Sucesso que consolidou a mudança de imagem de Regina Duarte – então rompendo com o título “namoradinha do Brasil” –, Malu Mulher (1979) ganhou o país e o mundo.

Regina Duarte

A série produzida pela Globo, porém, causou celeuma em Portugal. O conservadorismo fez com que a produção fosse escondida na grade da principal emissora do país.

Expectativa e frustração

Malu Mulher - Regina Duarte

Exibida com bastante sucesso por aqui entre 1979 e 1980, Malu Mulher foi exportada para Portugal em 1981. A exibição coube à TV estatal RTP (Rádio e Televisão de Portugal), única opção de entretenimento televisivo na época.

Contudo, a produção dirigida por Daniel Filho foi encaixada no Canal 2, que possuía apenas 20% da audiência registrada pelo Canal 1. Este foi o boicote arquitetado pela direção conservadora da RTP, que também programou a trama para as segundas-feiras, 22h30, horário completamente despercebido pelo público.

Um dos efeitos desta restrição foi o cancelamento de um debate entre escritores e psicólogos sobre o programa, um dos primeiros a discutir o empoderamento feminino – Malu, socióloga, acompanhava questões pertinentes à mulher enquanto vivenciava o divórcio, após episódios de violência doméstica.

Estratégia ou boicote?

Malu Mulher - Regina Duarte

A crítica de Portugal chegou a lamentar o boicote promovido pela direção da RTP, por considerar Malu Mulher uma atração com mais substância, densidade humana e autenticidade social do que todas as que foram vendidas pela Globo para a emissora até então.

De acordo com os críticos, era a primeira vez que chegava a Portugal uma série que mostrava o Brasil oposto ao dos tipos folhetinescos, já que Malu, a personagem de Regina Duarte, enfrentava situações do dia-a-dia e comportamentos de todos os tipos.

A RTP, aliás, havia alimentando uma imensa expectativa quanto à exibição de Malu Mulher no país. A rede se defendeu posteriormente alegando problemas de ordem técnica, por muitos espectadores não conseguirem sintonizar o Canal 2.

O erro foi “estratégico”. A estação poderia exibir a série no Canal 1, que, no mesmo período, chegava a atingir 5 milhões de pessoas com Dona Xepa (1977), folhetim de Gilberto Braga que fez imenso sucesso aqui e lá.

Produção de qualidade

Malu Mulher - Regina Duarte

O que os envolvidos não esperavam é que a camada de intelectuais portugueses protestaria contra a discriminação e marginalização da série, que apresentava em seu conteúdo temas comuns aos enfrentados pela sociedade local como adultério, aborto, prostituição e consumo de drogas.

Dos mais de 50 episódios produzidos e exibidos no Brasil, o público português assistiu apenas 10. E, mesmo com o alcance pífio, Malu Mulher gerou discussões.

De acordo com os críticos, o papel defendido por Regina traduzia a sociedade brasileira do período, com os problemas relacionados ao choque de gerações, às mudanças de conceitos e dificuldades de ganhar o pão de cada dia sem um curso superior, padrinhos ou garantias, temas de vários episódios.

Elogios da crítica

Malu Mulher - Regina Duarte

O jornalista Vitoriano Rosa, do Correio da Manhã, exaltou a veracidade das cenas de amor.

“As cenas de amor eram mostradas com uma autenticidade excessiva para certas camadas habituadas aos beijos do Código Hays, que media as distâncias entre duas bocas e proibia movimentos de lábios bruscos ou impetuosos nos filmes dos anos 1940 e 1950 que fornecem a maior parte das obras escolhidas para as Noites de Cinema do Canal 2. É Uma pena, que só 10 capítulos serão mostrados aos portugueses”, declarou ao Jornal do Brasil (25/01/1981).

“O êxito da série baseia-se no excepcional trabalho da atriz Regina Duarte que, na vida real, já passou por muito do que ela condena em Malu Mulher”, prosseguiu, enaltecendo também o desempenho de Dennis Carvalho como Pedro Henrique, ex-marido de Malu.

Rui Cadima, da publicação Portugal Hoje, classificou Malu Mulher “como uma das melhores coisas que o Brasil nos enviou” e destacou que a produção refletia “uma década de reviravoltas, de conquistas femininas” e “uma cópia fiel de tantas mulheres, brasileiras ou portuguesas, que buscam a sua libertação”.

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Sebastião Uellington Pereira é apaixonado por novelas, trilhas sonoras e livros. Criador do Mofista, pesquisa sobre assuntos ligados à TV, musicas e comportamento do passado, numa busca incessante de deixar viva a memória cultural do nosso país. Escreve para o TV História desde 2020 Leia todos os textos do autor