Entre dezembro de 2007 e maio de 2008, entrava no ar por volta das 21h30. Confiando cegamente no êxito de Caminhos do Coração (2007), a Record resolveu enfrentar a nova novela da Globo, A Favorita, com a “segunda temporada” da saga dos mutantes. Sendo assim, a partir da primeira semana de junho de 2008, Amor e Intrigas foi deslocada para 21h50, cedendo seu antigo horário para a continuação de ‘Caminhos’.

– Na semana seguinte, Silvio Santos lançou mão de sua “arma secreta”: a reapresentação de Pantanal, clássico produzido pela Manchete em 1990. A novela de Benedito Ruy Barbosa surrupiou preciosos pontinhos de Amor e Intrigas. Em 8 de julho, nova alteração: a Record estreou Chamas da Vida, substituta de ‘Intrigas’, no horário então ocupada por esta. Sendo assim, as últimas três semanas do folhetim de Gisele Joras foram ao ar às 23h. O último capítulo registrou 18 pontos de média, na Grande São Paulo, ocupando a liderança por seis minutos.

– Quatro finais foram gravados para os vilões Valquíria e Petrônio: ela o matava e fugia para o Paraguai, ele a assassinava e seguia para o exterior, os dois se safavam ou morriam em meio a troca de tiros com a polícia, o desfecho escolhido pela produção.

– Amor e Intrigas assegurou média final de 12 pontos na Grande São Paulo, 37% acima de sua antecessora, Luz do Sol (2007).


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Apaixonado por novelas desde que Ruth (Gloria Pires) assumiu o lugar de Raquel (também Gloria) na segunda versão de Mulheres de Areia. E escrevendo sobre desde quando Thales (Armando Babaioff) assumiu o amor por Julinho (André Arteche) no remake de Tititi. Passei pelo blog Agora é Que São Eles, pelo site do Canal VIVA e pelo portal RD1. Agora, volto a colaborar com o TV História.