Com 90% do elenco negro, série da Globo faz história na TV brasileira
28/11/2022 às 13h15
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Encantado’s, série recém-lançada pelo Globoplay, entra para a história da televisão brasileira pela representatividade negra da produção.
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O elenco é 90% negro e a equipe por trás das câmeras acompanha esse padrão já a partir da direção – Déo Cardoso e Naína de Paula – e da produção de elenco – Rudson Martins é o primeiro produtor de elenco negro na história da TV Globo (ele trabalha ao lado de Daniela Ciminelli).
Militância
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Engana-se porém quem acredita que, por conta da representatividade, a série milite o tempo todo pela causa negra. Uma das preocupações das criadoras Renata Andrade e Thaís Pontes foi não serem incisivas na questão racial. Obviamente o racismo é tratado, porém surge diluído na leveza das abordagens, já que o objetivo da série é, acima de tudo, fazer rir.
Em entrevista à coluna, Renata Andrade afirmou que Encantado’s poderia ser feita com personagens brancos, mas como é predominantemente negra, não havia como não abordar o racismo.
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“Não quisemos fazer militância, mas não dá para fechar os olhos para o que acontece. Assistimos a vida inteira a narrativas brancas e nunca nos reconhecemos nelas (…) Porém, a questão racial está sempre a serviço do humor.”
Medo
A série foi criada em 2018, fruto da oficina de humor para roteiristas negros realizada pela Globo na ocasião. As autoras, a princípio, não bancaram o elenco majoritariamente negro por receio de não ser aceito. Elas preferiram equilibrar. Há quatro anos, este era um medo real.
A série foi levada ao diretor Henrique Sauer (branco) que compreendeu a força do projeto e decidiu bancar: vamos fazer com um elenco de maioria negra!
Questionei as autoras se, de quatro anos para cá, houve progresso nessa questão. Thaís Pontes afirma que existe um processo em evolução, mas a representatividade negra é ainda muito pequena, apesar dos avanços dos últimos anos.
Algo a ser destacado é o leque de possibilidades de narrativa quando o elenco é de maioria negra. Thaís explica que quando há menos negros, resvala-se nos estereótipos: a empregada, a hipersexualizada, o bandido, o escravo, o menino de rua, os de religião de matriz africana, etc.
“Em dramaturgia, a amiga da protagonista é a negra. Os personagens sem história são negros. É um padrão. O problema é haver no universo poucos tipos humanos. Quando você tem muita gente negra, pode-se falar de todos.”
Vida real
Os personagens brancos foram pensados para também terem voz, para não serem aleatórios (como são os pretos nas novelas em geral). Desta forma, Encantado’s assemelha-se à vida real do subúrbio e das comunidades. A ideia era justamente mostrar que a maioria de pele escura transita, vive e dá vida a lugares como Encantado, o bairro onde a trama é ambientada.
Aliás, o nome da série, Encantado’s – que leva o ‘s (da grafia inglesa) para dar sentido de pertencimento -, carrega ainda o misticismo, o sobrenatural, a religiosidade (da palavra “encantado”), também presente na narrativa.
Representação do subúrbio
Thaís Pontes explica que Encantado’s não é uma comédia rasgada. De fato, é um humor leve, espirituoso, que beira o deboche. Trata-se de uma série cômica sobre família e sobre pessoas que vivem em comunidade, em que o interesse coletivo está acima do individual, uma representação do subúrbio sobre afeto, acolhimento e pertencimento com comicidade.
Encantando’s pode ser comparada à Grande Família: uma família, não necessariamente de laços consanguíneos, formada por funcionários de um supermercado no subúrbio carioca (o Encantado’s do título) que, à noite, se unem para levar adiante a escola de samba Joia do Encantado.
É pelo humor e pelo carisma que nos afeiçoamos a tipos como Olímpia (Vilma Melo), que comanda com mãos de ferro o supermercado herdado do pai ao lado do irmão Eraldo (Luís Miranda), um tipo sonhador cujo objetivo de vida é ver a Joia do Encantado fazer bonito na avenida.
O conflito entre os irmãos está armado quando a falta de recursos atropela os interesses de um e de outro. Olímpia e Eraldo, no entanto, não são inimigos. São irmãos que se amam acima de tudo, apesar de antagônicos em algumas situações. Quem não se reconhece?
Elenco 90% negro
Vilma Melo e Luís Miranda esbanjam carisma em tipos humanos muito ricos, repletos de possibilidades. O texto e a direção dão o tom com a leveza que os personagens demandam.
O elenco é formado por veteranos, como Neusa Borges, Dhu Moraes, Romeu Evaristo e Tony Ramos (com peruquinha de bicheiro), e jovens atores e cantores, vários crias do subúrbio ou das comunidades cariocas: Digão Ribeiro (como o romântico FlashBlack), Ludmillah Anjos (como a esfuziante Chrystal), Luellem de Castro (como a ranzinza Ana Shaula), Dhonata Augusto (como o pegador Pedro) e Ramille (como a prática Melissa).
Completam a lista de talentos Dandara Mariana (Pandora), Evelyn Castro (Maria Augusta), Augusto Madeira (Leozinho), João Côrtes (Celso), Leandro Ramos (Ceroto), Lidiane Ribeiro, e as participações especialíssimas de Solange Couto, Marcelo Médici, Késia, Marco Gonçalves, Luciana Paes, Jojô Toddynho, Tony Tornado, Val Perré, Lana Guelero, Caíto Mainier, Milton Cunha, Pretinho da Serrinha e outros.
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Serviço
Série criada por Renata Andrade e Thais Pontes;
Escrita por Antônio Prata, Chico Mattoso, Renata Andrade e Thais Pontes;
Redação final de Antônio Prata e Chico Mattoso;
Produção de Juliana Castro;
Direção de Déo Cardoso e Naína de Paula;
Direção artística de Henrique Sauer;
Direção de gênero de José Luiz Villamarim.