“Haja Coração” teve um ótimo início, mas foi perdendo o rumo ao longo das semanas, lamentavelmente. Essa queda de qualidade, inclusive, pôde ser observada através do desenvolvimento de vários casais da história —- muitos deles começaram promissores e tiveram o enredo estagnado. Já o par protagonista, composto por Tancinha (Mariana Ximenes) e Apolo (Malvino Salvador), cansa pela repetição desde o começo do folhetim. Porém, em contraponto a tudo o que foi mencionado, Daniel Ortiz criou um casal que caiu nas graças do público assim que surgiu e, desde então, vem tendo um bom desenvolvimento: Shirlei e Felipe.

Os personagens, interpretados com competência por Sabrina Petraglia e Marcos Pitombo, protagonizam um dos enredos mais clássicos dos contos de fadas: o da gata borralheira em busca do seu príncipe encantado.

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Shirlei veio de outra novela

É uma situação que transborda clichê, mas sempre funciona quando bem construída. E foi o caso da novela. Aliás, embora seja um remake de “Sassaricando” (1987), Shirlei não pertencia ao folhetim das sete de Silvio de Abreu. Mas fazia parte de outra novela do autor, do horário das nove: “Torre de Babel” (1998). A menina ingênua que tinha um problema na perna foi vivida na época por Karina Barum, fazendo um grande sucesso —- a música “Corazón Patío”, de Alejandro Sanz (tema da personagem), estourou, inclusive.

Ao inserir Shirlei no contexto de “Haja Coração”, o autor acabou se vendo obrigado a criar uma trama para ela e não simplesmente seguir com a obra original. E isso foi algo bem positivo, ainda mais levando em consideração os erros que Daniel Ortiz vem cometendo com vários perfis e enredos da sua história, muitas vezes tentando repetir situações de 1987 que não funcionaram em 2016 —- vide o sumiço de Teodora (Grace Gianoukas) e toda a trajetória de Aparício (Alexandre Borges), por exemplo.

E todo o contexto que cerca a personagem é, propositalmente ou não, digno de uma mocinha de novela. Portanto, não demorou para a menina assumir esse posto com louvor. Ela e Felipe, que se comporta como o verdadeiro mocinho do enredo.

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Felipe demorou para entrar na novela

O rapaz está sempre com um sorriso no rosto, é solícito, transborda integridade e trabalha na empresa de Beto (João Baldasserini). Vale mencionar que o personagem demorou para entrar na novela, juntamente com a sua até então namorada, a patricinha Jéssica (Karen Junqueira). Foi só com a chegada dele que a trama da Shirlei deslanchou, pois a situação em torno da paixão platônica por Adônis (José Loreto) já estava cansativa. E o primeiro encontro do casal representou o clássico “Cinderela”, da Disney. Isso porque o bom moço quase atropelou a menina, que acabou perdendo sua bota ortopédica em um bueiro, durante uma forte chuva. Felipe pegou o sapato e passou a procurar a moça para devolvê-lo.

Após muita procura e vários desentendimentos (a garota chegou a achar que ele estava debochando de sua deficiência), os dois finalmente se ‘entenderam’ e o rapaz devolveu a famigerada bota. O encontro, aliás, se deu por uma ‘coincidência’ digna de folhetins: ela passou a trabalhar na casa dele como empregada. E não demorou para o interesse mútuo se manifestar, despertando o ciúme de Jéssica.

Foi a partir de então que começou o calvário da mocinha, encarnando de vez a gata borralheira. A patricinha fazia de tudo para diminuir a funcionária e até a obrigou a subir vários andares de escada, carregando compras pesadas, ignorando seu problema na perna. A vilã encarnou de vez a madrasta da Cinderela, fazendo jus ao contexto da trama de Shirlei.

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Shirlei sofre com as maldades de Carmela

Para culminar, a filha de Francesca (Marisa Orth) é constantemente alvo da irmã Carmela (Chandelly Braz), que sempre faz questão de humilhar a caçula. Ainda há a presença do já citado Adônis, sujeito aproveitador que nunca retribuiu os sentimentos de Shirlei —- mas, vale ressaltar, agora passou a enxergá-la com outros olhos, virando mais um obstáculo para o casal.

Outro ponto é a chegada da mãe de Felipe, interpretada por Betty Gofman. A nova personagem não admitirá o romance, pois sabe que a menina é filha de seu marido, Guido (Wernner Schunemann) —- o desaparecimento dele, inclusive, é um dos mistérios da história (aliás, é preciso colocar que a demora da entrada desses perfis é um dos vários erros do folhetim). Portanto, fica claro que Shirlei tem um enredo próprio muito mais atrativo do que todo o restante da novela, que vem se mostrando bastante equivocada.

E uma ironia do ‘destino’ é ver o casal Shirlipe ofuscando o par protagonista, exatamente como ocorreu em “Sassaricando”. Porém, curiosamente, na época, era o triângulo formado por Tancinha, Apolo e Beto que apagou o protagonismo de Aparício. Agora, o trio amoroso virou protagonista, mas de nada adiantou, pois foi ofuscado pelo casal de coadjuvantes. Ou seja, os personagens cresceram na obra original e no remake (por razões óbvias) entraram para o núcleo principal, mas o imponderável novamente se fez presente.

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Cena do primeiro beijo rendeu ótima audiência em 2016

A aguardada cena do pedido de namoro, que resulta no primeiro beijo do casal, rendeu a maior audiência do dia da Globo (30 pontos) em 2016, comprovando o acerto do romance.

A sequência primou pela sensibilidade, destacando a arrebatadora química entre Sabrina Petraglia e Marcos Pitombo. Os atores estão ótimos e a sintonia da dupla se evidencia em todos os momentos deles juntos. A troca de olhares é outro ponto que enriquece o relacionamento que demorou bastante para finalmente acontecer. Ainda assim, valeu a espera.

O aguardado beijo foi bonito e é bom ver atores não tão ‘conhecidos’ em destaque. Afinal, a atriz estreou no SBT em 2010, quando viveu a Terezinha em “Uma Rosa com Amor”. Foi para a Globo no mesmo ano, onde teve uma pequena participação em “Passione”. Também fez uma ponta em “Flor do Caribe” (2013), até ganhar a Itália em “Alto Astral” (2014), estreia de Daniel Ortiz como autor solo. Ela brilhou e acabou conquistando essa ótima personagem.

Já Marcos Pitombo é mais experiente, pois é revelação da temporada de 2006 da “Malhação”. Depois do sucesso no seriado adolescente, ele foi para a Record, onde esteve em seis novelas: “Os Mutantes” (2008), “Os Mutantes: promessas de amor” (2009), “A História de Ester” (2010), “Vidas em Jogo” (2011), “Pecado Mortal” (2013) e “Vitória” (2014).

Porém, é inegável que atuar fora da líder não dá a mesma visibilidade. O ator voltou para a Globo em 2015, onde fez uma breve participação na fracassada “Babilônia”, e viveu um grande momento na pele do carismático Felipe.

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Felipe e Jéssica protagonizaram bons embates

Vale destacar as boas cenas que o intérprete faz com Karen Junqueira, protagonizando ótimos embates com a agora ex-namorada; além, claro, de representar o sujeito mais íntegro da novela. Não é por acaso que o personagem, mesmo não aparecendo tanto, ofuscou a figura de ‘galã’ de Apolo. Aliás, o casal se sobressaiu com grande facilidade, virando o melhor par do enredo com larga vantagem. Tanto no quesito química, quando na questão do desenvolvimento do romance.

Shirlei e Felipe (Shirlipe para os ‘shippers’) representam o amor puro dos contos de fadas e o imenso sucesso do casal apenas comprova que o clássico, quando bem feito, funciona sempre. Os dois viraram os verdadeiros mocinhos de “Haja Coração”, protagonizando a melhor história da novela, com direito a cenas românticas, maldades de vilões e questões envolvendo a baixa autoestima de uma menina com deficiência. Sabrina Petraglia e Marcos pitombo fazem por merecer todo esse êxito do par, transbordando química em todas as cenas.

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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor